Temperaturas extremamente altas comprometem a saúde, desestabilizam a sociedade e paralisam infraestruturas. O mundo conseguirá se adaptar a essa tendência?Pessoas em todo o mundo estão enfrentando temperaturas escaldantes causadas pelas mudanças climáticas.

No Brasil, o inverno nem terminou, e a sexta onda de calor do ano deve atingir nos próximos dias o Centro-Oeste, Nordeste e Norte, além de áreas do Sudeste e do Sul, como o interior de São Paulo e de Minas Gerais e o norte do Paraná.

No verão europeu deste ano, as mudanças climáticas fizeram triplicar o número de mortes decorrentes do calor, segundo uma análise publicada nesta semana por pesquisadores do Imperial College e da Escola de Higiene e Medicina Tropical, ambas situadas em Londres. Das 24,4 mil mortes causadas por calor neste ano no continente, 68% provavelmente (16,5 mil) não teriam ocorrido se ondas de calor extremo não estivessem cada vez mais frequentes, apontam os especialistas.

Impacto nas pessoas e nas sociedades

As ondas de calor são o tipo de clima extremo mais mortal em todo o mundo, com centenas de milhares de pessoas morrendo todo ano por causas relacionadas ao calor. Entre os mais vulneráveis estão pessoas com mais de 65 anos, mulheres grávidas, crianças e pessoas com doenças crônicas ou pré-existentes.

As primeiras ondas de calor no início da estação são particularmente mortais, pois as pessoas geralmente estão menos preparadas e seus corpos ainda não se acostumaram às temperaturas mais altas.

Existem três riscos físicos principais associados às ondas de calor: desidratação, superaquecimento, e exaustão por calor e insolação.

O calor intenso não afeta apenas o corpo, mas também perturba a sociedade como a conhecemos. A Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância e Adolescência) afirma que uma em cada cinco crianças —cerca de 500 milhões no total — vive em áreas que têm pelo menos o dobro de dias extremamente quentes por ano em comparação com seis décadas atrás. Muitos não têm infraestrutura, como ar-condicionado, para ajudar a lidar com o calor.

Em maio, o Paquistão passou por uma onda de calor em todo o país, com temperaturas chegando a 45 °C na província mais populosa do país, Punjab. Várias outras reduziram o horário escolar ou anteciparam as férias de verão. Ondas de calor também interromperam as aulas no Sudão do Sul e nas Filipinas este ano.

Da mesma forma, o calor extremo afeta o horário de trabalho das pessoas. Alguns países nas regiões mais quentes do mundo tradicionalmente fazem uma pausa depois do almoço para a sesta. Agora, outros em locais normalmente mais frios também estão discutindo como gerenciar o horário de trabalho quando as temperaturas sobem demais.

Infraestruturas como estradas, ferrovias e pontes são afetadas pelo calor excessivo. Superfícies de estradas de asfalto padrão, que não são feitas para climas quentes, tendem a formar sulcos e podem literalmente derreter, enquanto trilhos ferroviários podem entortar e pontes podem se expandir e deformar.

Mudanças climáticas no centro do problema

Dando continuidade a uma tendência, 2024 foi o ano mais quente já registrado. Com base em dados internacionais, a Organização Mundial Meteorológica (OMM) informou recentemente que todos os anos da última década estão entre os dez mais quentes já registrados.

“Não tivemos apenas um ou dois anos com temperaturas recordes, mas uma série completa de dez anos. Isso foi acompanhado por condições climáticas devastadoras e extremas, aumento do nível do mar e derretimento do gelo, tudo impulsionado por níveis recordes de gases de efeito estufa devido às atividades humanas”, afirmou a secretária-geral da OMM, Celeste Saulo.

As mudanças climáticas causadas pelo homem aumentaram a frequência e a intensidade das ondas de calor desde a década de 1950. Cada fração de grau de aquecimento é importante e fará com que elas se tornem ainda mais fortes e ocorram com mais frequência.

O carvão, o petróleo e o gás são, de longe, os principais responsáveis pelas mudanças climáticas. Quando esses combustíveis fósseis são queimados para alimentar motores de combustão, gerar eletricidade, fabricar plásticos e aquecer casas, eles liberam gases de efeito estufa. Esses gases agem como um cobertor, abafando a atmosfera da Terra, retendo o calor do sol e contribuindo para o aumento das ondas de calor.

O calor extremo também pode levar a um risco maior de outros tipos de desastres, como secas e incêndios florestais, que tiveram recorde de destruição em 2024.

O que fazer?

Especialistas em saúde aconselham as pessoas a ficarem longe do calor sempre que possível, evitar atividades extenuantes e beber bastante líquido, exceto álcool e cafeína.

As casas podem ser protegidas até certo ponto com persianas ou cortinas fechadas. O ideal é fechar as janelas durante as horas mais quentes, e abri-las para ventilar a casa nas horas mais frescas.

Usar roupas de cores claras que refletem o calor e a luz solar pode ajudar, assim como ventiladores elétricos, se a temperatura ambiente estiver abaixo de 35 °C.

Estratégias de longo prazo para tornar o calor mais suportável incluem tornar as cidades mais resilientes às mudanças climáticas, com espaços verdes e plantio de árvores ao longo das ruas. Isso não só fornece sombra, mas também reduz o calor retido no concreto.

De modo geral, especialistas afirmam que impulsionar a transição para a energia verde através da utilização de fontes renováveis é fundamental no desafio global de reduzir as temperaturas.

Em 2024, 40% da eletricidade mundial foi gerada a partir de energias renováveis. A energia solar foi o principal impulsionador dessa tendência, de acordo com um relatório do think tank global de energia Ember.