Trump avalia remover tropas da fronteira polonesa com a Ucrânia. Para críticos, movimento é “presente” para Vladimir Putin e deixa país vulnerável.A decisão do exército americano de reposicionar suas forças estacionadas em Jasionka, no sudeste da Polônia, próximo à fronteira com a Ucrânia, chegou como um choque para o país.

O comunicado emitido na última segunda-feira informa ainda que o deslocamento das tropas é “parte de uma estratégia mais ampla para otimizar as operações militares dos EUA.” Os soldados serão redistribuídos para outras regiões do país.

No entanto, um relatório obtido pela emissora americana NBC News indica que o movimento da Casa Branca pode ser mais significativo. Citando fontes americanas e europeias, o veículo informou que o Pentágono considera retirar definitivamente, e não apenas reposicionar, 10.000 soldados americanos que estão na Romênia e na Polônia.

O contingente faz parte dos 20.000 militares adicionais enviados pelo governo do ex-presidente Joe Biden a toda a Europa para reforçar a segurança do continente após a invasão russa na Ucrânia.

As tropas americanas estão estacionadas em Jasionka desde o início de 2022. O aeroporto militar próximo, de Rzeszow, se tornou a rota mais importante para a entrega de armas ocidentais à Ucrânia. 95% de toda a ajuda militar para o país passa pelo local.

Para analistas, o movimento é tomado como uma aproximação de Washington com Moscou e um sinal preocupante para os europeus.

A presença de tropas norte-americanas no antigo bloco comunista é um incômodo constante para o Kremlin e, em 2021, o presidente russo Vladimir Putin exigiu a retirada das forças aliadas do flanco oriental da Otan.

EUA é histórico garantidor de segurança

Desde o colapso do comunismo e a restauração da independência polonesa em 1989, a Polônia tem os Estados Unidos como o mais importante aliado e garantidor de sua segurança.

Sua adesão à Otan é respaldada por uma forte relação bilateral com os EUA, que conta com o apoio de todas as forças do espectro político polonês.

Durante sua primeira visita a Varsóvia como Secretário de Defesa de Donald Trump, Pete Hegseth disse que os EUA não reduziriam sua presença militar no país.

No total, cerca de 100.000 soldados americanos estão baseados na Europa, pouco mais de 65.000 deles em caráter permanente, de acordo com o Pentágono.

O general Christopher Cavoli, chefe das forças dos EUA na Europa, afirmou em audiência na Câmara dos Deputados damericana que estes números são constantemente revisados.

“Eu recomendei consistentemente manter as forças que temos e continuarei a fazê-lo”, disse ele.

Na mesma audiência, a representante do Pentágono Katherine Thompson afirmou que há uma revisão em curso dos destacamentos militares dos EUA em todo o mundo com base nos “interesses declarados” pelo presidente Donald Trump.

Trump tem argumentado repetidamente que manter a presença militar dos EUA em todo o mundo é muito caro e que a prioridade estratégica do país é a China. Ele também cogita retirar o país da Otan.

“Nenhuma decisão foi tomada neste momento como parte da revisão da força global”, disse Thompson.

Polônia na linha de frente da UE e da Otan

Devido à sua localização na fronteira leste da União Europeia e ao fato de ser vizinha da Ucrânia, a Polônia se vê como possível alvo de uma agressão russa.

No entanto, o governo polonês minimiza a decisão de Washington. O primeiro-ministro Donald Tusk e o Ministério da Defesa enfatizaram que haverá apenas um “reposicionamento planejado” de tropas dentro do país, e que a medida foi acordada com a Polônia.

Ele também afirmou que os americanos lhe asseguraram que os soldados não vão deixar o país e não haverá redução de tropas na Europa como um todo.

Segundo a Polônia, o hub militar de Jasionka está protegido pelos sistemas Patriot alemães e NASAMS noruegueses desde janeiro.

O presidente polonês Andrzej Duda também defendeu que “não há uma retirada do exército” e chamou os relatos da mídia de “blá blá blá”.

Duda está alinhado com o partido nacional-conservador de oposição Lei e Justiça (PiS) e tem estreitos laços com a administração Trump. Ele viajou para os EUA em março, determinado a ser o primeiro chefe de estado europeu a visitar o presidente americano reeleito.

Dariusz Lukowski, chefe do Escritório de Segurança Nacional da Polônia, enfatizou que as atividades na base de Jasionka não seriam reduzidas. Segundo ele, a decisão da administração dos EUA foi motivada apenas por razões econômicas.

Presente para Putin?

O cientista político polonês Bartosz Wielinski descreveu a decisão de mover as tropas como “um mau sinal”. “Em jargão corporativo, otimização significa cortar custos. As rédeas do poder na América agora estão nas mãos de pessoas que querem transformar o estado em uma corporação. E elas estão usando um machado, não um bisturi, para fazer isso”, disse.

“Trump está destruindo o poder da América”, escreveu Bogdan Chrabota no jornal polonês Rzeczpospolita. “Esta é uma má notícia para Kiev e uma boa notícia para Moscou, porque o Kremlin já sabe que o novo presidente dos EUA é um criador de problemas e não um estadista responsável.”

O ex-ministro das Relações Exteriores da Polônia, Jacek Czaputowicz, concorda. “A decisão dos EUA veio cedo demais. Teria sido melhor esperar por um ponto de inflexão na guerra na Ucrânia. Isso enfraquece o Ocidente em relação à Rússia. Na minha opinião, foi intencional”, disse ele ao canal de notícias comercial TVN24 nesta quarta-feira.

Czaputowicz acrescentou que a medida deve ser tomada como um “sinal de uma mudança na política dos EUA.”

“Vladimir Putin certamente aprecia esse gesto (…). Isso confirma a cooperação emergente entre Rússia e EUA”, disse.

George Scutaru, fundador do New Strategy Center e ex-conselheiro de segurança nacional da presidência da Romênia, entede que uma redução de tropas incentivaria a agressão russa “em relação à Europa, na Europa”.

“Isso será interpretado como uma grande concessão feita pelos Estados Unidos à Rússia”, disse ele à agência de notícias AFP.

“Tal redução aumentaria as preocupações sobre a confiabilidade dos EUA como aliado e as preocupações de que os EUA estejam trabalhando em algum tipo de acordo com os russos às custas da segurança dos países da região”, acrescentou Kacprzyk.

Questão nas eleições presidenciais?

Faltando cerca de cinco semanas para as eleições presidenciais na Polônia, a questão das tropas dos EUA agora faz parte do debate político interno do país.

“Devemos soar o alarme”, disse o ex-primeiro-ministro Mateusz Morawiecki, do PiS.

“Estou decepcionado que o governo polonês não tenha feito nada para combater isso. Alegações de que o reposicionamento das tropas foi planejado são apenas uma tentativa de salvar a pele”, disse ele. “Duda construiu relações fortes com a América. Infelizmente, o governo Tusk não deu continuidade a essa política. Estamos agora vendo as consequências disso.”