Para os velhos hippies, viajar era mais do que expansão cultural ou deleite de férias: era uma escola de vida. Havia gente que pensava seriamente em viver viajando, sustentando-se com trabalhos periódicos, sempre em movimento, sem lançar raízes, pulando de um país para outro, conhecendo culturas e paisagens. A escola da estrada parecia mais atraente do que a rotina previsível de estudar, trabalhar, adquirir casa própria e criar família.

Esse tempo de excessos e delírios já passou, mas, naqueles anos, viajar não se resumia a ir a Buenos Aires ou passar o Carnaval em Salvador. Pressupunha aventuras, destinos inusitados, ver o que poucos viam. Podia ser o Khyber Pass, no Afeganistão, o mar turquesa de Samoa ou a Floresta Amazônica, mas precisava ser raro. Dava trabalho, porém a fruição era única e exclusiva. “Fulano atravessou o Saara com os tuaregues”, dizia-se, com admiração. As culturas fora do circuito Elizabeth Arden (Paris-Londres-Nova York-Roma) eram muito mais valorizadas.

O repórter Arthur Simões foi a um desses países de sonho, que até os velhos hippies desconheciam, e voltou com a bela reportagem que a PLANETA publica na página 52. O Iêmen, no sul da Península Arábica, foi esquecido pelo mundo durante séculos e, com o tempo, “também se esqueceu do resto do mundo”. Com os ventos democráticos da Primavera Árabe, o país começou a se abrir (o que implica riscos para a sua cultura), deslumbrando os visitantes, que descobrem, a cada esquina, a cada olhar, ecos da mitologia das Mil e Uma Noites.

As ruas labirínticas da capital, Sanaa, têm 2,5 mil anos. O povo é ingênuo, afável, hospitaleiro e gosta dos turistas. É fácil ser convidado para visitar uma casa para mascar a sociável folha do qat. A criminalidade é perto de zero. Nas ruas, misturam-se mulheres de burcas negras com lojas de lingerie.

Contraditório, pobre e desértico, o Iêmen oferece um panorama anterior à padronização e um empório inesgotável de histórias singulares – reais, não virtuais. Conheça o que estiver ao seu alcance, leitor, enquanto for possível.

Ricardo Arnt – Diretor de Redação

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