Proposta permite que deputados e senadores barrem processos criminais envolvendo colegas, em votação secreta, e estende foro privilegiado para presidentes de partido. Texto seguirá para votação no Senado.A Câmara dos Deputados aprovou na terça-feira (16/09) uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que dificulta a investigação de congressistas e presidentes de partidos. O projeto foi apelidado de PEC da Blindagem.

O texto foi aprovado em dois turnos e, após algumas alterações pendentes, seguirá para votação no Senado, também em dois turnos – tramitação necessária para aprovação de uma PEC.

Uma das maiores mudanças apresentadas na proposta é a exigência de autorização da Câmara ou do Senado, em votação secreta, para que o Supremo Tribunal Federal (STF) conduza processos criminais contra congressistas.

Essa regra estava prevista na Constituição de 1988, mas foi derrubada pelo próprio Congresso em 2001 devido à pressão popular, por favorecer a impunidade de deputados e senadores. Segundo um levantamento do G1, entre 1988 e 2001, dos 253 pedidos enviados pelo STF para processar parlamentares, apenas um foi aprovado. Acusados de crimes graves, como tentativa de assassinato e homicídio, também foram beneficiados com esse antigo entendimento.

O texto teve forte apoio do chamado centrão – grupo de partidos de direita e de centro que hoje compõe a maioria no Congresso –, mas também contou com votos de uma minoria do PT, uma vez que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva liberou a bancada do partido para a votação.

A maior parte das investigações no STF contra congressistas, e que seriam o alvo principal da PEC, envolve a suspeita de disseminação de fake news, envolvimento nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro e desvio ou uso irregular de verbas das emendas parlamentares – só em 2024, foram mais de R$ 44 bilhões em emendas.

Como surgiu a proposta?

A PEC foi apresentada originalmente em 2021, após a prisão em flagrante do ex-deputado bolsonarista Daniel Silveira por ordem do STF, após divulgar um vídeo com ofensas e ameaças contra ministros da corte e apologia ao AI-5, o ato institucional assinado em 1968 que endureceu a repressão do regime militar, fechando o Congresso, cassando mandatos e perseguindo deputados e senadores de oposição.

A proposta voltou à pauta na Câmara no início de agosto deste ano, na esteira da decisão do ministro Alexandre de Moraes de decretar a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro. Após tentativa frustrada de votar o texto no fim de agosto, diante de toda a repercussão negativa, a PEC ganhou uma versão mais branda. Foi excluída, por exemplo, a proposta que autorizava a suspensão de ações judiciais em andamento e a exigência de aval do Congresso para abertura de investigações criminais contra parlamentares.

Segundo o texto aprovado, o STF pode autorizar inquéritos contra parlamentares sem o aval do Congresso. No entanto, a abertura de processos criminais contra congressistas dependerá de autorização do Congresso.

Defensores da medida dizem que a proposta é uma reação ao que chamam de abuso de poder do STF e que as medidas restabelecem prerrogativas originais previstas na Constituição de 1988, elaborada logo após o fim da ditadura militar (1964-1985).

No entanto, a chamada PEC da blindagem é criticada por ampliar as possibilidades de imunidade parlamentar.

O que muda?

Atualmente, o STF tem liberdade para iniciar processos criminais contra parlamentares sem necessidade de aval do Congresso, desde que as ações sejam relacionadas ao exercício do mandato e às funções políticas do cargo. Em questões cíveis, como de improbidade administrativa, não há foro privilegiado.

Para crimes sem ligação com a atividade parlamentar, o julgamento ocorre em outras instâncias da Justiça.

Deputados e senadores só podem ser presos em flagrante quando em casos de crime grave e inafiançável, como racismo, estupro ou atentado contra o Estado Democrático de Direito.

Desde 2001, o Congresso pode deliberar em plenário, por votação aberta, apenas sobre a suspensão de processos já em andamento, caso considere que tenham motivação política.

A PEC estabelece que a abertura de processos criminais contra congressistas dependerá de autorização do Congresso, em votação fechada – ou seja, os parlamentares não precisam revelar publicamente como votaram. Assim, caberá à Câmara e ao Senado decidir, por maioria absoluta, se a ação contra um deputado ou senador poderá ter início.

Além disso, a proposta prevê estender o foro privilegiado aos presidentes nacionais de partidos com atuação no Congresso.

O texto da PEC abre ainda margem para a interpretação de que ações na esfera cível, como de improbidade, também teriam de passar pelo STF.

sf/cn (Agência Brasil, ots)