Microrganismos são mais conhecidos pelos prejuízos que causam à nossa respiração, mas também existem espécies que nos ajudam devorando detritos

 

Por Eduardo Araia

 

Eles só são visíveis ao microscópio, mas que estrago fazem! As pessoas que sofrem de doenças respiratórias que os digam. E não adianta isolar-se num lugar sem poluição para dizer que se livrou deles: os ácaros povoam todo o planeta, da Amazônia ao Saara, do Mar Morto ao Everest. Adoram o nosso lar, a nossa cama – um compartilhamento forçado e, acredita a maioria, indesejado.

Mas é bom começar a rever os (pre)conceitos a respeito desses microrganismos aparentados com as aranhas e os escorpiões. De início, os inimigos dos que têm problemas respiratórios – os ácaros da poeira, chamados dermatofagoides (Dermatophagoides pteronyssinus) – são apenas uma das mais de 45 mil espécies desses animais.

Os ácaros menores medem 1/10 de milímetro, enquanto os maiores chegam a 1 centímetro. Algumas espécies são parasitas de plantas, de animais terrestres e marinhos, mas há também as saprófitas (comedoras de detritos), as carnívoras e até as canibais.

Calcula-se que, em 1 metro quadrado de solo de floresta, podem viver nada menos do que 1 milhão de ácaros, subdivididos em cerca de 200 espécies. É, sem dúvida, um animal que superou os obstáculos enfrentados.

“Os ácaros têm sempre estado reunidos num grupo muito evolutivo e especializado”, afirma o prof. Fabio Bernini, professor de Zoologia da Universidade de Siena e um dos mais importantes acarologistas europeus, à revista italiana “Quark”. “O fato estranho é que, como grupo, foi um dos primeiros a surgir sobre a Terra, 390 milhões de anos atrás, na Era Devoniana, e, embora sejam animais tão antigos, sua estrutura se manteve sem variação.”

 

Capacidade de adaptação

A sobrevivência, dizem os cientistas, se explica pela adaptação dos ácaros aos diversos ambientes e pelo oportunismo que têm demonstrado ao “redesenhar” suas estruturas de modo a serem usadas de maneiras diferentes.

“Os ácaros possuem quatro pares de pernas, dois pares de apêndices anteriores chamados quelíceras e palpos, mas tais estruturas são utilizadas de maneiras diversas”, ressalta Bernini. “Por exemplo, alguns ácaros usam enquanto caminham, como órgãos sensoriais para testar o ar, o primeiro par de pernas. Sua diversidade de forma e de adaptação os torna extremamente fascinantes.”

Não é à toa que, quando se fala em ácaros, a ligação que a maioria de nós faz é com os dermatofagoides: um ambiente com temperatura entre 15 ºC e 30 ºC, com umidade entre 60% e 80%, representa o paraíso para eles – e a descrição se encaixa feito luva em nossos lares. Eles povoam poltronas, tapetes, colchões, bichos de pelúcia, e um dos alimentos para eles somos nós mesmos – ou, mais especificamente, escamas da nossa pele.

Responsáveis por 80% das alergias respiratórias, os dermatofagoides encontram muito mais facilidade em casas sujas: dependendo da higiene doméstica, são observados de 10 a mil ou mais ácaros por grama de poeira. Para os alérgicos, o problema não são exatamente os ácaros, mas suas fezes – elas podem chegar a 100 mil partículas por grama de poeira.

A galeria de ácaros nocivos inclui ainda os Sarcoptes scabiei, portadores da sarna, e o Demodex folliculorum, que costuma cavar galerias embaixo da nossa pele. Mas a maioria das espécies desses microrganismos ou é inócua ou ajuda o homem.

 

Desmontadores de detritos

“No solo podem viver até milhões de ácaros”, diz Bernini, “a maioria dos quais como saprófitos, ou seja, devorando os detritos. Esses ácaros são muito importantes porque servem para reciclagem de substâncias orgânicas e ocupam o primeiro lugar na cadeia de desmontagem dos detritos”.

Bernini acrescenta: “Em cada tipo de solo se encontram espécies diferentes de ácaros. Por esse motivo, são muito úteis como indicadores biológicos para determinar a saúde de um solo ou como o ambiente foi transformado pelo homem. Na prática, o estudo dos ácaros pode ser representativo da história do território”.

Essa característica abriu inclusive um novo filão de trabalho para a polícia. O estudo da presença dos ácaros e de seus graus de desenvolvimento representa uma considerável ajuda para que os especialistas dêem uma definição temporal precisa da decomposição do cadáver.

Outra utilidade para esses animais foi encontrada por agricultores. Ácaros carnívoros, como os Phytoseiidae, são colocados em determinadas plantações para combater outras espécies que as infestam, como os Tetranychidae ou o Panonychus ulmi. “Em resumo, se fizermos um balanço dos danos e dos benefícios que esses pequenos organismos trazem ao homem”, assegura Bernini, “estamos quase certos de que ele estará no ativo”.

 

 

Quadro: Para exterminar os ácaros

Livrar-se dos ácaros dermatofagoides exige muito capricho na limpeza.

De início, elimine o que for passível de acumular poeira, como cortinas, tapetes, estantes abertas com livros, quadros e bichos de pelúcia. Os colchões e os travesseiros devem ser revestidos com uma capa de plástico; os primeiros devem ser virados a cada quinzena.

Como os fungos servem de alimento para os ácaros, a limpeza doméstica pode ser feita com uma fórmula antifúngica: solução de ácido fênico a 5% ou solução de hipoclorito de sódio a 0,5%. Vale lembrar que aparelhos do gênero sterilair servem somente para atenuar o problema.