Ex-primeiros-ministros e aliados se voltam contra o presidente e pedem sua renúncia após queda do premiê Lecornu que, mantido interinamente no cargo, ainda tenta costurar um acordo entre os partidos.O presidente da França, Emmanuel Macron, vem sendo cada vez mais pressionado para convocar novas eleições no país após a renúncia do primeiro-ministro Sébastien Lecornu, que ficou menos de um mês no cargo. Ele foi o quinto premiê nomeado por Macron em seu segundo mandato.

A renúncia de Lecornu agravou uma crise política cada vez mais profunda, que vem gerado abalos à liderança de Macron, com ex-primeiros-ministros e aliados políticos se voltando abertamente contra ele e pedindo sua renúncia.

A decisão de Macron de 2024 de dissolver a Assembleia Nacional e convocar eleições antecipadas resultou num Parlamento ainda mais fragmentado e eliminou a possibilidade de formar uma maioria ou uma coalizão que possa dar sustentação ao governo.

O ex-primeiro-ministro Édouard Philippe, que serviu sob Macron de 2017 a 2020 e planeja concorrer às eleições presidenciais de 2027, instou o presidente nesta terça-feira (07/10) a renunciar, afirmando que essa é a única maneira de superar meses de impasse político, e pediu a convocação de eleições antecipadas.

Gabriel Attal, um aliado de Macron que serviu como primeiro-ministro de janeiro a setembro de 2024, disse não “compreender mais” as decisões de Macron. Ele afirmou que a dissolução da Assembleia Nacional em 2024 desencadeou uma série de movimentos que sugerem que Macron “quer se agarrar ao poder a todo custo”. Attal também é visto como um potencial candidato para 2027.

Macron descarta renúncia

Até o momento, Macron descartou a renúncia, apesar das pressões de todos os setores, principalmente dos partidos de esquerda e do ultradireitista Reunião Nacional, liderado por Marine Le Pen.

O presidente insiste que foi eleito diretamente pelo povo francês e que cumprirá seu mandato até meados de 2027.

Após a surpreendente renúncia de Lecornu na segunda-feira, Macron pediu que ele permanecesse no cargo temporariamente e se reunisse com líderes políticos até a noite desta quarta-feira para, de alguma forma, traçar um caminho a seguir e estabilizar o país.

Macron, porém, disse que “assumiria a responsabilidade” se os últimos esforços do interino Lecornu para resolver a crise falharem – frase amplamente interpretada como um sinal de que ele poderia dissolver novamente a Assembleia Nacional e convocar novas eleições.

Sem uma coalizão majoritária no Parlamento, um novo primeiro-ministro poderia rapidamente enfrentar o mesmo impasse que Lecornu e seus dois antecessores imediatos, Michel Barnier e François Bayrou, que também permaneceram no cargo por apenas alguns meses.

Lecornu negocia com partidos

Lecornu se reuniu na terça-feira com líderes da aliança centrista de Macron e os líderes de ambas as casas parlamentares e deve se encontrar com outras lideranças partidárias até a manhã desta quarta-feira. O Reunião Nacional de Le Pen se recusou a tomar parte nas conversas.

No centro das negociações de crise estão questões em torno do orçamento para o próximo ano e o futuro status da Nova Caledônia, território francês no Pacífico.

A França, altamente endividada, precisa aprovar urgentemente um orçamento para a redução do déficit, enquanto a Nova Caledônia enfrenta instabilidades e, segundo se espera, deverá receber mais autonomia.

A alta dívida pública do país ressaltou a necessidade de um acordo entre os partidos sobre cortes de gastos, mas divisões profundas ainda persistem.

Esquerda dividida, ultradireita ansiosa

Ainda não estava claro nesta terça-feira se Lecornu conseguirá em 48 horas unir os partidos fragmentados para formar um novo governo.

Os partidos Socialista, Comunista e o Partido Verde – que tiveram um forte desempenho nas eleições antecipadas do ano passado – instaram Macron a nomear um primeiro-ministro de esquerda. “Estamos prontos para governar juntos e buscar uma política de progresso social e ecológico e justiça tributária, e para restaurar o Parlamento ao seu devido lugar”, disseram as legendas em comunicado conjunto.

No entanto, o partido de extrema esquerda França Insubmissa não aderiu ao apelo, refletindo uma profunda cisão dentro do bloco esquerdista, cuja aliança eleitoral saiu vitoriosa no ano passado.

As próximas eleições presidenciais francesas, marcadas para 2027, são vistas como uma encruzilhada histórica na política do país, com a extrema direita possivelmente tendo sua melhor chance de assumir o poder. Macron está constitucionalmente impedido de concorrer a um terceiro mandato.