Especialistas veem risco de ataque iminente, mas não de intervenção terrestre nem de uso de bombardeiros. Desestabilização das Forças Armadas ou retirada de Maduro estão na mesa, afirmam.A crescente lista de ações militares dos Estados Unidos contra a Venezuela no Caribe multiplica as especulações sobre um ataque iminente ao país sul-americano. Enquanto uma intervenção terrestre não parece factível, especialistas enxergam outras possibilidades, desde o bombardeamento de alvos do narcotráfico até uma operação para retirar do território nacional o presidente Nicolás Maduro.

O chefe da Casa Branca, Donald Trump, diz estar certo de que as autoridades em Caracas sentem a pressão imposta pela ofensiva, deflagrada pelos americanos sob a égide de uma guerra ao narcotráfico. O seu mais recente desdobramento é a chegada no domingo (26/10) de um navio de guerra dos EUA a Trinidad e Tobago, pequeno arquipélago próximo à Venezuela.

Já haviam sido deslocados ao Caribe o navio lançador de mísseis USS Gravely e o grupo de ataque USS Gerald Ford, que inclui o maior porta-aviões nuclear do mundo.

Autoridades de Trinidad e Tobago afirmaram que realizariam exercícios militares conjuntos com as forças americanas, e o sobrevoo de aviões bombardeiros perto da costa venezuelana chegou a ser reportado pela imprensa – mas, depois, negado pelo presidente americano.

Trump ainda disse na semana passada ter autorizado operações secretas da Agência Central de Inteligência (CIA, na sigla em inglês) na Venezuela, e o Pentágono anunciou na sexta-feira (24/10) ter afundado a décima embarcação supostamente usada pelo narcotráfico no Mar do Caribe. Para analistas, os ataques a barcos são ilegais.

Testes para forças armadas

À DW, uma especialista sob condição de anonimato chamou as ações militares dos EUA de “completamente desproporcionais” se o objetivo é atacar lanchas que transportam drogas na região. Funcionam, na verdade, como uma demonstração de força e um sinal de alerta.

Há cada vez mais sinais de um ataque iminente contra a Venezuela, ela argumenta, citando recentes incursões aéreas frente às águas venezuelanas que colocavam à prova a capacidade de resposta das Forças Armadas venezuelanas.

O apoio das forças militares venezuelanas é parte central do aparato que permite a Maduro permanecer no poder. Uma operação terrestre ou o uso de bombardeiros B-1, entretanto, são descartados por especialistas, por causa do alto custo e desgaste que imporiam aos EUA.

“Eles começariam com algum ataque seletivo com um míssil de um navio ou do ar”, disse uma fonte militar espanhola. “A CIA busca inteligência, o que fazer e o que não fazer, para promover a rebelião interna (das forças militares), que é como essa agência funciona”.

O coronel aposentado do Exército dos EUA Manuel Supervielle, entretanto, ressalta que bombardeiros B-1 também podem ser usados de longas distâncias. “A vantagem dos EUA em um confronto com a Venezuela é que eles têm tecnologia militar muito superior e podem atingir alvos fora do alcance venezuelano. O que o governo americano certamente não quer são baixas entre as tropas americanas.”

Narcotráfico na mira

Para Sebastiana Barráez, jornalista venezuelana especializada no tema militar, o alvo de um hipotético ataque dos EUA poderiam ser “laboratórios” ou “acampamentos guerrilheiros” vinculados ao narcotráfico. Uma ação deste tipo, afirma, seria mais fácil de justificar internacionalmente do que outro tipo de intervenção militar.

Ela enxerga ainda a possibilidade de uma operação de extração de autoridades venezuelanas de alto nível, incluindo Maduro, sob o argumento de que elas estão à frente do narcotráfico venezuelano.

Em julho, os EUA acusaram o presidente venezuelano de estar à frente do Cartel de los Soles, então classificado por Trump como organização terrorista internacional. O governo americano já ofereceu recompensas financeiras por Maduro e outras autoridades.

Por sua vez, Supervielle menciona a possibilidade de “eliminação seletiva” por meio de “ataques para assassinar determinadas pessoas e criar instabilidade na cúpula do regime que permita ou dê a oportunidade a outros grupos dentro das próprias Forças Armadas da Venezuela de tomar o poder e transferi-lo ao governo legítimo”.

Os EUA e o Parlamento Europeu reconhecem o líder da oposição venezuelana, Edmundo González Urrutia, como presidente legítimo e democraticamente eleito em 2024. Opositores do chavismo afirmam que os resultados das eleições foram fraudados para privilegiar Maduro, acusado de usurpar o poder.

Xadrez geopolítico

Já a opositora María Corina Machado, reconhecida como líder das forças armadas da Venezuela e ganhadora do Nobel da Paz deste ano, disse nesta semana que “o regime está mais fraco do que nunca.”

Maduro, por sua vez, afirma que a Venezuela mantém “nervos de aço” diante da pressão americana. “Somos ameaçados com palavras diariamente pelo império estadunidense, diariamente uma guerra psicológica”, disse num pronunciamento televisionado.

Segundo o presidente, a Venezuela conta com mais de cinco mil mísseis antiaéreos de fabricação russa. “Graças ao presidente [Vladimir] Putin, graças à Rússia, graças à China e graças a muitos amigos no mundo, a Venezuela tem um equipamento para garantir a paz”, afirmou.

Para os especialistas ouvidos pela DW, a crescente influência regional da China é outro fator-chave na equação das tensões entre EUA e Venezuela. O país asiático não se manifestou vocalmente nem a favor de Maduro nem contra Trump.

Já o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se encontrou com Trump durante cúpula na Malásia, se ofereceu como interlocutor entre Washington e Caracas. “Nós queremos manter a América do Sul como zona de paz. Nós não queremos trazer os conflitos de outras regiões para o nosso continente”, sustentou.