08/05/2020 - 19:21
Uma pesquisa recente da Agência Espacial Europeia (ESA) mostrou que a ureia, o principal composto orgânico encontrado em nossa urina, tornaria a mistura do concreto lunar mais maleável antes de endurecer para uma forma final e resistente destinada a futuros habitats lunares.
Os pesquisadores descobriram que a adição de ureia à mistura de geopolímeros lunares, um material de construção semelhante ao concreto, funcionou melhor do que outros plastificantes comuns, como naftaleno ou policarboxilato, para reduzir a necessidade de água.
A mistura que sai de uma impressora 3D provou ser mais forte e reteve uma boa condição de ser trabalhada – uma amostra nova pôde ser facilmente moldada e manteve sua forma com pesos até 10 vezes maiores que o seu.
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“A comunidade científica está particularmente impressionada com a grande força dessa nova receita em comparação com outros materiais, mas também atraída pelo fato de podermos usar o que já está na Lua”, diz Marlies Arnhof, iniciadora e coautora do estudo da Equipe de Conceitos Avançados da ESA.
Materiais disponíveis
Usar apenas materiais disponíveis no local – uma abordagem conhecida na área espacial como Utilização de Recursos In Situ (ISRU, na sigla em inglês) – reduzirá a necessidade de lançar enormes volumes de suprimentos da Terra para construir na Lua.
O ingrediente principal seria um solo bem fino encontrado em toda parte na superfície da Lua, conhecido como regolito lunar. O superplastificante de ureia limita a quantidade de água necessária na receita.
Graças aos futuros habitantes lunares, o 1,5 litro de resíduos líquidos que uma pessoa gera a cada dia pode se tornar um subproduto promissor para a exploração espacial.
“A ureia é barata e está prontamente disponível, mas também ajuda a produzir material de construção forte para uma base lunar”, aponta Arnhof.
Por que ureia?
Após a água, a ureia é o componente mais abundante da urina humana. Ela pode quebrar as ligações de hidrogênio e reduzir as viscosidades das misturas de fluidos. A urina também contém minerais de cálcio que ajudam no processo de cura do concreto.
Na Terra, a ureia é produzida em escala industrial e amplamente utilizada como fertilizante industrial e matéria-prima por empresas químicas e médicas.
“A esperança é que a urina do astronauta possa ser essencialmente usada em uma futura base lunar, com pequenos ajustes no teor de água. Isso é muito prático e evita a necessidade de complicar ainda mais os sofisticados sistemas de reciclagem de água no espaço”, explica Marlies.
Mistura resistente
Vários testes confirmaram que esse tipo de concreto misturado à ureia foi capaz de suportar condições espaciais severas, como vácuo e temperaturas extremas. Esses dois fatores têm o maior efeito sobre as propriedades físicas e mecânicas do material de construção para a superfície lunar.
Todas as amostras foram submetidas a ciclos de vácuo e congelamento-degelo para simular as mudanças bruscas de temperatura ao longo dos dias e noites lunares, que podem variar de -71 °C a 114 °C. As amostras resistiram a temperaturas variando de 114 °C a -80 °C, uma boa indicação de como o material se comportaria sob temperaturas ainda mais baixas.
Edifício comunitário
Uma estreita colaboração entre pesquisadores da ESA na Holanda e universidades na Noruega, Espanha e Itália sob a iniciativa Ariadna “nos permitiu analisar uma ideia tão exploratória e um tanto arriscada que pode trazer resultados valiosos não apenas para a exploração espacial, mas também para aplicações tecnológicas na Terra”, explica Shima Pilehvar, coautora do estudo e professora associada do Østfold University College, na Noruega.
“A indústria poderia se beneficiar de receitas refinadas para polímeros inorgânicos resistentes ao fogo e ao calor, adequados para a fabricação aditiva [o processo de criar objetos sólidos tridimensionais a partir de modelos digitais]”, acrescenta ela.
Um dos principais tópicos que a equipe deseja abordar a seguir é como as fibras de basalto da Lua podem reforçar o concreto e como o material pode ser mais bem utilizado para proteger uma colônia lunar. Os pesquisadores esperam que essa nova argamassa à base de ureia ajude a proteger futuros astronautas dos níveis prejudiciais de radiação ionizante.