01/12/2011 - 0:00
Atualmente, 1.370.536.875 pessoas vivem na China, incluindo Hong Kong, Macau e Taiwan. Embora 1 bilhão pareça um número gigantesco, o país começa a se preocupar. Na última década, a população cresceu 5,8%, índice baixo comparado aos outros anos. De acordo com o Bureau Nacional de Estatística da República da China, a população também envelheceu, pois a proporção de jovens abaixo dos 14 anos caiu para 16% em relação ao total de pessoas, ao passo que a proporção de idosos de mais de 60 anos aumentou 3%. A taxa de fecundidade está entre 1,7 e 1,8 filho por mulher – quando 2,1 é o mínimo para recompor a população.
Já em 2025, o crescimento populacional chinês começará a ser negativo, segundo as Nações Unidas. “A China é muito grande e há muitos anos vem mantendo a política do filho único, uma legislação que obriga os casais a ter apenas um filho. Além disso, por razões culturais, os filhos homens são preferidos. Resultado: o país será prejudicado em termos de reprodução da população devido à falta de meninas”, afirma Margareth Arilha, pesquisadora de saúde reprodutiva do Núcleo de Estudos de População da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Em boa parte da Ásia, as meninas são vistas como membros que não trazem benefícios à família, do ponto de vista econômico, social e cultural. É o homem que dá procedência à linhagem do nome, assume a chefia da casa e é responsável pelos mais velhos. Embora a desproporção entre nascimentos de homens e mulheres chineses tenha diminuído, ela continua alta: para cada grupo de 100 mulheres, há 105,2 homens. Tanto na China quanto em outros países asiáticos, como a Índia, há muitos casos de aborto e de assassinato de bebês do sexo feminino.
“Os abortos seletivos foram adotados por ‘grupos pioneiros’, mais ricos, que tinham acesso a tecnologias como ultrassonografia, como solução para reduzir o número de crianças e maximizar a probabilidade de ter pelo menos um filho homem”, explica Christophe Z. Guilmoto, no artigo “The Sex Transition in Asia”, publicado pelo Centre Population et Développement da Université Paris Descartes, na França.
Europeias individualistas
O casamento ainda é o modo mais popular de criar filhos na Ásia e no mundo, por enquanto. Apenas 2% dos nascimentos acontecem fora do matrimônio no Japão. Já em países europeus, como a Suécia, 55% dos bebês são de mulheres não casadas. Na Islândia, a percentagem atinge 66%. Atualmente, há 83 países com taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição. Os casos mais graves são Bósnia, Malta, Hong Kong, Portugal, Áustria, Cingapura, Romênia, Coreia do Sul, Polônia, Ucrânia, China e Japão.
Indonésia: casamento? Sim, por favor.
Como é previsível, onde a desproporção entre o número de homens e o de mulheres é alta, em algum momento, faltarão esposas. Outro fenômeno é o casamento tardio, recorrente na Ásia Oriental. Apesar de ser uma tradição cultural forte, muitas mulheres não têm pressa em se casar e algumas não fazem mais tanta questão de se unir a homens da mesma nacionalidade.
Segundo o Instituto de Pesquisa da Ásia, em Hong Kong e nas cidades mais ricas do Japão e da Coreia do Sul, a idade média do casamento varia entre 29 e 30 anos para mulheres e 31 e 33 anos para os homens. Já no Ocidente, a média abaixa para 26 anos para mulheres e 28 para homens. É cada vez mais comum a jovem asiática optar por não se casar. Vinte por cento dos japoneses entre 20 e 27 anos afirmam que não sabem se querem a união. Dos jovens norte-americanos dessa mesma faixa etária, apenas 5% não desejam o matrimônio e outros 5% não se decidiram.
Um dos fatores decisivos da opção pela vida solteira é que os jovens orientais não veem vantagens no casamento, uma vez que muitos dos casados estão insatisfeitos. Pesquisas do East-West Center (EUA) revelam que os casais norte-americanos apresentam maior satisfação com o matrimônio do que japoneses e sul-coreanos. Acredita-se que isso se justifica pelo fato de os ocidentais terem uma visão pragmática do divórcio: eles se separam com facilidade se são infelizes no casamento.
O número de divórcios subiu nos países da Ásia, mas esse é mais um motivo para os jovens não casarem. Um em cada cinco casamentos no Japão, na Coreia do Sul e na China termina em separação. “Nessas sociedades, o risco de divórcio pode dar mais motivação às mulheres solteiras a investir em boa educação e na carreira em vez de se casar cedo”, afirma o estudo do East- West Center. Outra diferença marcante é que, entre os asiáticos, quase não há união sem casamento civil ou religioso. No Japão, apenas 5% das mulheres entre 25 e 29 anos e 8% das com 30 a 34 anos moraram com seus companheiros.
Maridos machistas
Educação, carreira e custo de vida alto são fatores que contribuem para a inserção e permanência da mulher no mercado de trabalho. Na volátil situação econômica atual, elas desempenham papel importante no sustento da casa. Apesar de o homem ganhar mais, algumas despesas já são responsabilidade delas. Nesse cenário, também precisam cuidar da casa, dos filhos e dos idosos – o que as feministas denunciavam como “dupla jornada de trabalho”.
Os maridos asiáticos ajudam menos as mulheres do que os americanos. Não por acaso, com todas as tarefas extras, elas preferem não casar. No Japão e na Coreia do Sul, o processo seletivo para instituições de ensino é competitivo desde os primeiros anos. Boas escolas e notas no currículo escolar garantem boas universidades e um futuro promissor. Além disso, as sociedades valorizam o ensino rigoroso e disciplinado. Compete às mães o papel de ajudar os filhos com a lição de casa e, muitas vezes, de pagar cursinhos, que podem ser mais caros do que o colégio.
De acordo com o relatório do East- West Center, a mudança do papel e do comportamento da mulher tem implicações nas áreas de saúde, planejamento familiar, trabalho e sistemas de suporte para os mais velhos. O casamento tardio é um dos fatores da baixa taxa de natalidade no Japão, na Coreia do Sul, em Taiwan e em Cingapura. Os governos asiáticos agora precisam investir em políticas públicas para facilitar a maternidade.
As controvérsias da desigualdade entre gêneros, entretanto, permanecem. Em alguns países asiáticos os homens preferem mulheres que tenham menor grau de instrução que eles. Em Cingapura, o número de mulheres solteiras graduadas é enorme. Um terço das mulheres de 30 a 34 anos que frequentaram universidades não casam.
Japão: casamento? Não, obrigado.
Brasileiras disponíveis
O Brasil, felizmente, ainda não corre o mesmo risco da Ásia. Há mais mulheres que homens, precisamente 96,9 homens para 100 mulheres. Essa proporção tende a se manter nos próximos 90 anos. Segundo as Nações Unidas, o crescimento da população brasileira só deverá ser negativo a partir de 2035. Mesmo assim, não há o que temer, pois pela projeção, a taxa de fecundidade tende a subir de 1,8 filhos por mulher, em 2010, para 1,96, em 2100.
Os pesquisadores Paula Ribeiro, da Universidade Federal de Minas Gerais, e Joseph Earl Potter, da Universidade do Texas, em Austin, nos Estados Unidos, argumentam, na Revista Brasileira de Estatística e População, que o Brasil se diferencia dos demais países com taxa de fecundidade abaixo dos 2,1 filhos do nível de reposição. Enquanto que os europeus têm filhos cada vez mais tarde, aqui, a fecundidade entre adolescentes ainda é alta.
Os autores chamam a atenção para a taxa de fecundidade declinante dos últimos anos, em especial entre a população mais pobre. “O fato de estar caindo tão drasticamente entre as mulheres pobres e pouco escolarizadas sugere que os fatores socioeconômicos não são suficientes para entender a fecundidade abaixo do nível de reposição do Brasil”, escrevem os pesquisadores.
Paula e Potter sugerem que os ideais femininos e instituições como a igreja e a mídia contribuíram para o padrão de reprodução. A questão de se manter virgem até o casamento já perdeu a força e as jovens iniciam sua vida sexual cada vez mais cedo. Elas encaram a separação com mais naturalidade, caso o marido seja violento, por exemplo. Apesar dessa nova perspectiva, muitas frequentam a igreja e tentam por em prática os valores religiosos, mantendo resquícios da cultura passada.
Mesmo com muitas mães adolescentes, a fecundidade brasileira está mudando. Segundo o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a maternidade entre jovens de 15 a 19 anos e de 20 a 24 anos caiu, respectivamente, de 18,8% e 29,3%, em 2000, para 17,7% e 27%. Já a fecundidade entre mulheres acima dos 30 anos subiu de 27,6% para 31,3%.
O Brasil está se aproximando do padrão reprodutivo dos países desenvolvidos. As jovens atuais, ao contrário das mulheres da geração anterior, já não almejam muitos filhos. As brasileiras urbanizadas preferem ter um ou dois para lhes garantir mais oportunidades na vida. O aumento da fecundidade acima de 30 anos pode ser evidência de que, como as europeias, elas estão adiando a maternidade em prol da carreira.
Fonte: Asia Research Institute; Ebenstein and Sharygin (2009). The Consequence of the ‘Missing girls’ of China