Diamantes extraídos no município de Juína, no noroeste de Mato Grosso, são mesmo excepcionais. Eles não só apresentam um mineral nunca visto na natureza (a ringwoodita) e evidenciam a presença de umidade no manto terrestre, como também se revelam como testemunhos de um passado remotíssimo da Terra, simultâneo ou até anterior ao choque do nosso planeta com a Lua.

A informação vem de análises que mostram que os gases encontrados em inclusões microscópicas nos diamantes de Juína têm origem em um reservatório subterrâneo estável pelo menos tão antigo quanto a Lua, oculto mais de 410 km abaixo do nível do mar no manto da Terra.

Há muito tempo se suspeitava que uma área do manto, entre a crosta e o núcleo, contém um vasto reservatório de rocha, que permaneceu relativamente intocado desde a formação do planeta. Mas não havia provas sobre a real existência desse lugar.

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Para detectar vestígios desse reservatório, um grupo internacional de cientistas mediu isótopos de hélio contidos em diamantes trazidos à superfície por violentas erupções vulcânicas. Esse trabalho, publicado hoje (15 de agosto) na revista “Science”, será apresentado aos cientistas pela primeira vez em 23 de agosto, na Conferência Goldschmidt, em Barcelona.

 

Estrutura alterada

Após a formação da Terra, atividades geológicas violentas e colisões com outros corpos celestes quase que impediram que o jovem planeta conservasse sua estrutura original.

Nos anos 1980, porém, geoquímicos notaram que, em algumas lavas de basalto de locais específicos, a razão entre os isótopos de hélio-3 e hélio-4 era maior que a esperada. Ela se assemelhava à razão isotópica encontrada em meteoritos antiquíssimos que haviam caído na Terra. Isso indica que a lava trouxe o material de algum tipo de reservatório nas profundezas do planeta, com uma composição basicamente nos últimos 4 bilhões de anos.

“Esse padrão foi observado nos ‘basaltos das ilhas oceânicas’, que são lavas que chegam à superfície das profundezas da Terra e formam ilhas como o Havaí e a Islândia”, disse a líder da pesquisa, Suzette Timmerman, da Universidade Nacional Australiana. “O problema é que, embora esses basaltos sejam trazidos à tona, só vemos um vislumbre de sua história. Não sabemos muito sobre o manto de onde vieram seus derretimentos.”

Para resolver o problema, a equipe de Timmerman analisou as razões de isótopos de hélio em diamantes superprofundos. A maioria dos diamantes é formada entre 150 km e 230 km abaixo da crosta terrestre, antes de ser trazida para a superfície por meio de materiais fundidos. Muito ocasionalmente alguns diamantes superprofundos (criados entre 230 km e 800 km abaixo da superfície da Terra) são trazidos à superfície. Esses diamantes são reconhecidamente diferentes dos diamantes normais.

 

Cápsula do tempo

“Os diamantes são a substância natural mais dura e indestrutível conhecida, por isso formam uma cápsula do tempo perfeita que nos fornece uma janela para a Terra profunda”, afirma Timmerman. “Conseguimos extrair gás hélio de 23 diamantes superprofundos oriundos da área de Juína, no Brasil. Eles mostraram a composição isotópica característica que poderíamos esperar de um reservatório muito antigo, confirmando que os gases são remanescentes de uma época igual ou até anterior à colisão da Lua e da Terra.”

Timmerman prossegue: “Pela geoquímica dos diamantes, sabemos que eles se formaram em uma área chamada ‘zona de transição’, que fica entre 410 km e 660 km abaixo da superfície da Terra, o que significa que esse reservatório invisível, remanescente dos primórdios da Terra, deve estar nessa área ou abaixo dela”.

“Questões permanecem sobre a forma desse reservatório”, acrescenta a cientista. “É um grande reservatório único ou existem vários reservatórios antigos menores? Onde exatamente está o reservatório? Qual é a composição química completa desse reservatório? Mas com este trabalho, estamos começando a nos voltar para o que é provavelmente o mais antigo material comparativamente intacto da Terra”, diz ela.