18/09/2025 - 7:15
Entrevistei 55 alunos da rede pública para saber o que acham sobre a proibição do celular. Embora para maioria aparelho possa ser distração, questões como rigidez da lei e falta de conscientização digital incomodam.Entrevistei 55 estudantes do ensino médio público, de 19 estados, sobre a política deproibição do uso do celular. Entre eles, 78,2% reconhecem que o celular é um instrumento de distração. No entanto, 61,8% não concordam com a lei, pelo menos não da forma como foi criada e implementada.
“Eu concordo com a necessidade de uma lei que regule o uso de celulares no período das aulas, mas acho que não há necessidade na extrema rigidez que a lei propõe”, diz Lívia Santos, aluna do Espírito Santo.
Já escrevi textos sobre o tema. No entanto, tive a mesma falha dos criadores da política: a verticalização de um tema tão importante, ou seja, não consultei as vozes dos dois maiores afetados pela medida, alunos e professores.
Neste texto, abordo a perspectiva do aluno. O próximo texto tratará da perspectiva do professor.
Lacuna entre a realidade e o planejado
Para Kettylle, estudante de São Paulo, assim como para a maioria de seus colegas, a lei não é respeitada. “No começo das aulas até que respeitavam, mas agora já está liberado e todos usam normalmente.”
Os poucos casos em que citaram o cumprimento, havia relação com sanções bem rígidas, como suspensão, e/ou com uma forte fiscalização. “Como estudamos em período integral, não podemos portar o celular em nenhum momento; caso alguém leve, o aparelho é imediatamente confiscado”, conta Yasmin, aluna de Pernambuco.
Avaliação dos estudantes
A avaliação dos estudantes sobre a medida foi predominantemente negativa. Em relação aos pontos positivos, alguns acreditam que ajudou a aumentar a socialização entre os alunos.
Já em relação aos pontos negativos, começando pelas questões de menor incidência, foram citados: aumento da ansiedade, de conflitos e distrações nas aulas, dado que quem ficava no celular, não necessariamente irá prestar atenção e poderá deslocar a energia para conversas paralelas ou, segundo Isabela, estudante de Goiana, “Os alunos agora dormem quando estão sem celular”.
Além disso, segundo Victoria, estudante de Santa Catarina, a consequência é que “os estudantes não aprendem a usar o celular como aliado”. Sua fala é bem impactante, pois indica um efeito contraproducente com o próprio objetivo e essência da educação.
O maior ponto negativo é a externalidade negativa. De um lado, quem ficava no celular e não prestava atenção nas aulas, seguirá da mesma forma. No entanto, aqueles que o utilizavam como instrumento pedagógico e em momentos relevantes, como falar com familiares ou resolver questões de mobilidade, foram prejudicados.
O que eles fariam?
Perguntei o que fariam, e como, se a elaboração da lei estivesse sob suas responsabilidades. Yasmin, resume bem a opinião da maioria de seus colegas: “Eu não optaria nem pela proibição total nem pela liberação irrestrita. Criaria regras de uso consciente: os aparelhos poderiam ser utilizados em momentos livres, como intervalos e horário de almoço, e também em atividades pedagógicas que exijam pesquisa ou recursos digitais. Já durante as aulas tradicionais, o celular permaneceria guardado para evitar distrações”.
Fiquei bastante impressionado com o quanto eles têm a dizer. A lei que proíbe o uso dos celulares nas salas de aula é mais um exemplo de uma política vertical criada por quem não conhece a realidade das escolas e desenvolvida subestimando a perspectiva dos estudantes e professores. Escutar alunos e professores não deveria ser apenas uma prioridade, mas sim a regra ao criar políticas públicas educacionais.
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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1.
Este texto foi escrito por Vinícius De Andrade e reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.