06/06/2023 - 16:56
Antecedentes: agosto de 2012 a maio de 2013
Protestos contra o aumento de tarifas no transporte público eclodem em Natal (RN), Porto Alegre (RS), Goiânia (GO) e Rio de Janeiro (RJ). Na capital do Rio Grande do Norte, o movimento, chamado de “Revolta do Busão” e que chegou a bloquear avenidas e rodovias, é bem-sucedido, levando a Câmara Municipal a revogar o aumento em setembro de 2012.
2 de junho de 2013 – Aumento de tarifas entra em vigor em São Paulo
Dez dias após a prefeitura e o governo de São Paulo anunciarem um reajuste de 20 centavos nas passagens de ônibus, trens e metrô, entra em vigor a nova tarifa de R$ 3,20. O índice de aumento foi de 6,7%.
3 de junho – Primeira manifestação em São Paulo
Um dia após o aumento entrar em vigor, cerca de cem manifestantes bloqueiam a Estrada do M’Boi Mirim, periferia de São Paulo. Essa primeira manifestação não conta com convocações feitas pelas redes sociais. Parte dos participantes são moradores da região. O ato recebe cobertura mínima da imprensa.
A organização coube ao braço paulistano do Movimento Passe Livre (MPL), um movimento descentralizado e sem liderança clara lançado em 2005 no Fórum Social Mundial em Porto Alegre, e que tinha como inspiração protestos que ocorreram em Salvador e Florianópolis na primeira metade dos anos 2000. Com a bandeira da gratuidade no transporte público, o MPL paulistano já tinha realizado algumas manifestações em 2011. Seus membros eram ligados à esquerda, mas o movimento se definia como “apartidário” e “independente”.
6 e 7 de junho – Movimento ganha tração em São Paulo
A segunda manifestação do MPL marca uma mudança de tática: o protesto começa com uma concentração na região central de São Paulo, em frente ao Theatro Municipal, e segue para a Avenida Paulista. Algumas centenas de manifestantes bloqueiam todas as vias da avenida. Há registro de depredação da entrada de uma estação de metrô, portas de um shopping e bancas de jornais. Quinze pessoas são detidas após intervenção da PM, que fez uso de gás lacrimogênio e balas de borracha.
Também entram em cena as convocações do MPL por meio das redes sociais. Esse tipo de convocação já tinha antecedentes no Brasil em 2011, com o “Churrascão da Gente Diferenciada”, “A Marcha das Vadias” e a “Marcha da Maconha”, que fizeram uso das redes sociais para atrair diretamente participantes com princípios ou bandeiras semelhantes.
No exterior, convocações por redes sociais ou fóruns de internet já haviam sido usadas em 2011 por manifestantes da Primavera Árabe (Oriente Médio e Norte da África), do Occupy Wall Street (EUA) e do Movimiento 15-M (Espanha), além de protestos contra os resultados das eleições russas.
No dia 7 de junho, um novo protesto convocado pelo MPL, com concentração no Largo da Batata, resulta no bloqueio da marginal Pinheiros, uma das artérias viárias da capital, e em uma nova marcha até a Avenida Paulista. Duas mil pessoas participam da manifestação. A PM volta a usar gás lacrimogênio. No protesto, manifestantes entoam gritos como “Se a tarifa não baixar, a cidade vai parar”.
11 de junho – “Black blocs” passam a receber atenção
O terceiro grande protesto na região central de São Paulo atrai 5 mil pessoas, que se deslocam da Avenida Paulista rumo ao terminal parque D. Pedro II. Parte dos manifestantes empunha bandeiras de alguns pequenos partidos políticos de esquerda, como o PSTU. Alguns jornalistas que acompanham o protesto são hostilizados.
A marcha principal acaba após a Tropa de Choque da PM, que já esperava no parque D. Pedro, intervir quando alguns manifestantes encapuzados contornaram os policiais e atiraram coquetéis molotov contra o terminal e paus e pedras contra agentes de segurança. Manifestantes pacíficos gritam palavras de ordem como “sem violência!”.
Outros participantes seguem para a Praça da Sé e Avenida Paulista, com registro de quebra-quebra. A PM volta a reprimir o protesto com balas de borracha e gás lacrimogênio.
No dia seguinte, o termo “black bloc” começa a aparecer na imprensa para descrever os manifestantes encapuzados e desgarrados da massa principal que promovem vandalismo. O termo descreve uma tática de confronto associada a movimentos anarquistas e que começou a se disseminar na Alemanha Ocidental nos anos 1980.
O bloqueio de vias e os atos de vandalismo provocam uma reação hostil de comentaristas e veículos de imprensa. “A grande maioria dos manifestantes são filhos de classe média. Ali não havia pobres que precisassem dos R$ 0,20. Os mais pobres ali, eram os policiais apedrejados que ganham muito mal”, disse o comentarista Arnaldo Jabor no Jornal da Globo na noite de 12 de junho.
As fichas dos presos naquela noite, no entanto, mostram perfis distintos. Há professores, estudantes, um metalúrgico, jornalistas, um artista, uma desempregada, um publicitário, entre outros.
De Paris, onde cumpriam agenda, o prefeito Fernando Haddad (PT) e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) criticam a depredação. Para Haddad, os atos de vandalismo foram produzidos por “pessoas inconformadas com o Estado democrático de Direito”.
13 de junho – Repressão violenta da PM marca estopim de movimento nacional
O quarto protesto na região central de São Paulo começa com uma concentração tensa nas escadarias do Theatro Municipal. PMs revistam pessoas – inclusive jornalistas – que se dirigem à área. Estações de metrô são fechadas. Pessoas que carregavam vinagre – usado para aliviar os efeitos do gás lacrimogênio nos olhos – são presas, incluindo um jornalista. Em parte da imprensa de São Paulo, o tom adotado foi de exigir que a PM tomasse providências para sufocar o movimento.
O jornal Folha de S.Paulo havia publicado pela manhã um editorial com o título “Retomar a Paulista”, que acusava os participantes do movimento de serem “jovens predispostos à violência por uma ideologia pseudorrevolucionária”. “É hora de pôr um ponto final nisso”, concluía o editorial.
No início da noite, cerca de 5 mil pessoas deixam as escadarias do teatro e seguem para a rua da Consolação, um dos acessos para a Avenida Paulista. Sem registrar incidentes significativos no percurso, a marcha é bloqueada pela PM quando alcança a esquina da Consolação com a rua Maria Antônia, local que já havia sido palco de um famoso confronto entre estudantes em 1968.
Sem emitir qualquer advertência, policiais da Tropa de Choque passam a disparar gás lacrimogênio e balas de borracha na multidão, inclusive em manifestantes que tentam fugir por ruas adjacentes.
Nas horas seguintes, membros da PM, longe de se limitarem a bloquear o acesso à Avenida Paulista, atacam jornalistas, moradores da região, motoristas que trafegavam e clientes de bares nas ruas dos bairros Bela Vista e Consolação. Pelo menos 17 profissionais da imprensa ficam feridos – um fotógrafo perde um olho. Outros três são presos.
A noite termina com mais de 230 pessoas presas. A violência da PM, no entanto, tem o efeito oposto. Em vez de dissuadir a participação nos protestos, acaba por alimentá-los.
14 de junho – Governo de SP defende repressão, mas violência policial causa revolta
Na manhã seguinte, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, defende a ação da polícia e chama os manifestantes de “baderneiros e vândalos”.
No entanto, o governador não consegue controlar a narrativa, e chovem críticas de ONG, grupos da sociedade civil, movimentos sociais, grupos de advogados e até de setores da imprensa sobre os excessos na ação da PM. Protestos são organizados no exterior em apoio aos manifestantes no Brasil.
Uma nova manifestação é convocada em São Paulo pelo MPL para 17 de junho. “Não é por centavos, é por direitos”, diz um panfleto distribuído na capital.
15 e 16 de junho – Protestos contra a Copa
Em meio à indignação provocada pela repressão do dia 13 em São Paulo, o Brasil recebe no dia 15 de junho o jogo de abertura da Copa das Confederações, evento teste da Copa do Mundo de 2014. A presidente Dilma Rousseff é vaiada dentro do Estádio Mané Garrincha, em Brasília, palco da partida. Do lado de fora, há confronto entre algumas centenas de manifestantes e a cavalaria da PM do Distrito Federal.
No dia seguinte, na estreia do Rio de Janeiro como sede do torneio, do lado de fora do Maracanã, um novo confronto entre a PM e cerca de 500 manifestantes, que criticavam o volume de recursos usados para a Copa e cobravam mais verbas para educação e saúde.
17 de junho – Megaprotestos se espalham pelo país, e pauta se amplia
Enormes manifestações tomam conta do país, levando cerca de 250 mil pessoas às ruas em 12 capitais, no que foi considerado à época o maior movimento popular desde o impeachment de Fernando Collor em 1992. A noite do dia 17 foi palco de algumas das imagens mais emblemáticas das jornadas de junho de 2013, como a invasão do telhado do Congresso Nacional e a depredação da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
São Paulo – Cerca de 65 mil pessoas saem às ruas na nova manifestação convocada pelo MPL. Após a má repercussão causada pela repressão do dia 13, a tropa da PM paulista se mantém distante da manifestação, que é acompanhada por apenas alguns oficiais da corporação que adotam uma linguagem conciliadora. Manifestantes entoam gritos como “o povo acordou” e “o gigante acordou”. “Saímos do Facebook”, diz um cartaz na manifestação.
A maior parte dos manifestantes participa de protestos pela primeira vez, expressando pautas que vão além do “passe livre”, cobrando medidas contra violência urbana, melhorias em serviços públicos e reclamando dos custos da Copa.
Após se concentrar no Largo da Batata, a marcha se desloca pela Avenida Faria Lima, um dos principais centros financeiros de São Paulo. Das janelas e das portarias dos prédios comerciais, pessoas aplaudem os manifestantes e gritam palavras de apoio.
Após atravessar a avenida e a ponte estaiada sem incidentes, parte do protesto chega ao fim em frente ao Palácio dos Bandeirantes, sede do governo, enquanto outro grupo segue para a Paulista. A PM finalmente intervém quando alguns black blocs derrubam o portão e invadem os jardins do palácio.
Rio de Janeiro – Cerca de 100 mil pessoas ocupam a avenida Rio Branco, no centro da capital fluminense. O protesto carioca resulta em cenas violentas, que acentuam um caráter de radicalização do movimento. Manifestantes investem contra a sede da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), cercando o prédio e obrigando policiais a se refugiarem no interior. Lojas da região são saqueadas, e agências bancárias acabam destruídas. Alguns PMs fazem disparos de fuzil para cima numa tentativa de dispersar a multidão.
Brasília – Cerca de 10 mil pessoas protestam em Brasília. Apesar de menor em comparação com outras cidades, o protesto ganha destaque quando algumas centenas de manifestantes furam um bloqueio policial e invadem o telhado do Congresso Nacional.
Outras cidades – Manifestações com milhares de participantes também são registradas em Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Fortaleza, Belém, Vitória e Salvador, com pautas diversas como cobrança por mais investimentos em serviços públicos e combate à corrupção.
Mídia freia críticas – Antes com uma postura crítica às manifestações, alguns veículos de imprensa passam a mudar sua abordagem, focando no novo leque de pautas que surgem nas ruas. A revista Veja estampa em sua nova capa: “A revolta dos jovens. Depois do preço das passagens, a vez da corrupção e da criminalidade?”.
18 de junho – Novo protesto em SP; Mídia Ninja ganha destaque
São Paulo – Um novo protesto resulta numa tentativa de invasão e depredação da sede da prefeitura da cidade. Pelo menos 65 mil pessoas saem às ruas. Um carro da emissora Record e um módulo da PM são incendiados por manifestantes ao lado da sede do Executivo paulistano.
Apenas a Guarda Municipal entra em ação. Após as críticas sobre o 13 de junho, a PM se mantém distante. O sumiço dos policiais acaba criando um cenário para ação de saqueadores em lojas de eletrônicos do centro de São Paulo.
Dilma Rousseff aborda protestos – Durante um discurso em Brasília, a presidente Dilma Rousseff aborda as manifestações e adota um tom de compreensão com as demandas, afirmando que o movimento era uma “mensagem direta das ruas”. Na ocasião, ela afirma que é “bom” ver jovens e adultos empunhando bandeiras do Brasil e cantando o Hino Nacional. “O Brasil hoje acordou mais forte. A grandeza das manifestações de ontem comprova a energia da nossa democracia, a força da voz da rua e o civismo da nossa população. (…) Essas vozes das ruas precisam ser ouvidas.”
Mídia Ninja – Na mesma noite de 18 de junho, na esquina da Avenida Paulista com a rua da Consolação, um grupo incendeia um painel da Coca-Cola, uma das patrocinadoras da Copa das Confederações.
Em contraste com as cenas de vandalismo na prefeitura, que foram transmitidas por helicópteros a serviço de veículos de mídia tradicionais, a cena de vandalismo é capturada por aparelhos celulares, que transmitem tudo ao vivo e por meio das redes sociais. É a primeira transmissão de impacto da Mídia Ninja, uma “teia” de colaboradores criada em 2011 e ligada ao coletivo de esquerda Fora do Eixo.
A transmissão, mesmo com todas as limitações técnicas da época, é acompanhada por pelo menos 100 mil pessoas. Nos protestos seguintes, as imagens ao vivo no meio dos protestos e a cobertura abertamente favorável aos manifestantes atraem mais espectadores que rechaçam a cobertura de grandes veículos.
Em 2013, o pioneirismo desse tipo de transmissão ao vivo permaneceria fortemente associado a grupos de esquerda. Nos anos seguintes, porém, acabaria sendo adotada por movimentos bem distantes desse perfil ideológico.
Dez anos depois de junho de 2013, Bruno Torturra, um dos criadores da Mídia Ninja, disse encarar com desgosto que esse tipo de transmissão ao vivo tenha se tornado “um catalisador da radicalização” na direita.
19 de junho – Autoridades revogam aumentos
Após duas semanas de manifestações, o prefeito Haddad e o governador Alckmin anunciam a revogação do aumento em São Paulo e a volta da tarifa de R$ 3.
No Rio, o prefeito Eduardo Paes também revoga um aumento de 20 centavos que estava em vigor desde o início de junho.
PT convoca militantes a participar de protestos – Diante do crescimento das manifestações, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, conclama a militância petista “a assumir decididamente a participação das manifestações de rua em todo o país”.
20 de junho – Mais de um milhão saem às ruas do país; movimento tem virada antipartidária
O país registra o auge das “Jornadas de Junho” quando mais de 1 milhão de pessoas saem às ruas de 388 cidades, incluindo 22 capitais.
São Paulo – Com a revogação do aumento no dia anterior, outras pautas dominam o protesto que reúne 110 mil pessoas na Avenida Paulista. Grupos exibem cartazes com demandas de regulação para algumas profissões, moradores exigem reparos em vias, manifestantes exibem placas contra a corrupção e exigem educação e saúde “padrão Fifa”.
O protesto também acaba sendo marcado por uma virada antipartidária. A conclamação feita pelo comando do PT para que os militantes do partido participassem da manifestação se revelou desastrosa. Assim que pisaram na Paulista, os petistas começaram a ser intimidados, ofendidos ou agredidos. Manifestantes que diziam ser apartidários, jovens que entoavam slogans nacionalistas e, em menor número, skinheads, formaram a ponta de lança da perseguição aos gritos de “Sem partido!” e “Sem bandeira!”.
Ao longo do trajeto, alguns petistas chegaram a ser ameaçados por pessoas que portavam tacos de beisebol e de hóquei. Depois da marcha percorrer 1,5 quilômetro, ao lado de militantes de outros partidos como PSTU, PCO e Psol – que já haviam participado de outras manifestações –, os petistas são cercados por outros manifestantes. Suas bandeiras foram tomadas, rasgadas e queimadas. Em poucos minutos, não havia mais nenhuma bandeira de partido na Paulista. Apenas bandeiras do Brasil. A maior parte do público na Paulista não notou o que havia ocorrido.
Rio de Janeiro – A virada “antipartidária” também marca o protesto do Rio de Janeiro, que reuniu um recorde de cerca de 300 mil pessoas. Participantes ligados a partidos de esquerda, como o PSTU, ou a sindicatos como a CUT são hostilizados e expulsos da manifestação.
Ocorrem também episódios de confronto com a polícia, que usa gás lacrimogênio e balas de borracha. Um carro da emissora SBT é incendiado. Oito pessoas são detidas, inclusive o catador Rafael Braga, que carregava uma garrafa de desinfetante. Ele acabaria sendo condenado a cinco anos de prisão. Nos anos seguintes, seu destino se tornaria uma cause célèbre de ONGs de direitos humanos.
Brasília – Manifestantes tentam voltar a invadir o teto do Congresso Nacional, mas são repelidos por forças de segurança. Um grupo segue para o Palácio do Itamaraty, que é vandalizado. Mais de cem pessoas ficam feridas em confrontos.
21 de junho – MPL anuncia que não convocará novos protestos
O MPL de São Paulo informa que não vai mais promover protestos na capital paulista, citando que sua reivindicação de revogação do aumento das tarifas foi atendida pelas autoridades. No entanto, membros do grupo também mencionam que o recuo foi influenciado pela presença de grupos que passaram a trazer “pautas conservadoras” para os protestos, como a redução da maioridade penal. O MPL também critica a violência de alguns participantes contra militantes de partidos políticos.
Nas semanas seguintes, o movimento passa a se limitar a organizar pequenos protestos pontuais na periferia de São Paulo em associação com o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), sem as convocações gerais por redes sociais. No segundo semestre de 2013, o MTST e seu coordenador, Guilherme Boulos, liderariam novos protestos e ocupações na cidade.
Dilma faz pronunciamento – Em pronunciamento na TV, a presidente Dilma promete lançar um pacto, com governadores e prefeitos, para melhorar os serviços públicos. Em sua fala, Dilma classifica a onda de manifestações como um “movimento democrático e justo”, mas adverte contra ações violentas, atribuindo-as a uma “minoria” dos manifestantes.
“Se deixarmos que a violência nos faça perder o rumo, estaremos não apenas desperdiçando uma grande oportunidade histórica, como também correndo o risco de colocar muita a coisa a perder.”
A presidente também menciona o combate à corrupção em três momentos. “Precisamos muito, mas muito mesmo, de formas mais eficazes de combate à corrupção.”
“Ocupa Cabral” – Manifestantes montam um acampamento em frente à residência do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, no bairro nobre do Leblon. O movimento acabou tendo diferentes etapas, com protestos em frente à casa do político sendo registrados até outubro.
22 de junho – Protesto de procuradores contra a PEC 37
O vão do Museu de Arte de São Paulo (Masp) é palco de um protesto que reúne 30 mil pessoas. Convocada com a ajuda de procuradores de Justiça, a manifestação tem uma pauta bem específica: barrar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, que tramitava na Câmara e que tinha o objetivo de limitar a investigação de crimes exclusivamente à polícia, impedindo a abertura de inquéritos pelo Ministério Público.
Diferentes setores do Ministério Público vinham fazendo campanha contra a PEC desde o final de 2012. A campanha contra a “PEC da Impunidade”, como foi chamada à época, vinha surtindo efeito, e vários manifestantes de 17 e 20 de junho em São Paulo já haviam exibido cartazes contra a proposta.
Um dos presentes que discursou no evento do Masp foi Renan dos Santos, que no ano seguinte seria um dos fundadores do Movimento Brasil Livre (MBL).
Novos protestos em Curitiba e Belo Horizonte – A capital mineira é palco de protestos que reuniram mais de 60 mil pessoas em uma marcha em direção ao Estádio do Minerão, palco de partida pela Copa das Confederações. Houve confronto com a polícia. Na ocasião, um jovem despencou de um viaduto – ele morreu no hospital três semanas depois.
Curitiba também é palco de protestos violentos, que reúnem 10 mil pessoas. Alguns manifestantes vandalizam diversos prédios e instalações públicas no Centro Cívico da cidade. Vinte e seis são detidos. O perfil dos presos é diverso: estudantes, mecânicos, servidores públicos, militares, serventes de pedreiro, empresários e desempregados.
24 de junho – Dilma propõe cinco pactos e nova Constituinte
Em meio à crise, a presidente Dilma Rousseff propõe durante uma reunião com governadores e prefeitos de capitais a adoção de cinco “pactos nacionais” em áreas como responsabilidade fiscal, reforma política, saúde, transporte e educação.
Entre as propostas estão melhoria dos serviços públicos, contratação de médicos estrangeiros (que viriam a ser os cubanos do Mais Médicos), destinação de royalties do petróleo para a educação, e endurecimento da legislação para combater a corrupção.
A ideia mais chamativa – e controversa – envolve a convocação de um plebiscito para que o eleitorado fosse consultado sobre a convocação de uma constituinte que trataria exclusivamente da reforma política.
O plano da Constituinte foi abandonado em 24 horas, diante da má repercussão e críticas de juristas. Mas medidas na área de saúde e no endurecimento da legislação contra a corrupção avançam.
25 de junho – Câmara derruba PEC 37
Sob pressão das ruas, a Câmara derruba a PEC 37. A proposta, que chegou a ter 207 assinaturas a seu favor quando foi apresentada, acabou rejeitada por 430 deputados. Apenas nove votam a favor – e dois deles afirmam depois que foi por engano.
26 de junho – STF ordena prisão de deputado em exercício, a primeira desde 1988
Pela primeira vez desde a entrada em vigor da Constituição de 1988, o Supremo Tribunal Federal (STF) determina a prisão de um deputado federal em exercício do mandato. Natan Donadon, que representava Rondônia na Câmara, já havia sido condenado a 13 anos por desvios na Assembleia Legislativa do seu estado. Sua defesa protesta e afirma que clima das ruas influenciou decisão.
Protestos menores de pauta única em SP – A tendência de substituição de megaprotestos por manifestações menores de pauta única se consolida em São Paulo. No mesmo dia, na Avenida Paulista, três grupos distintos realizam concentrações.
Algumas centenas protestam contra um projeto de lei que previa o fim da proibição, pelo Conselho Federal de Psicologia, de tratamentos que se propõem a reverter a homossexualidade. Apelidado de “cura gay”, o projeto havia sido aprovado no dia 19 em uma comissão da Câmara presidida pelo evangélico Marco Feliciano – o texto acabou sendo arquivado em julho.
Outro grupo, formado por profissionais de saúde, protesta contra os planos do governo de contratar médicos estrangeiros.
No vão do Masp, uma pequena concentração de pessoas, entre idosos e pessoas com roupas camufladas e bandeiras do Brasil, pede a “volta dos militares” ao poder e uma “intervenção militar” no país.
Senado aprova projeto para tornar corrupção crime hediondo – Com o apoio de Dilma, o Senado aprova um projeto de lei para aumentar as penas para o crime de corrupção e tornar esse tipo de delito crime hediondo, considerado de maior gravidade. À época, a presidente parabeniza os senadores pela votação. No entanto, o projeto cairia no esquecimento após ser remetido à Câmara.
Fim do voto secreto em cassações – Uma comissão da Câmara dá sinal verde para proposta que acaba com o voto secreto durante decisões para cassação de mandato. A medida foi promulgada pelo Congresso em novembro. O deputado Natan Donadon se tornaria em 2014 o primeiro deputado a ser cassado em votação aberta.
29 de junho – Popularidade de Dilma despenca
Pesquisa Datafolha aponta para uma queda vertiginosa da aprovação de Dilma no espaço de apenas três semanas. No início de junho, quando os protestos eram ainda limitados, Dilma era aprovada por 57% da população. No dia 29 de junho, o índice havia caído para 30%, queda de 27 pontos percentuais.
De acordo com o Datafolha, essa seria a maior redução de aprovação de um presidente entre uma pesquisa e outra desde o confisco da poupança por Collor em 1990.
Outros políticos também passam a enfrentar ondas de queda de aprovação em espaço de semanas, como Alckmin (de 52% para 38%), o governador fluminense Sérgio Cabral (55% para 25%) e Haddad (34% para 18%).
30 de junho – Protestos começam a arrefecer
Ao longo de julho, com exceção de algumas manifestações pontuais em São Paulo e outras capitais, que acabaram sendo dominadas por black blocs, o país começa a ver um arrefecimento da onda de grandes protestos. Movimentos mais relevantes só continuaram a mostrar alguma força no Rio de Janeiro, onde manifestações contra o governo Cabral e autoridades locais se estenderam até outubro, com forte repressão policial.
1 e 2 de agosto – Dilma sanciona medidas de combate à corrupção
A presidente Dilma assina uma série de medidas de um pacote anticorrupção, como um projeto que definia organizações criminosas e autorizava instrumentos como delação premiada, além de uma lei que previa punição para empresas acusadas de corrupção. Os efeitos das medidas começariam a ser sentidos poucos meses depois, a partir de março de 2014, data de início da operação Lava Jato.