24/03/2023 - 12:30
Entre os incômodos da camisinha e os riscos da pílula para as mulheres, há anos cientistas testam medicamentos contraceptivos para o homem, para ingestão regular ou “sob demanda”. Mas ainda há muita pesquisa pela frente.Ninguém gosta de preservativos: eles cheiram mal, tiram o prazer do sexo, alguém tem que jogá-los no lixo depois. E vasectomias? Quem quer um cirurgião mexendo lá embaixo com um bisturi? Mas, que outras opções os homens têm, para evitar que sua parceira tenha uma gravidez não planejada?
“A 50% da população mundial faltam meios de colocar suficientemente em prática seus desejos de saúde reprodutiva”, avalia Hannah Vahdat, diretora executiva da organização Male Contraceptive Initiative (MCI), que promove a pesquisa de contraceptivos masculinos.
Essa situação pode estar prestes a mudar, pois os fabricantes de medicamentos estão desenvolvendo vários métodos diferentes de controle de natalidade masculino, e os resultados parecem promissores.
“Precisamos de vários produtos”, explica Vahdat. “Há quem queira uma pílula todos os dias, para saber que está protegido, mas outras querem tomar uma pílula de acordo com a necessidade, antes do sexo.”
Contracepção masculina hormonal
Há duas abordagens principais para a contracepção masculina. Uma é o método hormonal análogo à pílula feminina, tomada todos os dias durante vários meses ou anos para providenciar contracepção de longo prazo.
A outra abordagem são medicamentos on-demand, a serem tomados logo antes do sexo para fornecer contracepção de curta duração. “No momento é bem excitante trabalhar com as pílulas sob demanda, mas são os produtos hormonais que provavelmente vão sair mais cedo”, explica Vahdat.
Ambos os métodos de controle de natalidade impedem o desenvolvimento dos espermatozoides, causando infertilidade temporária. A espermatogênese volta ao normal quando se deixa de tomar o contraceptivo.
Um ensaio clínico em 2022 mostrou que um gel hormonal tópico, aplicado no ombro de um homem todos os dias, impedia que suas parceiras engravidassem. O gel continha hormônios sintéticos, inclusive testosterona, enviando ao cérebro a mensagem para inibir a espermatogênese nos testículos.
O produto reduz a produção a 1 milhão de espermatozoides por mililitro de sêmen, em vez dos típicos 15 a 200 milhões de um homem saudável. Esse controle de natalidade é reversível, pois os níveis de esperma voltaram ao normal cerca de quatro meses após a interrupção do uso do gel. No entanto, assim como a pílula feminina, para o sucesso do controle de natalidade os homens precisavam usar o gel regularmente.
“A espermatogênese precisa de sete a dez semanas, portanto um homem tem que tomar uma pílula hormonal todos os dias durante esse período, antes que sua contagem de esperma seja baixa o suficiente para ele ser essencialmente infértil. Então tem que tomá-la continuamente. Mas se quiser parar, leva as mesmas sete a dez semanas para a fertilidade voltar”, relata Jochen Buck, professor de farmacologia da Weill Cornell Graduate School of Medical Sciences, nos Estados Unidos.
Controle de natalidade masculino não-hormonal
Os medicamentos contraceptivos não hormonais agem de forma semelhante, mas em vez de alterar a sinalização hormonal, eles agem sobre desencadeadores moleculares específicos da espermatogênese.
O gossipol, extraído da planta do algodão, é uma dessas drogas não-hormonais, que provoca infertilidade ao inibir a espermatogênese. Experimentos mostram que ele funciona, mas talvez bem demais, pois em mais de 20% dos casos sua ação não foi reversível.
Contudo, há cientistas trabalhando em substâncias mais promissoras. Num estudo recente, publicado na revista Nature Communications, a equipe de pesquisadores americanos e alemães apresentou um método contraceptivo masculino diferente, que retém o esperma nos testículos, pelo menos em camundongos.
“O esperma é fabricado nos testículos. Após a ejaculação, os espermatozoides se misturam com o fluido do seminal, o qual contém um sinal para que ponham em movimento e comecem a buscar. Sem isso, eles nunca sairiam da vagina para fertilizar o óvulo”, explica Buck, que lidera a pesquisa.
Sua equipe descobriu que a enzima adenilil clicase (AC) dá esse sinal de partida aos gametas, e está testando os efeitos de uma droga inibidora efeitos no controle da natalidade. “Demos aos camundongos machos uma única dose do medicamento que bloqueia a adenilil clicase, 30 minutos antes do acasalamento, e descobrimos que os tornava inférteis por várias horas.”
Trata-se de uma revolução para o controle de natalidade masculino e uma abordagem inédita, pois é sob demanda. Os homens poderiam teoricamente tomar uma única dose da droga 30 minutos antes de ter relações sexuais, e só voltariam a estar férteis pela manhã. Porém até agora o método só teve sucesso em animais.
Anticoncepcionais masculinos são seguros?
Muitos homens teriam efeitos colaterais semelhantes aos sentidos pelas mulheres que tomam a pílula feminina.
“As abordagens hormonais dos anticoncepcionais masculinos trazem os riscos de administração de testosterona, portanto efeitos sobre o humor, impacto sobre a libido, ganho de peso (principalmente muscular), redução do (bom) colesterol HDL, suores noturnos”, relata John K. Amory, pesquisador de saúde reprodutiva masculina da Universidade de Washington, nos EUA.
Quem usa contracepção masculina hormonal também pode ser banido dos esportes que fazem testes antidoping para hormônios esteroides. Os efeitos colaterais são, em parte, a causa do atraso no desenvolvimento de contraceptivos masculinos. Testes promissores foram interrompidos precocemente após os participantes terem relatado efeitos colaterais adversos.
Apesar dos esforços para solucionar essas questões de segurança, não está claro quando os contraceptivos serão considerados seguros o suficiente para serem disponibilizados comercialmente.
Quanto ao medicamento sob demanda de Jochen Buck e equipe, também é cedo demais para fazer prognósticos. No estudo, os camundongos que receberam a pílula voltaram a ficar férteis alguns dias depois. Mas isso pouco diz sobre outros eventuais efeitos colaterais, ou como os homens reagirão ao medicamento em ensaios clínicos.
Ainda há muito a ser feito para melhorar as propriedades químicas do medicamento, antes que testes rigorosos de segurança e eficácia em humanos possam ser realizados. Tudo isso pode levar de cinco a 15 anos.
Até lá, o melhor é ficar com os preservativos, sobretudo no Brasil ou na França, onde são gratuitos!