Medida contra a adultização aprovada por deputados amplia responsabilidades de redes sociais e jogos online no combate a crimes contra crianças e adolescentes, como disseminação de conteúdos de exploração sexual.A Câmara dos Deputados aprovou na noite de quarta-feira (20/08) projeto de lei com novas regras para proteção e prevenção de crimes contra crianças e adolescentes em ambientes digitais, tratado como o PL contra a “adultização” de menores.

O texto foi proposto em 2022, aprovado no Senado no ano passado e ganhou tração no Congresso nos últimos dias após a repercussão do vídeo do influenciador Felca sobre a exploração online de crianças e adolescentes e a monetização desses conteúdos. A denúncia levou ainda à prisão do influenciador Hytalo Santos e de seu marido por exploração e exposição de menores e tráfico humano.

De autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-ES), o PL recebeu o apelido de “ECA digital”, em referência ao Estatuto da Criança e do Adolescente, criado há 35 anos. Como o projeto sofreu mudanças ao tramitar na Câmara, ele deverá ser apreciado novamente pelo Senado.

Entre os principais pontos do texto, estão a obrigação de que meios digitais tomem medidas “razoáveis” para prevenir o risco de crianças e adolescentes acessarem conteúdos impróprios, como exploração e abuso sexual, violência física, intimidação, assédio, promoção e comercialização de jogos de azar e práticas publicitárias predatórias e enganosas.

O texto determina ainda que as plataformas digitais facilitem aos pais e demais responsáveis o acesso a informações sobre a atividade online de seus filhos.

Em caso de descumprimento das obrigações definidas no projeto, são previstas penalidades que variam de advertência, multas que podem chegar a R$ 50 milhões, suspensão temporária de atividades e até a proibição definitiva das atividades no país.

Inicialmente combatido por boa parte da oposição ao governo no Congresso, que passou a chamar o projeto de “PL da mordaça”, o texto acabou ganhando adesões desse campo após modificações feitas pelo relator da proposta, o deputado Jadyel Alencar. Entre elas, estão a criação de uma agência reguladora autônoma para tratar do tema e a restrição sobre quem pode pedir remoção de conteúdo criminoso.

Entenda os principais pontos do projeto:

Remoção de conteúdo

Um dos principais pontos do projeto – e o que gerou mais discórdia entre seus apoiadores e críticos – é a determinação para remoção rápida de conteúdos impróprios por parte das plataformas.

O projeto como foi aprovado pelo Senado previa o conceito de “dever do cuidado” – que, na prática, obrigaria as plataformas a agir de forma preventiva para proteger seus usuários de danos previsíveis, sem a necessidade de decisão judicial, o que foi taxado de “censura prévia” pela oposição.

Na versão aprovada na Câmara, o termo foi trocado por “prevenção, proteção, informação e segurança”, o que foi considerado uma vitória do lobby das big techs no Congresso.

A possibilidade de remoção imediata de conteúdos criminosos deve acontecer, portanto, a partir de um processo específico de notificação.

Empresas deverão retirar conteúdo que viola direitos de crianças e adolescentes por ordem judicial ou assim que forem comunicados pela vítima, por seus representantes, pelo Ministério Público ou por entidades representativas de defesa dos direitos de crianças e adolescentes.

Controle parental e de idade

A proposta obriga que “os produtos ou serviços de tecnologia da informação devem contar com mecanismos para ativamente impedir o uso por crianças e adolescentes sempre que não forem desenvolvidos para eles ou não estiverem adequados a atender às necessidades desse público”.

As plataformas serão obrigadas a:

Colocar à disposição ferramentas de controle parental que permitam, por exemplo, limitar a visibilidade de conteúdos;
Restringir o contato direto entre menores e adultos desconhecidos e o acesso de crianças e adolescentes a produtos e serviços inadequados;
Criar mecanismos mais confiáveis para verificação da idade dos usuários, o que atualmente é feito principalmente por autodeclaração;
Exigir a supervisão do uso da internet pelos responsáveis;
Oferecer sistemas de notificação de abuso sexual e outras violações aos direitos de crianças e adolescentes.

Publicidade e distribuição de conteúdo

O projeto impõe limites à publicidade direcionada e às técnicas de perfilamento, proibindo “práticas publicitárias predatórias, injustas ou enganosas, ou que possam causar outros danos a crianças e adolescentes”.

O texto obriga as empresas a “prevenir e mitigar o acesso e a exposição a conteúdos que retratem” situações como “exploração e abuso sexual de crianças e adolescentes, violência física, intimidação sistemática (bullying) virtual e assédio a crianças e adolescentes”.

O projeto também proíbe práticas que explorem sentimentos de inferioridade, incitem violência ou incentivem comportamentos nocivos, vícios ou outros transtornos de saúde mental.

O projeto também pede às empresas que adotem um design menos viciante em suas plataformas, com menos recursos como reprodução automática de vídeos ou recompensas pelo tempo logado.

O texto aprovado na Câmara não trata da monetização de conteúdos ligados ao público infantil, tema que poderá ser tratado separadamente, em outro projeto.

Agência reguladora

Uma das novidades do projeto aprovado na Câmara – e que viabilizou o apoio da oposição – é a previsão de uma autoridade nacional autônoma, entidade da administração pública que será responsável por zelar, editar regulamentos e procedimentos e fiscalizar cumprimento da nova legislação. A entidade funcionar nos moldes da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

Jogos Eletrônicos

O texto trata ainda de regras específicas para jogos online – na esteira de denúncias contra a plataforma de jogos Roblox, que está sendo processada nos Estados Unidos por não dispor de medidas de segurança eficazes para proteger os usuários de predadores sexuais.

O PL proíbe caixas de recompensa (loot boxes) em jogos eletrônicos direcionados ou que possam ser utilizados por crianças e adolescentes. Em relação aos jogos que permitem a interação entre usuários por meio de mensagens de texto, áudio ou vídeo, o projeto pede mais cuidado na classificação indicativa e que os pais tenham a opção de desativar essas ferramentas.

As empresas de jogos deverão criar sistema para recebimento e processamento de reclamações e denúncias de abusos e irregularidades cometidas por usuários.

sf/cn (Agência Brasil, ots)