Investidores esperavam clima favorável com a eleição de Trump em novembro. Agora, mercados estão assustados com a possibilidade de que a maior economia do mundo esteja próxima de uma recessão.O retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos soava para muitos investidores como uma provável bonança para o mercado de ações, que já havia atingido recordes históricos há alguns meses graças ao boom da inteligência artificial (IA).

O argumento era de que Trump, teoricamente hábil e negociador, agiria de maneira sensível a qualquer incerteza nos mercados financeiros causada por sua política tarifária e, assim, se necessário, interviria para estabilizar os preços.

Mas depois de semanas de incertezas devido às medidas protecionistas de Trump, na segunda-feira (10/03) as ações americanas caíram vertiginosamente, em meio a temores de que a maior economia do mundo possa entrar em recessão ainda este ano.

O índice Dow Jones caiu quase 900 pontos; o S&P 500, 2,7%; e o Nasdaq, com 4%, teve sua maior queda em dois anos e meio.

Tesla lidera baixa

A Tesla, empresa de carros elétricos chefiada por Elon Musk, grande aliado de Trump, despencou 15%, enquanto as ações das chamadas “Magnificent 7” – as “sete empresas magníficas”, ou seja, Apple, Microsoft, Google Alphabet, Amazon, Nvidia, Meta e Tesla – entraram coletivamente em declínio. Essas ações perderam mais de 20% do seu valor desde dezembro, como observou o Deutsche Bank.

Somadas, as fortunas dos cinco bilionários que compareceram à posse de Trump encolheram em 209 bilhões de dólares (R$ 1.211,8 bilhões) desde o dia 20 de janeiro, informou a agência de notícias Bloomberg. Musk sozinho perdeu 144 bilhões de dólares (R$ 834,9 bilhões).

Por um lado, os mercados até pareciam estar reagindo bem aos comentários feitos por Trump no fim de semana, quando o presidente americano minimizou o impacto de suas ameaças tarifárias a Canadá, México e outros parceiros comerciais importantes.

O republicano também pareceu desdenhar dos possíveis impactos que sua estratégia de negociação teria sobre as ações.

“Pode haver uma pequena perturbação [nos mercados financeiros]. O que eu tenho que fazer é construir um país forte. Não dá para ficar de olho no mercado de ações”, disse Trump ao canal Fox News no domingo à noite.

“O presidente Trump parece ter abandonado o mercado americano de ações e está disposto a colocar sua visão política acima das perspectivas de curto prazo para a economia dos EUA”, escreveu Kathleen Brooks, diretora de pesquisa da plataforma de negociação XTB, na segunda-feira, após as quedas nos mercados.

Após o fechamento do mercado, o banco de investimentos Citi rebaixou as ações americanas de “robustas” para “neutras”, alertando que agora acredita que o impulso de crescimento dos EUA “ficará aquém” do resto do mundo.

O banco britânico HSBC também reduziu as ações americanas para “neutras” em relação aos próximos três a seis meses, dizendo que o credor vê, “no momento, melhores oportunidades em outros lugares”.

Sem “pouso suave”?

Legisladores americanos passaram o último ano tentando evitar que a economia entrasse em recessão. As taxas de juros caíram após um recente pico de 5,33%, o que ajudou a reduzir uma inflação que vem crescendo há décadas.

As políticas tarifárias de Trump, porém, ameaçam interromper os esforços para alcançar um chamado “pouso suave” em meio à crise. Novas taxas de 25% sobre todas as importações de aço e alumínio para os EUA devem entrar em vigor nesta quarta-feira, enquanto as novas tarifas sobre produtos chineses dobraram para 20%.

Susannah Streeter, diretora financeira e de mercados da Hargreaves Lansdown, alertou que “a hipótese de uma recessão nos EUA está à espreita, com a confiança do consumidor caindo, as empresas enfrentando uma complexidade comercial cada vez maior e os investidores ficando mais nervosos”.

Além disso, os vastos cortes no setor público liderados pelo chamado Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, na sigla em inglês), sob o comando de Musk, ameaçam frear o crescimento, uma vez que tirarão empregos e investimentos da economia.

“Mercado e economia viciados”

O Secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, reconheceu na semana passada que este é um período de “ajuste natural”, à medida que o volume maior de gastos nos EUA migrou do setor público para o setor privado.

“O mercado e a economia estão viciados. Ficamos viciados nos gastos do governo, e haverá um período de desintoxicação”, afirmou Bessent à rede CNBC na sexta-feira, acrescentando que um “um único ajuste de preço” seria algo esperado pela política tarifária de Trump.

Atualmente paira sobre os EUA a ameaça de uma paralisação parcial do governo, caso o Congresso não aprove um plano de Trump para os gastos públicos. A medida ainda depende do aval do Senado, onde terá que ser endossada também pela oposição democrata.

A última vez em que o governo americano parou por falta de dinheiro foi entre o final de 2018 e o início de 2019, por 35 dias, durante o primeiro mandato de Trump.

Menos crescimento, mais inflação

O Goldman Sachs reduziu a previsão de crescimento para a economia dos EUA em 2025 de 2,4% para 1,7%. O banco americano de investimentos também aumentou a previsão de inflação para 3% – acima, portanto, dos 2% previstos anteriormente.

“O motivo do rebaixamento é que nossas premissas de política comercial se tornaram consideravelmente mais adversas”, escreveu Jan Hatzius, analista do Goldman.

Enquanto isso, o governo Trump insiste que mais tarifas sobre importações e cortes de impostos ajudarão a impulsionar a economia.

Em um comunicado na segunda-feira, o porta-voz da Casa Branca, Kush Desai, escreveu que os líderes industriais e setoriais reagiram ao segundo mandato de Trump “com trilhões em compromissos de investimento”.

“O presidente Trump proporcionou um crescimento histórico de empregos, salários e investimentos em seu primeiro mandato, e está pronto para fazer isso novamente no segundo mandato”, afirmou Desai.