07/05/2025 - 21:04
Em seu 1º dia de governo, chanceler Merz diz que país vai rejeitar entrada de migrantes sem documentos nas fronteiras. Medida, que integra estratégia para minar ascensão da ultradireita, irrita parceiros europeus.O novo governo da Alemanha anunciou nesta quarta-feira (07/05) medidas para reforçar o controle nas fronteiras do país que incluem a rejeição da entrada de imigrantes sem documentos, incluindo requerentes de asilo, no território alemão.
A medida, que gerou irritação em alguns parceiros europeus, é parte dos planos do novo chanceler federal, o conservador Friedrich Merz, de limitar a imigração irregular e conter a ascensão da extrema direita, ao se apropriar de uma bandeira do partido ultradireitista e anti-imigração Alternativa para a Alemanha (AfD), que ficou em segundo lugar nas eleições gerais de fevereiro e continua em alta nas pesquisas.
Merz, que visitou nesta quarta-feira o presidente da França, Emmanuel Macron, e o primeiro-ministro da Polônia, Donald Tusk, disse que as medidas, que serão adotadas em caráter temporário, “serão necessárias enquanto tivermos níveis tão altos de migração irregular na União Europeia”.
O novo governo da Alemanha, que tomou nesta terça-feira, adotou medidas para reforçar sua polícia de fronteira e ordenou que os agentes rejeitem imigrantes sem documentos, afirmou o Ministro do Interior, Alexander Dobrindt.
Exceções seriam feitas para “grupos vulneráveis”, incluindo mulheres grávidas e crianças, acrescentou.
Tentativa de esvaziar discurso da ultradireita
Merz argumentou que medidas duras serão necessárias para aliviar as preocupações dos eleitores e deter a ascensão da ultradireita, que vem ganhando popularidade ao defender causas que alimentam sentimentos xenófobos e anti-imigração.
A AfD obteve uma votação recorde de mais de 20% nas últimas eleições federais, ficando atrás apenas da aliança conservadora União Democrata Cristã (CDU) e a União Social Cristã (CSU) liderada por Merz. Desde então, a sigla vem subindo nas pesquisas de opinião, chegando algumas vezes ao primeiro lugar.
O acordo de coalizão entre a CDU/CSU e o Partido Social-Democrata (SPD), de centro-esquerda, estabelece que todas as pessoas que chegarem às fronteiras alemãs sem documentos terão a entrada recusada, incluindo as que buscam asilo.
Este último ponto gerou controvérsia, com alguns no SPD expressando preocupações de que a medida pode não ser compatível com a legislação da União Europeia.
O acordo diz ainda que o aumento dos controles de fronteira permanecerá em vigor até que “haja proteção efetiva das fronteiras externas da UE”.
Reforço policial nas fronteiras
Para implementar a medida, Dobrindt reverteu uma diretiva de 2015, o ano que marcou o auge da crise migratória na Europa, quando a Alemanha acolheu mais de um milhão de refugiados, principalmente pessoas que fugiam de conflitos e da pobreza em países como Síria, Iraque e Afeganistão.
O jornal alemão Bild relatou que Dobrindt teria dado uma ordem para que um contingente adicional de 2.000 a 3.000 agentes federais fossem enviados às fronteiras da Alemanha, além dos 11.000 já alocados. O semanário Der Spiegel disse que a polícia teria que trabalhar em turnos de até 12 horas por dia para colocar em prática as novas diretrizes.
O objetivo era garantir “humanidade e ordem” na migração, disse Dobrindt, acrescentando que a ordem deverá “ter maior peso e força do que se viu no passado”.
A decisão do novo governo alemão irritou alguns países vizinhos, com a Suíça dizendo que “lamenta” que as medidas tenham sido tomadas “sem consulta”.
Merz enfatizou que os controles seriam realizados “de uma forma que não causaria problemas para nossos vizinhos”, e assegurou que a Alemanha quer resolver lidar com essa questão juntamente com outros países da UE.
AfD na mira das autoridades
Em meio a uma onda de ataques violentos atribuídos a estrangeiros que antecedeu as eleições de fevereiro, Merz fez da repressão à migração irregular um tema central de sua campanha.
Em certo momento, ele contou com o apoio da AfD no Bundestag (Parlamento) para aprovar uma moção que demandava maior repressão à imigração, uma manobra amplamente vista como uma violação do chamado “cordão sanitário” – o consenso entre os principais partidos políticos da Alemanha de rejeitar qualquer colaboração em qualquer nível com os partidos políticos ultradireitistas.
Na semana passada, a agência de inteligência interna da Alemanha classificou a AfD como uma “organização comprovadamente extremista de direita” que ameaça a democracia.
Segundo o Departamento Federal de Proteção da Constituição (BfV), o partido viola a dignidade humana e a democracia ao tentar excluir grupos populacionais, como imigrantes, da participação igualitária na sociedade. A medida permite à agência monitorar de forma mais incisiva o partido.
Afagos em Paris…
Merz sinalizou um “novo começo” nas relações com os parceiros europeus França e Polônia ao visitar os governantes dos dois países vizinhos em seu primeiro dia como chanceler alemão. Os encontros, porém, deixaram à mostra sinais de discussões difíceis pela frente sobre questões delicadas, como migração e financiamento da defesa.
Em Paris, ao ser calorosamente recebido por Macron, Merz disse que uma maior unidade europeia era essencial para tornar a UE mais segura e competitiva, e disse que irá reforçar a cooperação franco-alemã em defesa e segurança.
“Somente conseguiremos enfrentar esses desafios se a França e a Alemanha se mantiverem ainda mais unidas do que no passado”, afirmou. “É por isso que Emmanuel Macron e eu concordamos com um novo impulso franco-alemão para a Europa.”
Macron se dirigiu ao líder alemão como “querido Friedrich” e agradeceu por lhe conceder “a honra de iniciar seu mandato aqui em Paris”.
… críticas em Varsóvia
Horas depois, ao lado de Donald Tusk em Varsóvia, Merz elogiou o importante papel militar da Polônia no flanco oriental da Otan e o apoio do país à Ucrânia. Contudo, ficaram claras algumas diferenças em termos de políticas migratórias.
Falando ao lado de Merz em uma coletiva de imprensa, Tusk pediu que a Alemanha “se concentre nas fronteiras externas da UE” e preserve o espaço Schengen – a zona de livre trânsito que abrange 25 dos 27 países da UE, além da Noruega, Suíça, Islândia e Liechtenstein, num total de 420 milhões de pessoas.
O premiê, ciente das eleições presidenciais em seu país na próxima semana, nas quais o sentimento anti-imigração provavelmente desempenhará um papel importante, expressou críticas cautelosas ao plano de Merz de recusar a entrada de imigrantes na fronteira.
Ele rejeitou o plano de Merz de reforçar os controles na fronteira germano-polonesa. “Se alguém introduzir controles na fronteira polonesa, a Polônia também introduzirá tais controles. E isso simplesmente não faz sentido a longo prazo”, afirmou.
“A Alemanha deixará entrar em seu território quem ela quiser. A Polônia só deixará entrar em seu território aqueles que ela aceitar”, disse Tusk.
Embora Paris seja um ponto de escala tradicional para novos chanceleres alemães, a viagem a Varsóvia reflete a crescente influência da Polônia na política europeia devido à sua centralidade em angariar apoio para a Ucrânia contra a invasão da Rússia, que já dura três anos.
rc (AFP, Reuters, DPA)