Novas sandálias da marca esportiva alemã inspiradas em modelo com raízes indígenas provocaram acusações de “apropriação cultural”. Adidas diz que vai se reunir com autoridades mexicanas para “consertar danos”.O designer Willy Chavarria lamentou no sábado (10/08) a controvérsia que eclodiu nesta semana após o lançamento de uma de suas criações, um modelo de sandálias em colaboração com a Adidas, que provocou acusações de “apropriação cultural” por parte de autoridades mexicanas.

O modelo de sandálias Oaxaca Slip-On, desenhado por Chavarria, foi inspirado um estilo tradicional de sandálias da região de Oxaca, conhecido como huarache, e que tem raízes indígenas.

Mas, segundo autoridades mexicanas, a empresa e o designer não procuraram obter autorização para o nome e tampouco reconheceram os autores originais. A controvérsia envolveu até mesmo a presidente do México, Claudia Sheinbaum, que acusou grandes corporações internacionais de se apropriarem de criações de comunidades indígenas. Autoridades também pediram a suspensão da venda do produto.

Após a controvérsia se estender por vários dias, Chavarria, um americano com raízes mexicanas, finalmente abordou a controvérsia no sábado.

“Lamento profundamente que este design tenha se apropriado do nome e não tenha sido desenvolvido em parceria direta e significativa com a comunidade de Oaxaca”, disse Chavarria em um comunicado.

Ele afirmou reconhecer que as sandálias “não corresponderam ao respeito e à abordagem colaborativa” merecidos pela comunidade de Villa Hidalgo Yalalag, vilarejo mexicano conhecido como local de origem das sandálias huaraches.

Já a empresa alemã de artigos esportivos afirmou em uma carta divulgada na sexta-feira que “valoriza profundamente a riqueza cultural dos povos indígenas do México e reconhece a relevância” das críticas. A empresa também disse que solicitou uma reunião com autoridades locais do México para discutir como pode “reparar os danos” causados às populações indígenas.

Críticas

Sites especializados no mercado de tênis e outros sapatos esportivos haviam reportado nesta semana sobre o lançamento das sandálias num evento da Adidas em Porto Rico. O modelo foi descrito como inspirado nas sandálias huarache e um tributo às raízes mexicanas de Chavarria.

No entanto, imagens do calçado rapidamente provocaram reação de políticos mexicanos da região de Oxaca, que pediram a suspensão da venda do produto e acusaram Chavarria e a Adidas de “apropriação cultural”.

“Isso não é apenas um design, é cultura, história e identidade de um povo originário e não vamos permitir que seja tratado como mercadoria”, disse o governador de Oaxaca, Salomón Jara, em um vídeo publicado na rede X.

Por sua vez, a Secretaria de Cultura e Artes de Oaxaca destacou em comunicado que a adoção sem consentimento de elementos culturais dos povos originários para fins comerciais constitui “violação de seus direitos coletivos”.

O órgão pediu ainda a “suspensão imediata da comercialização” do novo modelo, a abertura de um processo de diálogo e reparação de agravos da comunidade de Yalalag e o reconhecimento público da origem do design.

Ainda nesta semana, a presidente mexicana Claudia Sheinbaum entrou na controvérsia, afirmando: “Grandes empresas costumam tomar produtos, ideias e designs das comunidades indígenas; estamos analisando a parte jurídica para poder apoiá-los”.

Tema sensível no México

Nos últimos anos, o México denunciou a apropriação cultural e o uso não autorizado da arte de seus povos indígenas por grandes marcas e designers ao redor do mundo.

Em 2023, foi a vez da empresa chinesa Shein, acusada de apropriação cultural de elementos da cultura e da identidade do povo Nahua, do estado de Puebla. À época, o governo mexicano se queixou de danos econômicos e morais para este segmento da população.

“Trata-se de um princípio de consideração ética que, local e globalmente, nos obriga a chamar a atenção e colocar em discussão pública um tema que não pode ser adiado: proteger os direitos dos povos originários que historicamente foram invisibilizados”, afirmou a Secretaria de Cultura do Governo do México na ocasião.

Outros acusados de plágio e apropriação cultural de povos mexicanos nos últimos seis anos incluem a designer francesa Isabel Marant e as marcas de luxo Zimmermann e Carolina Herrera.

Discussão global

Acusações semelhantes também afetaram a imagem da Prada em julho. A grife italiana estreou na passarela da Semana de Moda Masculina de Milão rasteiras descritas como “sandálias de couro”.

Mas, para críticos de moda, artesãos e políticos indianos, tratava-se de uma cópia das tradicionais Kolhapuri – sandálias artesanais que levam o nome da cidade de Kolapur, em Maharashtra, no oeste da Índia, e remontam ao século 12.

Há mais de 25 anos, países em desenvolvimento e povos indígenas vêm pressionando por leis de propriedade intelectual que protejam melhor, da exploração por terceiros, a flora, a fauna, saberes tradicionais e herança cultural locais.

Mais recentemente, porém, tem crescido o clamor, inclusive no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), para que se responsabilizem as companhias que cometem esse tipo de abuso na indústria da moda.

Jps (ots, DW)