Votação acelera tramitação da proposta, que vai agora direito para o plenário. Deputados devem definir ainda texto que será votado, com anistia total ou apenas redução de penas para envolvidos nos atos golpistas.A Câmara dos Deputados aprovou em plenário na noite desta quarta-feira (17/09), um requerimento de urgência em favor de um projeto que concede anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

O requerimento de urgência – aprovado por 311 votos a favor, 163 contrários e 7 abstenções – acelera a tramitação do projeto de lei e prevê a eliminação ou redução de prazos e formalidades regimentais, permitindo que o texto seja votado diretamente em plenário em qualquer momento sem precisar passar pelas comissões. Ainda não há uma data prevista para a votação.

A partir de agora, a Câmara decidirá entre uma anistia ampla e irrestrita que incluiria o ex-presidente Jair Bolsonaro ou uma redução das penas aos condenados pelos atos golpistas.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), decidiu colocar o projeto em pauta após uma reunião com líderes da oposição. Após a votação, ele afirmou que o avanço da pauta na Câmara era uma tentativa de apaziguar as tensões em Brasília. “O Brasil precisa de pacificação. Não se trata de apagar o passado, mas de permitir que o presente seja reconciliado e o futuro construído em bases de diálogo e respeito. Há temas urgentes a frente e o país precisa andar.”

Motta designará nesta quinta-feira um relator para o projeto, visando a elaboração de um texto substitutivo buscando o “apoio da maioria ampla da Casa”.

Anistia ampla ou redução das penas

O projeto de lei, de autoria do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), concede anistia a “todos os que participaram de manifestações com motivação política e/ou eleitoral, ou as apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas, entre o dia 30 de outubro de 2022 e o dia de entrada em vigor desta lei”.

Aliados de Bolsonaro defendem que ele também deve ser beneficiado pela medida, apesar de ter sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de 27 anos e três meses de prisão, em julgamento concluído na semana passada.

Ainda não está claro se o projeto de lei anistiará ou não Bolsonaro. Uma eventual redução das penas aos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 também incluiria o ex-presidente e os demais condenados pela trama golpista no STF.

O texto que serviu como base para a aprovação da urgência prevê o perdão aos que cometeram crimes políticos, eleitorais e conexos, além dos previstos no Código Penal, e atinge medidas que restringem direitos, como bloqueios em redes sociais. O projeto de lei visa também estender a anistia às multas aplicadas pela Justiça Eleitoral ou pela Justiça Comum contra pessoas físicas ou jurídicas associadas aos atos golpistas.

Porém, ainda não está definido o texto sobre a anistia que será votado. A proposta original deve sofrer alterações antes de ir para o plenário.

Troca na relatoria

Motta indicará um novo relator para o PL, em substituição ao deputado Rodrigo Valadares (União-SE), o que deve acarretar mudanças significativas no texto proposto.

O nome mais cotado é o de Paulinho da Força (SD-SP), por sua proximidade com alguns juízes do STF, incluindo o Alexandre de Moraes, e por ter interlocução com o grupo parlamentar do chamado Centrão.

Ao anunciar a troca na relatoria, Motta disse que o responsável por negociar o texto vai propor uma solução que pacifique o país, com “respeito às instituições, o compromisso com a legalidade e levando em conta também as condições humanitárias das pessoas que estão envolvidas nesse assunto”.

“Rendição ao golpismo”

Enquanto parlamentares bolsonaristas celebravam o que chamaram de “dia histórico” na Câmara, os governistas criticaram a votação como uma “rendição ao golpismo”.

“É um dia triste para a democracia brasileira. Em um momento em que as instituições deveriam ser fortes, vimos o contrário ali dentro, uma rendição a esses golpistas”, afirmou o líder do Partido dos Trabalhadores (PT) na Câmara, Lindbergh Farias.

Lindbergh disse que quem votasse a favor do requerimento estaria comprometendo a sua biografia. Se dirigindo diretamente a Motta, ele afirmou que que “a turma que te desrespeitou, que não foi punida, está aí comemorando”, se referindo ao grupo de parlamentares que ocupou a mesa da Câmara durante dois dias após a decretação da prisão domiciliar de Bolsonaro, impedindo os trabalhos da Casa.

“Os senhores ao votarem na anistia estão sendo cúmplices de um golpe de Estado continuado”, criticou o petista. “Não estão pacificando nada. Vocês estão abrindo caminho para a extrema direita atacar as instituições.”

“Anistia não é para pessoas e sim para atos”

O líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante, criticou o que chamou de julgamento “injusto, político e que persegue opositores” por parte dos governistas e defendeu a extensão da anistia a Jair Bolsonaro.

“Anistia não é para pessoas e sim para os atos. Vamos discutir pelos acontecimentos e nunca por pessoas, acho desnecessária essa discussão, se está com Bolsonaro ou não, até porque não vai ter nome de nenhuma pessoa na anistia, vamos anistiar os atos”, afirmou.

“Vamos lutar porque o presidente Bolsonaro não é melhor nem pior que todos os injustiçados de uma trama que nunca existiu e com penas absurdas”, disse Sóstenes. “O placar elástico acima do quórum de PEC mostra a sensação da Casa de que houve exageros enormes, injustiças e constitucionalmente cabe ao Congresso votar ou aprovar anistia.”

Após a aprovação da urgência, já é esperada uma reação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo apurou o jornal Folha de S. Paulo, parlamentares teriam sido alertados de que o Executivo poderia rever indicações de cargos na estrutura federal a quem apoiasse o projeto de lei. Lula, inclusive, já sinalizou que vetaria uma eventual anistia a Bolsonaro.

Uma pesquisa do Datafolha realizada nos dia 8 e 9 de setembro afirma que 54% dos brasileiros é contra a anistia para Jair Bolsonaro, com 39% a favor.

rc/cn (EBC, ots)