Plandemic, um vídeo de teoria da conspiração, recentemente se tornou viral. Apesar de ter sido retirado do YouTube e do Facebook, ele continua sendo baixado e visualizado milhões de vezes. O vídeo é uma entrevista com a teórica da conspiração Judy Mikovits, uma desacreditada ex-pesquisadora de virologia que acredita que a pandemia de covid-19 se baseia em um grande complô, com o objetivo de lucrar com a venda de vacinas.

O vídeo é repleto de desinformação e teorias da conspiração. Muitas verificações e desclassificações de alta qualidade foram publicadas por órgãos respeitáveis, como Science, PolitiFact e FactCheck.

Como estudiosos que pesquisam como combater a desinformação científica e as teorias da conspiração, acreditamos que também há valor em expor as técnicas retóricas usadas em Plandemic. Conforme destacamos em nossos trabalhos “Conspiracy Theory Handbook” e “How to Spot Covid-19 Conspiracy Theories” (“Manual da Teoria da Conspiração” e “Como Identificar as Teorias da Conspiração sobre Covid-19”, em tradução livre), existem sete características distintivas do pensamento conspiratório. Plandemic oferece exemplos bastante didáticos de todas elas.

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Aprender essas características pode ajudar as pessoas a identificar as bandeiras vermelhas de uma teoria da conspiração sem fundamento e, esperançosamente, criar nelas alguma resistência a serem absorvidas por esse tipo de pensamento. Essa é uma habilidade importante, dada a atual onda de teorias da conspiração alimentadas pela pandemia.

1) Crenças contraditórias

Os teóricos da conspiração estão tão comprometidos com a descrença de um relato oficial que não importa se o sistema de crenças deles é internamente contraditório. O vídeo Plandemic apresenta duas histórias de origem falsa para o coronavírus. Ele argumenta que o SARS-CoV-2 veio de um laboratório em Wuhan – mas também argumenta que todo mundo já tem o coronavírus de vacinas anteriores e o uso de máscaras o ativa. Acreditar nas duas causas é mutuamente inconsistente.

2) Desconfiança extremada

Os teóricos da conspiração são extremamente desconfiados em relação à narrativa oficial. Isso significa que qualquer evidência científica que não se encaixe na teoria da conspiração deve ser falsificada.

Mas, se você acha que os dados científicos são falsos, isso leva à crença de que qualquer organização científica que publique ou apoie pesquisas consistentes com a “narrativa oficial” deve estar na conspiração. Para a covid-19, isso inclui a Organização Mundial da Saúde (OMS), os Centros para Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC), a Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA), Anthony Fauci… basicamente, qualquer grupo ou pessoa que realmente saiba algo sobre ciência deve fazer parte da conspiração.

3) Intenção nefasta

Em uma teoria da conspiração, supõe-se que os conspiradores tenham motivos malignos. No caso de Plandemic, não há limite para a intenção nefasta. O vídeo sugere que cientistas, incluindo Anthony Fauci, projetaram a pandemia da covid-19, uma trama que envolve a morte de centenas de milhares de pessoas até agora, com potencial de bilhões de dólares em lucro.

4) Convicção de que algo está errado

Os teóricos da conspiração podem ocasionalmente abandonar ideias específicas quando se tornam insustentáveis. Mas essas revisões tendem a não mudar sua conclusão geral de que “algo deve estar errado” e que a narrativa oficial se baseia em mentiras.

Quando perguntaram ao cineasta de Plandemic Mikki Willis se ele realmente acreditava que a covid-19 foi intencionalmente iniciada com fins lucrativos, sua resposta foi: “Não sei, para ser claro, se é uma situação intencional ou natural. Não faço ideia”.

Ele não faz ideia. Tudo o que ele sabe com certeza é que algo deve estar errado: “É muito suspeito”.

5) Vítima perseguida

Os teóricos da conspiração se consideram vítimas de perseguição organizada. O termo plandemic (um trocadilho em inglês que mistura as palavras “plano” e “pandemia”) aumenta ainda mais a vitimização persecutória, caracterizando toda a população mundial como vítima de um vasta tramoia, disseminada pela mídia e até por nós mesmos como cúmplices involuntários.

Ao mesmo tempo, os teóricos da conspiração se veem como heróis corajosos enfrentando os conspiradores vilões.

6) Imunidade à evidência

É tão difícil mudar a mente de um teórico da conspiração porque suas teorias são autolacradas. Mesmo a ausência de evidência para uma teoria se torna evidência para a teoria: a razão pela qual não há prova da conspiração é porque os conspiradores fizeram um trabalho muito bom encobrindo-a.

7) Reinterpretação da aleatoriedade

Os teóricos da conspiração veem padrões em todos os lugares – eles são todos sobre como conectar os pontos. Eventos aleatórios são reinterpretados como causados ​​pela conspiração e tecidos em um padrão mais amplo e interconectado. Quaisquer conexões são imbuídas de significado sinistro.

Por exemplo, o vídeo Plandemic aponta sugestivamente para o financiamento dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA (NIH) destinado ao Instituto de Virologia de Wuhan, na China. Isso apesar do fato de o laboratório ser apenas um dos muitos colaboradores internacionais de um projeto que procurou examinar o risco de futuros vírus emergirem da vida selvagem.

O pensamento crítico é o antídoto

Conforme exploramos em nossos “Conspiracy Theory Handbook” e “How to Spot Covid-19 Conspiracy Theories”, há uma variedade de estratégias que você pode usar em resposta às teorias da conspiração.

Uma abordagem é inocular você e suas redes sociais, identificando e destacando as características do pensamento conspiratório. Outra abordagem é “capacitar cognitivamente” as pessoas, incentivando-as a pensar analiticamente. O antídoto para o pensamento conspiratório é o pensamento crítico, que envolve um ceticismo saudável das narrativas oficiais, considerando cuidadosamente as evidências disponíveis.

Compreender e revelar as técnicas dos teóricos da conspiração é essencial para inocular você e os outros de serem enganados, especialmente quando somos mais vulneráveis: em tempos de crise e incerteza.

 

* John Cook é professor assistente de Pesquisa do Centro de Comunicação sobre Mudanças Climáticas da Universidade George Mason (EUA); Sander van der Linden é diretor do Laboratório de Decisão Social da Universidade de Cambridge (Reino Unido); Stephan Lewandowsky é catedrático de Psicologia Cognitiva, Universidade de Bristol; Ullrich Ecker é professor associado de Ciência Cognitiva da Universidade da Austrália Ocidental.

** Este artigo foi republicado do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original aqui.