Trump Organization lançou 12 novos empreendimentos no exterior desde janeiro, incluindo países com os quais os EUA firmaram recentemente acordos comerciais. Oposição acusa conflito de interesses.Desde que o presidente dos EUA, Donald Trump, voltou a chefiar a Casa Branca em janeiro deste ano, sua principal empresa, a Trump Organization, ampliou sua presença internacional e lançou 12 novos empreendimentos imobiliários no exterior.

Este número já supera a quantidade de parcerias internacionais lançadas por suas empresas durante toda a duração de seu primeiro mandato, entre 2017 e 2021. À época, ele foi acusado de violar leis anticorrupção ao aceitar pagamentos e benefícios de governos estrangeiros em negócios de suas empresas.

Uma investigação do Comitê de Supervisão da Câmara dos EUA divulgada em janeiro de 2024 mostrou que empresas do republicano receberam pelo menos 7,8 milhões de dólares (R$ 42,2 milhões) de 20 governos estrangeiros durante sua primeira gestão, incluindo China, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Catar, Kuwait e Malásia. O comitê é controlado por parlamentares oposicionistas do partido Democrata.

Agora, novos projetos estão sendo anunciados por seus familiares em países como Catar, Arábia Saudita, Sérvia e Vietnã, onde a Casa Branca também firmou acordos comerciais e de defesa.

A nova atuação diplomática do presidente, aliada ao avanço dos negócios de suas empresas, voltou a provocar críticas da oposição, que questiona possíveis conflitos de interesse em sua gestão.

Em abril deste ano, o Comitê de Supervisão do partido Democrata divulgou uma lista em que acusa Trump de 100 situações em que sua ação como presidente teria conflitado com seus negócios privados e de seus aliados.

Veja os empreendimentos anunciados pela Trump Organization:

Catar: De “financiadores do terrorismo” a parceiros comerciais

Em 2017, durante seu primeiro mandato, Donald Trump chamou publicamente o Catar de “financiador do terrorismo”. Oito anos depois, o primeiro acordo estrangeiro fechado pela Trump Organization após o retorno do republicano à Casa Branca acontece justamente no Catar.

O empreendimento da marca Trump International Golf Club & Villas será construído nos arredores de Doha e contará com um resort de luxo e um campo de golfe.

No papel, o complexo está sendo coordenado pelos incorporadores imobiliários Qatari Diar e pela empresa saudita Dar Global.

A Qatari Diar, porém, foi criada pelo fundo soberano do Catar e é presidida por um ministro do governo, o que a torna, na prática, um braço do Estado catariano.

Semanas antes da visita oficial do presidente americano ao país, em maio de 2025, seu filho Eric Trump viajou ao Catar para avançar nas negociações do resort.

A Trump Organization afirma que a parceria foi firmada por meio da Dar Global, uma empresa saudita, e não diretamente com a Qatari Diar. A própria Dar Global, porém, tem laços estreitos e bem documentados com outro governo, o chefiado pela família real saudita.

A viagem de Trump em maio ainda trouxe outra polêmica. O governo do Catar ofereceu aos Estados Unidos um Boeing 747 personalizado como presente diplomático. Chamado de “palácio voador”, a aeronave é avaliada em cerca de 400 milhões de dólares (R$ 2,1 bilhões). A Casa Branca aceitou o presente.

A atuação ambígua do Catar no cenário internacional também aumenta a preocupação sobre a disposição de Trump em realizar negócios privados com representantes que também mantém laços diplomáticos.

Novos acordos comerciais e de defesa na Arábia Saudita

Semanas antes da viagem de Trump aos países do Golfo em maio de 2025, a Trump Organization anunciou outra parceria com a Dar Global. O acordo prevê a construção do primeiro “Trump International Hotel and Tower” do Oriente Médio, em Dubai, marcando a quinta colaboração regional da empresa.

Durante o Fórum de Investimentos EUA-Arábia Saudita, em maio, Trump defendeu uma política externa centrada na soberania nacional e rejeitou a imposição de valores ocidentais sobre democracia e direitos humanos.

No mesmo evento, o presidente anunciou um dos maiores acordos de defesa da história dos EUA, um pacote de 142 bilhões de dólares (R$ 769 bilhões), com a Arábia Saudita.

Isso aproxima ainda mais Washington de um regime acusado de repetidas violações de direitos humanos, repressões brutais e abusos.

Além disso, a posição regional da Arábia Saudita é significativa. O país tenta se colocar como mediador na guerra da Ucrânia e negocia com Israel em troca de concessões sobre o conflito em Gaza.

Hotel de luxo em memorial de guerra na Sérvia

No início de 2024, cinco empresários americanos de origem sérvia participaram de uma recepção no resort Mar-a-Lago de Trump, na Flórida. Já algumas semanas após o início do segundo mandato de Trump, um projeto imobiliário de 500 milhões de dólares (R$ 2,7 bilhões) em Belgrado voltou a ser notícia.

Liderado pela Affinity Partners, empresa do genro de Trump, Jared Kushner, com sede em Miami, o plano é construir um hotel de luxo e um complexo residencial no local onde ficava o Ministério da Defesa da antiga Iugoslávia.

O prédio foi fortemente bombardeado durante a campanha aérea da Otan e dos EUA em 1999. Na ocasião, os aliados tentavam forçar a retirada de tropas sérvias do Kosovo e impedir a expulsão violenta de albaneses étnicos. Atualmente, o edifício é tratado como memorial de guerra por setores da sociedade sérvia.

O próprio Trump demonstrou interesse em desenvolver o prédio ainda em 2014, embora críticos locais vissem a substituição de um prédio histórico por uma torre de luxo como algo desrespeitoso.

Em maio de 2025, os obstáculos ao projeto foram superados. Segundo o acordo, o empreendimento contará com um hotel de 175 quartos, mais de 1,5 mil apartamentos de luxo e um novo memorial às vítimas dos bombardeios da Otan.

Resort é anunciado no Vietnã em meio a disputa tarifária

Enquanto Trump negociava tarifas de importação com o Vietnã, sua empresa familiar também avançava com acordos no país.

No fim de maio, a Trump Organization anunciou uma parceria com uma subsidiária da vietnamita Kinh Bac City Development Holding Corp., listada na bolsa, para desenvolver um campo de golfe, resort e condomínio residencial de 1,5 bilhão de dólares (R$ 8,3 bilhões) na província de Hung Yen, ao sul de Hanói.

Ao lançar o projeto, Eric Trump elogiou o Vietnã como “um dos mercados mais dinâmicos e promissores do mundo”. O momento do anúncio chamou atenção, já que os EUA e o Vietnã estavam negociando, ao mesmo tempo, os detalhes de um acordo comercial.

O acordo era vital para o Vietnã, que enfrentava ameaças de Trump de impor uma tarifa de importação de 46% sobre seus produtos, um dos países mais afetados pelo tarifaço. Os negociadores chegaram a um consenso de estabelecer a tarifa em 20%.