19/08/2019 - 14:41
(Universidade de Cambridge) – Até recentemente, a pesquisa econômica predominante considerava que o ônus da mudança climática recairia sobre os países quentes ou pobres. Para alguns, economias mais frias ou mais ricas não seriam afetadas, e algumas até poderiam se beneficiar com temperaturas mais altas.
Mas um novo estudo sugere que praticamente todos os países – ricos ou pobres, quentes ou frios – sofrerão economicamente até 2100 se a atual trajetória das emissões de carbono for mantida.
O estudo, publicado em 19 de agosto pelo Bureau Nacional de Pesquisa Econômica (NBER, na sigla em inglês), dos Estados Unidos, sugere que – em média – países mais ricos e frios perderiam tanto dinheiro com a mudança climática quanto países mais pobres e mais quentes. O trabalho reúne pesquisadores das universidades de Cambridge (Reino Unido), do Sul da Califórnia e Johns Hopkins (EUA), da Universidade Nacional de Tsing Hua (Taiwan) e do Fundo Monetário Internacional (FMI).
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Em um cenário de emissões business as usual (sem alterações na atividade econômica), as temperaturas médias globais deverão subir mais de 4 graus Celsius até o fim do século. Isso faria com que os EUA perdessem 10,5% do seu PIB até 2100 – um impacto econômico substancial, dizem os pesquisadores.
O Canadá perderia mais de 13% de sua renda até 2100. A pesquisa mostra que a manutenção do Acordo de Paris limitaria as perdas de ambas as nações da América do Norte a menos de 2% do PIB.
Perdas substanciais
Pesquisadores dizem que 7% do PIB global deverá desaparecer até o fim do século, a menos que “ações sejam tomadas”. perderiam 10% de sua renda. É provável que a Suíça tenha uma economia 12% menor até 2100. A Rússia ficaria sem 9% de seu PIB, e o Reino Unido teria uma queda de 4%.
A equipe responsável pelo estudo argumenta que não é apenas o número do termômetro, mas o desvio de temperatura de sua “norma histórica” – as condições climáticas às quais os países estão acostumados – que determina o tamanho da perda de renda.
“Seja por ondas de frio ou de calor, secas, inundações ou desastres naturais, todos os desvios das condições climáticas de suas normas históricas têm efeitos econômicos adversos”, disse Kamiar Mohaddes, da Faculdade de Economia de Cambridge e coautor do estudo.
“Sem políticas de mitigação e adaptação, muitos países provavelmente sofrerão aumentos sustentados de temperatura em relação às normas históricas e, como resultado, sofrerão grandes perdas de renda. Isso vale tanto para países ricos e pobres quanto para regiões quentes e frias.”
“O Canadá está se aquecendo duas vezes mais rapidamente do que o resto do mundo. Há riscos para sua infraestrutura física, comunidades costeiras e do norte, saúde e bem-estar humano, ecossistemas e pesca – tudo isso tem um custo”, acrescenta Mohaddes.
Cenários projetados
“O Reino Unido teve recentemente seu dia mais quente já registrado. Trilhos de trem se dobraram, estradas derretiam e milhares ficaram presos porque estava fora da norma. Tais eventos causam prejuízos econômicos e só se tornarão mais frequentes e severos sem políticas para enfrentar as ameaças da mudança climática.”
Usando dados de 174 países a partir de 1960, a equipe de pesquisa estimou a ligação entre as temperaturas acima da norma e os níveis de renda. Eles então modelaram os efeitos da renda sob uma continuação das emissões business-as-usual, bem como um cenário em que o mundo “se une” e se atém ao Acordo de Paris.
Os pesquisadores reconhecem que as economias se adaptarão às mudanças climáticas, mas argumentam que o trabalho de modelagem mostra que a adaptação, sozinha, não será suficiente.
O consenso científico sugere que a adaptação à mudança climática leva em média 30 anos, já que tudo, desde a infraestrutura até a prática cultural, se ajusta lentamente. Mas mesmo que esse ajuste aumente para apenas 20 anos, os EUA ainda perderiam quase 7% de sua economia, e o PIB global cairia mais de 4% até o fim do século.
A equipe também adotou uma abordagem mais focada nos EUA para avaliar a força de seus resultados. “Os estudos entre países são importantes para o quadro geral, mas a média dos dados em nível nacional leva à perda de informações em países geograficamente diversos, como o Brasil, a China ou os EUA”, disse Mohaddes.
Perdas inevitáveis
“Ao nos concentrarmos nos EUA, pudemos comparar se a atividade econômica em áreas quentes ou úmidas responde a flutuações de temperatura em torno de normas históricas da mesma maneira que em áreas frias ou secas dentro de uma única grande nação.”
Os pesquisadores analisaram dez setores, desde manufatura e serviços até comércio varejista e atacado em 48 estados dos EUA, e descobriram que cada setor em cada estado sofria economicamente com pelo menos um aspecto da mudança climática – seja calor, enchente, seca ou congelamento.
Quando ampliados, esses são os efeitos que criarão perdas econômicas nos níveis nacional e global, mesmo em economias avançadas e supostamente resilientes, dizem os pesquisadores.
“A economia da mudança climática vai muito além do impacto sobre o cultivo”, disse Mohaddes. “Chuvas fortes impedem o acesso das montanhas à mineração e afetam os preços das commodities. As pressões frias aumentam as contas de aquecimento e as quedas nos gastos das ruas. Ondas de calor causam o fechamento de redes de transporte. Todas essas coisas se somam.”
Ele complementa: “A ideia de que nações ricas e temperadas são economicamente imunes à mudança climática, ou que poderiam dobrar e triplicar sua riqueza como resultado, parece implausível. (…) Se as nações avançadas quiserem evitar grandes prejuízos econômicos nas próximas décadas, o Acordo de Paris é um bom começo”.