01/06/2010 - 0:00
O DNA é a receita para se criar um ser vivo. Em novembro do ano passado, cientistas da Universidade da Pensilvânia (EUA) publicaram um trabalho com 80% da sequência genômica do mamute. O estudo levou a uma outra especulação: poderíamos trazer esse gigante de volta à vida? Há rumores consistentes de que os japoneses trabalham ativamente nisso, a partir de amostras de mamutes colhidas na Sibéria. Mas os trabalhos são sigilosos. Por enquanto, não é possível criar um ser vivo a partir de um DNA existente na memória de um computador. Mas Stephan Schuster, biólogo molecular e líder da pesquisa com o genoma do mamute, prevê que em algum momento isso acontecerá.
Para fazer com que uma criatura extinta renasça, são necessários dois componentes essenciais: o genoma completo e um parente vivo compatível que possa dar à luz o clone. A primeira dificuldade é conseguir extrair uma sequência completa de DNA. Quando um ser vivo morre, o corpo fica sujeito a uma série de alterações em seu material genético – bactérias o decompõem e o sol danifica algumas estruturas do genoma. Ainda assim, é possível encontrar boas condições de preservação do material genético em certas circunstâncias. Por exemplo, quando a criatura morre em terras gélidas, como a Sibéria (o caso de milhares de mamutes), e tem seu corpo congelado; ou quando falece em uma caverna úmida e escura.
Mas, mesmo em condições ideais para a preservação do DNA, há outro fator que prejudica sua conservação: o tempo. Até agora não se tem notícia de nenhuma informação genética que conseguisse sobreviver a mais de um milhão de anos. Logo, as hipóteses de clonagem apresentadas no filme O parque dos dinossauros (1993) ainda não podem ser concretizadas. Somente sequências genéticas de espécies muito mais próximas de nós são capazes de armazenar um código genético de alta qualidade. Por isso, “só vale a pena estudar espécimes com menos de 100 mil anos”, declara Schuster.
Genomas de várias espécies extintas estão sendo pesquisados. Infelizmente, porém, trazer esses animais de volta à vida ainda é inviável, dado o atual estágio da tecnologia da manipulação genética. Não há, no entanto, motivos para se perder a esperança. Afinal, há 50 anos, quem acreditaria que conseguiríamos decodificar um DNA, consertar tantas doenças genéticas, clonar mamíferos e estar tão perto de criar uma vida artificial? Considerando que futuramente desenvolveremos a tecnologia para realizar tal façanha, selecionamos dez criaturas extintas que poderiam ser ressuscitadas. A triagem não é baseada apenas na praticidade, mas no comportamento desses animais na natureza. Afinal, reviver uma fera extinta pode trazer problemas práticos, como em que hábitat ele viverá.
A primeira espécie a ser trazida de volta da extinção – os gorilas-das-montanhas – será uma das que estarão vivas futuramente por meio da clonagem. Os cientistas já estão coletando amostras de tecidos das espécies ameaçadas, congelando- as para que possam produzir clones com a ajuda de parentes próximos que sirvam de barriga de aluguel, se houver um hábitat para tal. Para os gorilas, as mães de aluguel seriam as chimpanzés.
Esse famoso felino dotado de enormes caninos seria um colírio para os olhos. Há alguns fósseis conservados nos Poços de Piche do Rancho La Brea, em Los Angeles (EUA), mas o alcatrão dificulta a extração do DNA. Então, ainda ninguém foi capaz de isolar uma sequência decente para os estudos. A boa notícia é que há alguns indivíduos preservados em áreas de permafrost (terras permanentemente congeladas típicas das regiões polares) que podem ser uma fonte boa de DNA. Se pudéssemos obter o genoma do tigre-dente-de-sabre, um parente próximo, o leão africano, seria um bom doador de óvulos e mãe de aluguel compatível. Portanto, californianos, cuidado! Gorila (Gorilla gorilla) – Quase extinto – DNA preservado: – Mãe de aluguel compatível: A primeira espécie a ser trazida de volta da extinção – os gorilas-das-montanhas – será uma das que estarão vivas futuramente por meio da clonagem. Os cientistas já estão coletando amostras de tecidos das espécies ameaçadas, congelando- as para que possam produzir clones com a ajuda de parentes próximos que sirvam de barriga de aluguel, se houver um hábitat para tal. Para os gorilas, as mães de aluguel seriam as chimpanzés
Em fevereiro último, aproximadamente 60% do código genético dos neandertais foi decifrado. “Para se ter um genoma de qualidade razoável, do mesmo nível que hoje se tem dos chimpanzés, seriam necessários dois anos, ou mais, de estudo”, avalia Svante Pääbo, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolucionária em Leipzig, na Alemanha. Ele espera que o genoma traga insights sobre as diferenças entre os humanos e seus misteriosos primos extintos. Especula-se que esses insights possam ser usados para ressuscitar o Homem de Neandertal. Devido ao nosso ancestral comum, a espécie humana é a doadora de óvulos e mãe de aluguel ideal. Mas a ideia é polêmica. “Considero a ideia de ressuscitar o neandertal ridícula”, afirma Pääbo. No máximo, pesquisadores podem substituir genes humanos pelos do neandertal em células em crescimento em laboratório para estudar os efeitos, afirma.
O mamute, um primo próximo do elefante, é um dos mais fortes candidatos à ressurreição. O genoma mitocondrial de uma de suas subespécies, o mamute-lanoso, foi completamente sequenciado em 2006. Trabalha-se agora para completar as sequências do seu DNA nuclear. O mamute é um animal extinto que pertence ao gênero Mammuthus e à família Elephantidae, incluída nos proboscídeos. Tal como os elefantes, esses animais apresentavam tromba e presas de marfim encurvadas, que podiam atingir cinco metros de comprimento, mas tinham o corpo coberto de pelos. Extintos há apenas 12 mil anos, eles foram muito comuns no Neolítico, época em que constituíam uma importante fonte de alimentação do homem pré-histórico. Os mamutes viviam na Europa, no norte da Ásia e da América do Norte, em climas temperados ou frios. Sua extinção provavelmente ocorreu por conta das alterações climáticas do fim da Idade do Gelo. Descobertas mostram também que o ser humano teve papel fundamental na extinção dos mamutes. De acordo com essas pesquisas, o ser humano matou mamutes para comer sua carne, confeccionar vestimentas e usar ossos e couro na fabricação de casas, entre outras finalidades. Na Sibéria descobriram-se centenas de restos congelados de mamutes em excelente estado de conservação.
Essa preguiça gigante tinha aproximadamente seis metros de altura e pesava cerca de quatro toneladas. O desaparecimento relativamente recente desse bicho fez com que muitos espécimes fossem encontrados ainda com pelos e pedaços de pele, que são boa fonte de DNA. Então, há grandes chances de decodificarmos esse gigante? “Com certeza”, afirma Hendrik Poinar, da Universidade de Macmaster, no Canadá, que extraiu o DNA do megatério em um esterco fossilizado de mais ou menos 30 mil anos. A maior dificuldade é encontrar uma espécie que sirva como mãe de aluguel.
Os caçadores de cervos dariam qualquer coisa para poder caçar esse gigante do Pleistoceno, que já habitou a Europa. Um macho dessa espécie tinha mais de dois metros de altura, com ombros e chifres de quatro metros de largura. É mais um cervo que um alce; seu parente mais próximo é um cervo muito menor, mas ambas as espécies têm o mesmo ancestral comum, surgido há 10 milhões de anos. A distância entre o alce-gigante e o cervo significa que será difícil ver como um genoma completo pode se tornar um animal de verdade.
Em 2002, geneticistas da Universidade de Oxford, no Reino Unido, conseguiram permissão para estudar o espécime mais bem conservado desse pombo gigante – um osso do pé com pele e penas, guardado a sete chaves no Museu de História Natural da universidade. “Foi uma das coisas mais sinistras que eu já fiz”, lembra Beth Shapiro, especialista em DNA, agora na Universidade do Estado da Pensilvânia (EUA). Esse estudo rendeu apenas mais alguns fragmentos do DNA mitocondrial do dodô. A partir disso, nenhum outro espécime acrescentou mais informações sobre o genoma dessa ave. “Ainda estamos procurando”, diz Shapiro. Se uma sequência genômica puder ser produzida a partir dessas descobertas, os pombos seriam os parentes mais próximos para trazer o dodô de volta à vida.
Muitos trabalham para ressuscitar o rinoceronte-lanudo. Como aconteceu com outros mamíferos, há muitos espécimes preservados no permafrost, além de amostras de pelos, chifres e cascos. Esses tecidos podem ser limpos com xampu e água sanitária para remover os micróbios e fungos antes de serem usadas enzimas para extrair o DNA (quase) puro do rinoceronte. Então, é provável que geneticistas publiquem toda a sequência em pouco tempo. Seus parentes mais próximos são os rinocerontes atuais, ótimos candidatos a funcionar como barrigas de aluguel.
Esse tatu gigante, cujo tamanho era maior que o de um fusca, habitava os campos da América Latina. Como não há gliptodontes congelados, a esperança de ressuscitá-lo está em encontrar um DNA bem preservado em alguma caverna fresca e úmida. Além disso, há um outro problema: a espécie mais compatível para atuar como barriga de aluguel. As espécies de tatu atuais são muito menores que o gliptodonte.
Há muito DNA a ser descoberto em ossos e ovos bem preservados em cavernas na Nova Zelândia. Então, obter o genoma do moa não deve ser tão difícil. Mas qual moa analisar primeiro? Seria tentador dar preferência ao maior, de mais de três metros de altura, Dinornis robustus, mas é mais sensato começar por uma espécie menor, como o Megalapteryx didinus. Mesmo que o avestruz seja um parente distante do moa, ele poderia servir de mãe de aluguel. No entanto, como nenhuma ave foi clonada até os dias de hoje, talvez seja mais viável modificar um embrião de avestruz para que ele seja como um moa, do que clonar essa ave extinta.
Esse ursídeo gigante transformaria o urso polar num bichinho de pelúcia. O urso-de-cara-achatada pode ter tido um terço a mais da altura de um ursopolar, quando está na posição vertical, pesando mais de uma tonelada. Recuperar seu DNA deve ser possível, já que há muitos cadáveres preservados no permafrost. O parente mais próximo desse gigantesco animal é o ursode- óculos, ou urso andino, da América do Sul. As duas espécies surgiram do mesmo ancestral, há 5 milhões de anos; mas, infelizmente, com apenas um décimo da massa corpórea do urso-de-cara-achatada, o urso-de-óculos não seria uma boa espécie para mãe de aluguel compatível.
Benjamin, o último tigre-da-tasmânia, ou thylacine, morreu no zoológico de Hobart (capital da Tasmânia), em 1936. A existência de tecidos preservados de menos de um século de idade significa que os geneticistas podem conseguir seu DNA em bom estado de conservação e produzir uma sequência completa do genoma. Quando se fala em ressuscitação, os marsupiais, como o tigre-da-tasmânia, são mais fáceis de reviver que os demais mamíferos. A gravidez dessas criaturas dura apenas algumas semanas; uma placenta simples e temporária se forma, o que significa menor risco de rejeição entre embrião e mãe de aluguel do que nos demais seres. Para o tigre-da-tasmânia, o hospedeiro mais próximo seria o demônio-da-tasmânia. Depois do nascimento, o filhote pode ser alimentado com leite em um marsúpio (bolsa) artificial.
RECEITA DA RESSURREIÇÃO
O QUE É NECESSÁRIO:
– DNA bem preservado
– Muitos bilhões de partes básicas de DNA
– Uma espécie que sirva de barriga de aluguel
– Tecnologias avançadas
O QUE FAZER:
1Extraia o DNA de uma espécie extinta, sequencie os fragmentos e junte-os para obter o genoma completo. Realidade: As sequências do genoma de animais extintos são um enigma, além de poder conter erros cruciais.
2Agora pegue as suas partes básicas de DNA e recrie o genoma da sua fera extinta favorita, com os números corretos de cromossomos. Realidade: Ainda não é possível fazer moléculas de DNA longas a partir do zero, mas um dia poderemos.
3Coloque o cromossomo em um núcleo artificial e insira-o em um óvulo coletado de uma espécie compatível. Esse material, mais tarde, vai se desenvolver em um embrião, que será o clone do animal já extinto. Realidade: Achar espécies compatíveis, sem contar retirar óvulos dela, pode ser um problema enorme.
4Faça crescer um filhote a partir de um embrião. Para os mamíferos, implante o embrião no útero de uma fêmea usada como barriga de aluguel; para aves e répteis, incube o embrião usando uma tecnologia futura ainda não criada; para anfíbios e peixes, animais em que a fertilização se dá fora do corpo, só nos resta sentar e esperar para ver. Realidade: Barrigas de aluguel compatíveis podem não existir para esses animais extintos.