17/04/2025 - 15:19
Embora não tenham a melhor reputação, eles são essenciais para a manutenção da vida no planeta. Com muitas espécies em risco, os cientistas dizem que cabe aos humanos ajudá-las.O reino Fungi – segundo maior reino de seres vivos, depois dos animais – está em um momento de destaque. Não porque sirva como espinha dorsal de ecossistemas saudáveis, mas porque está em risco.
Pela primeira vez na história, mais de mil espécies de fungos foram adicionadas à Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), frequentemente chamada de “Barômetro da Vida”.
Como muitos organismos, essas espécies de fungos – que representam apenas uma pequena fração daquelas que se acredita existirem – estão em risco devido a uma combinação de fatores, incluindo desmatamento, desenvolvimento urbano e toxinas.
“Os fungos são especialmente vulneráveis à poluição, principalmente por fertilizantes e emissões de combustíveis fósseis”, disse Lynne Boddy, especialista em ecologia fúngica da Universidade de Cardiff, no Reino Unido.
Ela afirma que protegê-los exige ações direcionadas, porque eles têm “necessidades específicas e devem ser considerados de acordo com suas próprias características nos esforços de conservação, e não apenas agrupados com outros organismos”.
Não é a “espécie mais fofinha” da floresta
Mas nem sempre é fácil conscientizar as pessoas sobre os fungos – que muitas vezes são vistos como ingrediente de pizza, na forma de cogumelos, ou um complemento indesejado para uma parede úmida, em se tratando de mofo.
“Muitos se importam com os animais, principalmente se forem organismos fofinhos e amigáveis com os quais as pessoas têm alguma afinidade, como os pandas”, disse Boddy, acrescentando que a maioria dos fungos não tem esse efeito emotivo. “Talvez os humanos não consigam se apegar a eles”, acrescenta.
Os fungos podem não ganhar concursos de fofura, mas desempenham um papel importante na manutenção da coesão de toda a teia da vida. Dependendo do tipo, os fungos são encontrados em diversos ambientes: do solo e florestas a lagos de água doce, ecossistemas marinhos e até mesmo na pele humana.
Os fungos micorrízicos sustentam ecossistemas florestais, ajudando as plantas a trocar nutrientes, água e até mesmo informações, formam relações simbióticas com as raízes da maioria da flora e são essenciais para o crescimento de até 90% das espécies de plantas.
Em outras palavras: “A vida na Terra depende de fungos”, disse Gregory M. Mueller, cientista-chefe do Jardim Botânico de Chicago, nos EUA.
Eles também são essenciais para a morte na Terra. Conhecidos como recicladores da natureza, eles desfazem madeira morta ou em decomposição, folhas e outras matérias vegetais. “Sem eles, estaríamos soterrados sob montes de lixo orgânico”, disse Mueller, que lidera os programas de fungos da IUCN e contribuiu para a recente Lista Vermelha.
Vital na captura de carbono e segurança alimentar
Embora florestas e pastagens sejam geralmente consideradas reservas de carbono, são os fungos que ajudam a capturar o carbono no solo. Mueller afirmou que os fungos são “essenciais para o sequestro de carbono a longo prazo”, o processo de retenção de carbono para que não contribua para o aquecimento global.
“Sem eles, a mudança climática seria muito pior”, afirmou o especialista.
Os fungos micorrízicos são responsáveis por armazenar até um terço das emissões globais anuais de combustíveis fósseis no solo. O que os tornam a “instalação” de armazenamento de carbono mais eficiente do mundo.
Ao mesmo tempo, os fungos são afetados pelas mudanças climáticas, em grande parte por meio de alterações nos níveis de hidratação. Mueller cita o exemplo do Brasil, onde as florestas nubladas em montanhas dependem de certos níveis de umidade, que vêm diminuindo paralelamente às mudanças nos padrões de precipitação.
Ele afirma que isso não apenas altera o habitat, mas “afeta as plantas das quais os fungos dependem; elas secam e impedem que os fungos completem seu ciclo de vida”.
Um mundo sem fungos não só se tornaria menos propício à vida humana devido ao aumento das temperaturas globais e aos eventos climáticos extremos relacionados, como também as árvores e as plantações cresceriam mais fracas, mais lentamente e se tornariam mais vulneráveis a doenças e à seca.
E isso impactaria a disponibilidade de alimentos e medicamentos. Cerca de 40% dos medicamentos modernos no mundo ocidental são derivados de plantas. Entre eles, por exemplo, a galantamina, derivada de Galanthus nivalis para tratar a doença de Alzheimer, ou a apomorfina, um composto semissintético extraído da morfina, Papaver somniferum, usada para tratar a doença de Parkinson.
Os fungos são uma parte tão integral da teia da vida que, se desaparecessem, a maioria das formas de vida, incluindo os humanos, não sobreviveria.
“Se não houvesse fungos no solo, acho que não haveria vida na Terra. As plantas provavelmente colonizaram o solo junto com os fungos e, sem eles, o mundo como o conhecemos talvez nunca tivesse existido”, disse Aishwarya Veerabahu, cientista do departamento de botânica da Universidade de Wisconsin-Madison, nos EUA.
Como proteger fungos ameaçados?
Somente em 2021 a UICN passou a tratar os fungos como equivalentes à flora e à fauna em termos de conservação.
“Essa mudança foi um passo importante”, disse Boddy, acrescentando que agora é importante identificar quais fungos estão em risco e encontrar maneiras de reduzir as ameaças contra eles.
Os cientistas já identificaram formalmente cerca de 155 mil espécies de fungos, mas estima-se que haja pelo menos 2 milhões e talvez mais de 3 milhões ainda não descobertas.
“Não sabemos quase nada sobre a maioria deles e alguns podem ser extintos antes mesmo de serem descobertos”, disse Veerabahu.
O manejo de florestas e pastagens – ou seja, a execução de intervenções planejadas nesses ecossistemas –, deve ser feito levando em consideração os fungos, para que eles não sejam prejudicados.
Isso pode incluir, por exemplo, “manter árvores e detritos lenhosos suficientes” durante o desmatamento, para fornecer um ambiente propício para a proliferação de fungos e limitar “a fertilização em sistemas agrícolas e pastagens naturais, pois a fertilização reduz o número e os tipos de fungos benéficos nos solos”, disse Mueller.
“Não podemos nos dar ao luxo de não incluir fungos. A conservação sem fungos é incompleta.”