10/10/2019 - 10:32
As concentrações de gases-estufa na atmosfera aumentam progressivamente, os efeitos disso são testemunhados dia a dia, mas as ações para combater o problema ainda são muito tímidas. Enquanto isso, no esquema business as usual, muitos poluidores contumazes continuam a atuar sem freios. É o caso das 50 maiores petroleiras do mundo, segundo informa hoje (10 de outubro) o jornal inglês “The Guardian”: elas já estão preparadas para despejar nos mercados 7 milhões de barris adicionais por dia na próxima década. Os cientistas alertaram que isso levará o aquecimento global a níveis catastróficos.
De acordo com pesquisas encomendadas pelo jornal, a Shell e a ExxonMobil estarão entre os líderes desse movimento. As duas projetam um aumento de produção de mais de 35% entre 2018 e 2030. Isso representa um crescimento mais acentuado do que nos 12 anos anteriores.
Essa aceleração caminha no sentido contrário ao da redução de 45% nas emissões de carbono até 2030, índice apontado pelos cientistas como necessário para se manter o aquecimento global em no máximo 1,5 °C, um nível relativamente seguro.
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Considerada uma das instituições mais confiáveis no setor, a consultoria norueguesa Rystad Energy usou os ativos das empresas e o preço do petróleo a US$ 65 por barril (semelhante ao seu nível atual) no longo prazo para fazer suas projeções. Segundo ela, haverá um aumento de quase 8% na produção projetada das 50 principais empresas de petróleo e gás entre 2018 e 2030. Isso representaria quase 40% do orçamento de carbono restante para chegar a 1,5 °C de aquecimento. Em consequência, aumentaria o risco de eventos extremos como ondas de calor, furacões, incêndios florestais e inundações.
Maior produção no Texas
A Rystad prevê que pelo menos 14 dos 20 maiores produtores históricos de carbono planejam bombear mais hidrocarbonetos em 2030 do que em 2018. Os Estados Unidos se destacam nessa corrida, com uma produção nova nos próximos dez anos quatro vezes maior que a do vice-líder Canadá. Essa produção virá sobretudo do Texas, a partir de explorações de BP, Chevron e ConocoPhillips, ao lado de empresas menores. A soma dessas extrações deverá dar ao Texas uma produção maior que a da Arábia Saudita até 2030.
Há também novos projetos de perfuração maciços em andamento ou planejados no noroeste da Argentina, na costa da Guiana, no campo de Kashagan (Cazaquistão), na península de Yamal (Sibéria) e no Mar de Barents.
Ouvido pelo “Guardian”, Lorne Stockman, analista sênior de pesquisa da Oil Change International, que monitora as empresas de petróleo, disse: “Em vez de planejar um declínio ordenado da produção, elas [as petroleiras] estão dobrando a aposta e agindo como se não houvesse crise climática. Isso nos apresenta uma escolha simples: desligá-las ou enfrentar perturbações climáticas extremas.”
Civilização em risco
Richard Heede, pesquisador do Climate Accountability Institute nos EUA, declarou ao jornal que as empresas estariam colocando a si mesmas – e à civilização humana – em risco, a menos que mudassem para energia renovável e compensassem a nova produção para zerá-la até meados do século. “Nenhuma empresa que valorize sua licença social para operar deve fazer um investimento de capital em novos projetos de combustíveis fósseis, sem compensar ou seqestrar uma quantidade equivalente de dióxido de carbono, de modo a garantir o alinhamento com as metas científicas de 1,5 °C e zero emissões líquidas até 2050”, afirmou.
Por seu lado, o grupo de vigilância Global Witness estima que as empresas planejam investir US$ 4,9 trilhões em novos campos, nenhum dos quais é compatível com a meta de 1,5 °C.
Dieter Helm, acadêmico da Universidade de Oxford e consultor do governo britânico, disse ao “Guardian” que os gigantes do petróleo estão planejando uma “colheita” final de combustível fóssil. “Se levássemos a sério a questão da mudança climática, deixaríamos um pouco de petróleo no solo, para que haja uma disputa entre as grandes petroleiras para garantir que seus ativos não sejam os deixados encalhados”, disse. “A resposta delas é bombear o máximo que puderem, enquanto ainda podem, para continuar entregando dividendos aos acionistas. Mas o problema, para o resto de nós, é que eles produzirão muito mais petróleo e gás do que é consistente com o acordo de Paris.”