Uma pesquisa realizada no Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP identificou uma correlação entre a alta concentração de proteína liberada na fase aguda das infecções com o agravamento nos casos de covid-19. O estudo, que tem como principal autora a aluna de doutorado Fabiola Cardoso Mestriner, realizou testes com amostras de sangue de 56 pessoas hospitalizadas no Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto com casos graves de infecção pelo coronavírus.

A proteína em questão é a alfa-1-glicoproteína ácida (AGP), mais conhecida como orosomucoide, produzida em grande parte pelo fígado e que tem sua síntese aumentada em casos de infecções agudas – quando a doença começa a demonstrar os primeiros sintomas clínicos, como por exemplo, a febre.

Aumento de carga viral

A pesquisa revelou que, em casos graves de covid-19, a AGP acaba inibindo a liberação das redes extracelulares (NETs), que são respostas imunológicas imediatas a infecções, produzidas por neutrófilos, os famosos glóbulos brancos. As NETs fazem parte da primeira linha de defesa do organismo contra invasores e são fundamentais para a ativação da imunidade inata contra antígenos gerados ao longo da vida. Com isso, aumenta-se a concentração da quantidade de vírus no organismo humano, a chamada carga viral. Consequentemente, quanto maior a quantidade de agentes infecciosos, mais grave pode ser a doença, o que poderia explicar a piora no quadro dos pacientes internados em CTI por covid-19.

“A AGP também atua nos neutrófilos aumentando a expressão de uma das enzimas produtoras de óxido nítrico (NO)”, explica Fabíola Mestriner ao Jornal da USP. “Esse aumento está relacionado com outras graves doenças descritas na literatura e presentes na covid-19, como o edema pulmonar, a hipoxemia e a hipertensão pulmonar arterial”, diz a doutoranda. A hipoxemia é uma grave condição caracterizada por baixos níveis de oxigênio no sangue, podendo ocasionar danos perigosos a órgãos vitais.

A pesquisa foi selecionada para ser apresentada no congresso Scientific Sessions, organizado pela American Heart Association’s (AHA) e conquistou prêmio na sessão de pesquisas científicas sobre covid-19.

Novo ângulo de análise

De acordo com a professora Christiane Becari, do Programa de Pós-Graduação em Clínica Cirúrgica da FMRP e docente da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB) da USP, o objetivo do estudo foi contribuir para a produção científica e pesquisa sobre o coronavírus. “Em março de 2022 falava-se que o SARS-CoV-2, o vírus que produz a covid-19, se liga à enzima que era foco do nosso estudo para doenças vasculares. Então, vimos como nós poderíamos contribuir”, explica a docente.

Feito em colaboração com múltiplos departamentos da FMRP, o estudo abre portas para a análise da fase aguda de outras doenças com base na dinâmica entre a AGP, os neutrófilos e suas NETs. “Acreditamos que a AGP pode ser um bom marcador para um prognóstico ruim de algumas doenças, como na própria covid-19, por ser uma proteína que o próprio organismo faz, mas que tem ações sobre a resposta de cada indivíduo frente à doença, diz Becari.

Mais informações em: e-mail famestri@usp.br, com Fabiola Mestriner