07/10/2025 - 4:44
Relações entre os dois povos vizinhos estão em seu pior momento histórico, e poucos acreditam numa saída pacífica para o conflito na Faixa de Gaza. Especialistas avaliam possíveis soluções.Pesquisa após pesquisa, o quadro é cada vez mais claro: a maioria tanto dos israelenses quanto dos palestinos perdeu a confiança uns nos outros. Com isso, perde-se também a esperança de que o conflito possa um dia ser resolvido pacificamente.
A alienação ficou particularmente evidente em uma pesquisa publicada em agosto pela Universidade Hebraica de Jerusalém. Segundo o levantamento, 62% dos israelenses concordaram com a afirmação de que “não há inocentes em Gaza”. Considerando apenas os entrevistados judeus israelenses, esse número sobe para 76%.
“Chocado com a pouca humanidade”
“Minha maior preocupação em relação a Israel é a falta de empatia”, afirma à DW Corey Gil-Shuster, diretor do programa de mestrado em resolução de conflitos e mediação na Universidade de Tel Aviv. “As pessoas sequer têm empatia por crianças, idosos ou doentes, como pacientes com câncer.”
Desde 2012, Gil-Shuster lida regularmente com temas controversos em sua série de vídeos na internet The Ask Project (“Projeto pergunta”, em tradução livre), no qual ele recolhe perguntas de seus espectadores e as dirige diretamente a ambas as populações em pesquisas de rua. Em um desses vídeos, por exemplo, ele perguntou aos palestinos se eles apoiariam novas ações como o ataque terrorista a Israel em 7 de outubro de 2023. Em outro clipe, ele pergunta aos israelenses se eles estão felizes com o sofrimento da população de Gaza.
Quando questionado sobre a empatia pelos idosos, doentes e crianças durante uma filmagem recente no norte de Israel, uma mulher simplesmente deu de ombros, relatou o pesquisador com tristeza. “Eu nem penso no que o mundo pensa de nós; esse é um assunto diferente. Estou preocupado com o que isso nos torna. Estou chocado com a pouca humanidade que há nesta questão”, lamenta Gil-Shuster.
“Desumanização quase completa”
Khalil Shikaki, cientista político que dirige o Centro Palestino de Pesquisa de Opinião Política e Pública (PCPSR), em Ramallah, na Cisjordânia, também identifica um ponto absolutamente baixo na relação entre os dois lados. “Nos últimos dois anos, houve uma desumanização quase completa; ambas as sociedades chegaram a um ponto em que não estão dispostas a reconhecer a humanidade do outro lado.”
Esse cenário também tem impacto significativo no quanto as pessoas estão dispostas a ceder visando uma solução de paz, diz Shikaki à DW.
Ele realiza regularmente pesquisas de opinião nos territórios palestinos e participa com frequência de levantamentos conjuntos com israelenses. Sua pesquisa mais recente, de maio de 2025, revelou, entre outras coisas, um grande ceticismo entre os palestinos. Na Faixa de Gaza, 69% e, na Cisjordânia, até 88% dos entrevistados diziam não acreditar que Israel sairia de Gaza se o Hamas entregasse suas armas.
Shikaki, porém, ressalta que a confiança mútua não precisa ser um pré-requisito para uma reaproximação, mas pode florescer ao longo de um processo de paz: “Se esperarmos que palestinos e israelenses confiem uns nos outros, isso nunca acontecerá.”
Primeiros passos para uma reaproximação?
Mas como a reaproximação poderia ocorrer após décadas de conflito? Este é o tema abordado pelo norte-irlandês Gary Mason, que, por meio de sua organização Rethinking Conflict (“Repensando o conflito”), compartilha com pessoas do Oriente Médio suas experiências nos confrontos da Irlanda do Norte. Em ambos os casos, há questões controversas envolvendo terra, identidade e religião, diz Mason à DW.
Além dos extremos, tanto israelenses quanto palestinos querem uma solução para o conflito. “Se houver um cessar-fogo no Oriente Médio nos próximos quatro a seis meses, eu diria que ainda pode levar de cinco a dez anos até que a paz seja alcançada. Na Irlanda do Norte, ainda temos trabalho a fazer em nosso processo de paz, 27 anos após o Acordo da Sexta-Feira Santa”, disse Mason.
Segundo Gil-Shuster, muitas pessoas já se conformaram com o conflito e se sentem acomodadas com a situação. Ele, no entanto, acredita que talvez a comunicação política correta possa mudar isso. “O primeiro passo é uma campanha de marketing: estamos todos cansados disso, não queremos continuar assim, então estamos agindo agora”, propõe. “É preciso dar às pessoas uma visão do que isso pode significar. E então é preciso continuar falando sobre isso, fazendo marketing, como se Israel e Palestina fossem um produto.”
O plano de Trump pode pacificar o conflito?
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deu um novo impulso nessa direção no final de setembro. Ao lado do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, ele apresentou um plano de 20 pontos para o fim do conflito que, como medidas imediatas, inclui o fim das hostilidades e a libertação de todos os reféns israelenses em Gaza. Pela proposta, um comitê internacional liderado pelo próprio Trump e integrado pelo ex-premiê britânico Tony Blair deverá supervisionar as próximas etapas.
Em Israel, assim como nos territórios palestinos, a confiança nas lideranças políticas é baixa. Apenas uma minoria dos israelenses está satisfeita com o governo de Netanyahu. Por outro lado, o chefe da Autoridade Palestina (AP), Mahmoud Abbas, goza de pouca legitimidade, já que não há eleições desde 2006. Na pesquisa mais recente do PCPSR, 81% dos entrevistados pediram a renúncia dele.
No quadro atual, porém, uma liderança forte é a única saída possível para conflitos aparentemente insolúveis, argumenta Gil-Shuster. “É preciso um líder forte que defenda o pensamento diferente, pelo menos do seu próprio lado – talvez até do lado oposto. Mas não vejo ninguém no horizonte que pareça fazer isso.”
Quão realista é a solução de dois Estados?
Para que um processo de paz confiável possa ser iniciado, atores externos confiáveis teriam que apoiá-lo, afirma o cientista político Shikaki. Ou seja: os Estados Unidos, como o aliado mais próximo de Israel, e os Estados árabes, como defensores dos palestinos.
“Com base nas pesquisas conjuntas entre israelenses e palestinos, fica muito claro que os israelenses estariam dispostos a mudar de opinião e, neste caso, apoiar uma solução de dois Estados.”
Entre os palestinos, a solução de dois Estados vem ganhando novo impulso, ainda que, nas pesquisas, dois terços deles duvidem de sua viabilidade.
Em setembro, França, Reino Unido, Austrália e outros países deram o passo amplamente simbólico de reconhecer a Palestina. O plano de Trump prevê pelo menos um “caminho crível para a autodeterminação e a criação de um Estado palestino” após reformas na administração palestina, embora não detalhe exatamente como isso será possível.
O governo israelense rejeita veementemente a criação de um Estado palestino dotado de plenos direitos e recentemente intensificou a construção de assentamentos na Cisjordânia ocupada. O índice de paz da Universidade de Tel Aviv, elaborado com base em pesquisas, também documenta o declínio do apoio a uma solução de dois Estados por parte de Israel – que, entre abril e maio de 2025, era apoiada por apenas 21% dos judeus israelenses.
Aproximação apesar da separação?
De qualquer forma, a Cisjordânia ocupada está atualmente tão fragmentada por assentamentos israelenses que os críticos consideram irrealista a criação de um Estado palestino, mesmo devido à falta de um território contíguo.
Mas o exemplo da Irlanda do Norte mostra que mesmo uma coexistência confusa não precisa ser um impedimento para a reaproximação. Na capital, Belfast, certas áreas dominadas por unionistas e republicanos ainda são separadas por muros cujos portões são trancados todas as noites. “Eles são como um cobertor”, diz Gary Mason. “Quando chegar a hora certa, serão destruídos. Mas, 27 anos não é muito tempo depois de um conflito, especialmente porque as memórias são muito fortes.”
Mason estuda conflitos desde o início da década de 1990. Naquela época, israelenses e palestinos negociavam como parte do processo de paz de Oslo, e “a Irlanda do Norte era vista como o grande e intratável conflito”.
Hoje em dia, são os israelenses e palestinos que estão mais do que incertos se conseguirão se reconciliar em um futuro próximo.