14/04/2025 - 7:00
Último membro de geração que popularizou literatura latino-americana no mundo nos anos 60 e 70, Vargas Llosa morreu em sua casa em Lima. Prêmio Nobel de Literatura e autor de mais de 30 romances tinha 89 anosÚltimo membro de uma geração dourada da literatura latino-americana, o escritor peruano Mario Vargas Llosamorreu neste domingo (13/04) aos 89 anos, em sua residência em Lima, informou nas redes sociais a família do vencedor do Prêmio Nobel de Literatura de 2010.
Vargas Llosa integrou o chamado “boom latino-americano”, que popularizou a literatura da região mundo afora nos anos 60 e 70, ao lado de outros grandes nomes como o colombiano Gabriel García Márquez, o argentino Julio Cortázar e os mexicanos Carlos Fuentes e Juan Rulfo.
“Com profundo pesar, tornamos público que nosso pai, Mario Vargas Llosa, faleceu hoje pacificamente em Lima, cercado por sua família”, escreveu o filho Álvaro Vargas Llosa em sua conta na rede X.
“Sua partida entristecerá seus parentes, seus amigos e seus leitores em todo o mundo, mas esperamos que encontrem consolo, como nós, no fato de que desfrutou de uma vida longa, múltipla e frutífera, e deixa atrás de si uma obra que o sobreviverá”, diz a mensagem.
A família explicou que, nos próximos dias, procederá “de acordo com as instruções dele”, entre elas a de que não seja realizada “nenhuma cerimônia pública”.
“Nossa mãe, nossos filhos e nós mesmos confiamos que teremos espaço e privacidade para nos despedirmos dele como uma família e na companhia de seus amigos mais próximos. Como ele desejava, seus restos serão cremados”, diz a mensagem.
Retorno a Lima e à ex-mulher
Vargas Llosa voltou a morar em seu apartamento na capital do Peru, no bairro boêmio de Barranco e com vista para o Oceano Pacífico em 2022, onde retomou o relacionamento com a esposa, Patricia Llosa, e as caminhadas pela cidade.
Em novembro do ano passado ele visitou o local onde ficava o bar La Catedral, que inspirou seu famoso romance Conversa na catedral, publicado em 1969. Alguns dias antes, Álvaro Vargas Llosa publicou uma foto do pai em frente ao Colégio Militar Leôncio Prado, onde estudou e onde, como contou, consolidou sua vocação literária.
O autor de Batismo de fogo (1963) e Lituma nos Andes (1993) ganhou o Nobel de Literatura de 2010 por sua “cartografia das estruturas de poder e imagens acerbas de resistência, rebelião e derrota do indivíduo”.
Vargas Llosa tornou-se o primeiro autor a ingressar na Academia Francesa de Letras sem ter obras em francês, em fevereiro de 2023. Em seu discurso, disse que, “graças à França”, onde começou a escrever alguns de seus romances mais notáveis, descobriu “outra América Latina”.
Ele sempre mostrou uma grande capacidade e disciplina para o trabalho e um desejo vital que o levou a se envolver em diferentes campos além da escrita. Por exemplo, foi candidato à presidência do Peru em 1990.
Com uma vida marcada pelo sucesso – exceto pelo fracasso de sua experiência política –, o apreço dos leitores e todos os prêmios possíveis (Nobel, Cervantes e Príncipe de Astúrias, entre outros), Vargas Llosa enfrentou na juventude a resistência do pai, um homem autoritário que nunca quis que ele fosse escritor.
Nos últimos meses, moradores de Barranco se acostumaram com a imagem de Vargas Llosa, apoiado em sua bengala, andando pelas esquinas de sua amada Lima.
Importante voz da literatura latino-americana
Jorge Mario Pedro Vargas Llosa nasceu em Arequipa, Peru, em 28 de março de 1936. Ele passou a infância na Bolívia com sua mãe solteira, que pertencia à classe média peruana, antes de toda a família se estabelecer no norte do Peru.
Quando adolescente, frequentou o Colégio Militar Leôncio Prado em Lima e depois trabalhou como jornalista local. Vargas Llosa publicou seus primeiros contos como estudante de direito e literatura no final dos anos 1950. Em 1959, ele se mudou para Paris por alguns anos.
Seu primeiro romance, Batismo de fogo, foi publicado em 1963 e se tornou um sucesso imediato. O livro se passa no colégio militar que ele frequentou quando era adolescente. Três anos depois, foi publicado A casa verde, também ambientado no Peru. A obra consolidou definitivamente a reputação de Vargas Llosa como a nova voz mais importante da América Latina.
Nas décadas seguintes, Vargas Llosa escreveu vários outros romances de sucesso, incluindo A guerra do fim do mundo (1981), sobre sobre a Guerra de Canudos, obra que ele dedica ao escritor brasileiro Euclides da Cunha, autor de Os sertões.
Outras obras do escritor incluem “Pantaleão e as Visitadoras” (1973), “Quem Matou Palomino Molero?” (1986), “Elogio da Madrasta” (1988) e Os Cadernos de Dom Rigoberto” (1997).
Atividade política
Vargas Llosa viveu em muitas cidades do mundo ao longo de sua carreira e lecionou em universidades nos EUA, na América do Sul e na Europa. De 1976 a 1979, ele foi presidente da associação internacional de escritores PEN. Foi também politicamente ativo durante toda a sua carreira. Como muitos outros escritores de sua geração, foi influenciado pelo marxismo em sua juventude, mas depois se voltou para a democracia liberal. Em 1990, ele se candidatou à presidência do Peru, mas não conseguiu se eleger, perdendo para o autoritário Alberto Fujimori.
Mais tarde, se tornou cidadão espanhol. O rei Juan Carlos elevou Vargas Llosa à nobreza em 2011 e lhe concedeu o título hereditário de Marquês de Vargas Llosa. Em uma entrevista ao site dinamarquês Louisiana Channel em 2020, o autor advertiu que “as imagens substituíram as ideias como as grandes protagonistas da cultura contemporânea”. Um fenômeno que o preocupa, “porque se as imagens substituírem completamente as ideias, os poderosos deste mundo serão capazes de manipular a sociedade com muita facilidade”.
Nos seus últimos anos de vida, porém, Vargas Llosa passou a pender cada vez mais à direita, chegando a declarar apoio à candidatura presidencial de Keiko Fujimori – filha de Alberto – em 2021 e a afirmar em 2022 que preferia ver Jair Bolsonaro vencer Lula no Brasil.
Vida privada
Mario Vargas Llosa foi casado duas vezes. Seu segundo casamento com Patricia, sua prima de primeiro grau, durou mais de 50 anos. Em 2015, o Prêmio Nobel de Literatura virou alvo dos paparazzi quando foi revelado publicamente seu romance com Isabel Preysler, ex-mulher do cantor espanhol Julio Iglesias e viúva do ex-ministro da Economia espanhol Miguel Boyer, e Vargas Llosa deixou sua esposa Patricia. Preysler e Vargas Llosa se separaram em 2022.
Vargas Llosa também teve uma grande amizade com o escritor colombiano García Márquez, que terminou abruptamente com um soco do peruano, em um episódio cercado de mistério. “Que os biógrafos se encarreguem desse tema”, disse Vargas Llosa.