09/06/2020 - 11:49
Pela primeira vez, arqueólogos conseguiram mapear uma cidade romana completa, Falerii Novi (Nova Falérios), na Itália, usando um radar avançado de penetração no solo, ou georradar (GPR). O aparelho permite que sejam revelados detalhes surpreendentes dessas estruturas mesmo enquanto elas permanecem enterradas. A tecnologia pode revolucionar a nossa compreensão de antigos assentamentos.
A equipe, da Universidade de Cambridge (Reino Unido) e da Universidade de Ghent (Bélgica), descobriu um complexo de termas, mercado, templo, um monumento público diferente de tudo o que já fora visto antes. Até mesmo a ampla rede de tubulações de água da cidade foi mapeada. Ao olharem para diferentes profundidades, os arqueólogos agora podem estudar como a cidade evoluiu ao longo de centenas de anos.
A pesquisa, publicada na revista “Antiquity”, aproveitou os recentes avanços na tecnologia GPR, que possibilitam explorar áreas maiores em maior resolução do que nunca. É provável que isso tenha implicações importantes para o estudo das cidades antigas. Muitas delas não podem ser escavadas por serem muito grandes ou estarem sob estruturas modernas.
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O GPR funciona como um radar regular. Ele reflete ondas de rádio sobre objetos e usa o eco para criar uma imagem em diferentes profundidades. Ao rebocarem seus instrumentos GPR atrás de um quadriciclo, os arqueólogos pesquisaram todos os 30,5 hectares dentro das muralhas da cidade (Falerii Novi tinha pouco menos da metade do tamanho de Pompeia), fazendo uma leitura a cada 12,5 centímetros.
Roubo de pedras
Localizada 50 quilômetros ao norte de Roma e ocupada pela primeira vez em 241 a.C., Falerii Novi sobreviveu até cerca de 700 d.C. Os dados de GPR da equipe agora podem começar a revelar algumas das mudanças físicas experimentadas pela cidade nesse período. Eles já encontraram evidências de roubo de pedras.
O estudo também desafia certas suposições sobre o padrão urbano romano, mostrando que o desenho de Falerii Novi era menos padronizado do que muitas outras cidades bem estudadas, como Pompeia. O templo, a construção do mercado e o complexo de termas descobertos pela equipe também são mais arquitetonicamente elaborados do que seria normalmente esperado em uma cidade pequena.
Em um distrito do sul, perto das muralhas da cidade, o GPR revelou um grande edifício retangular conectado a uma série de tubulações de água que levavam ao aqueduto. Surpreendentemente, esses tubos podem ser traçados em grande parte de Falerii Novi, passando por baixo de suas ínsulas (prédios em andares da cidade), e não apenas ao longo de suas ruas, como seria de se esperar. A equipe acredita que essa estrutura era uma piscina ao ar livre, parte de um complexo de termas públicas.
Ainda mais inesperadamente, perto do portão norte da cidade, a equipe identificou um par de grandes estruturas de frente uma para a outra dentro de um pórtico duplex (uma passagem coberta com fileira central de colunas). Considera-se que elas faziam parte de um impressionante monumento público e ajudavam a compor uma intrigante paisagem sagrada nos limites da cidade.
Muito a aprender
Martin Millett, professor da Universidade de Cambridge e coautor do artigo, disse: “O nível assombroso de detalhes que alcançamos em Falerii Novi e os recursos surpreendentes que o GPR revelou sugerem que esse tipo de pesquisa pode transformar a maneira como os arqueólogos investigam os locais urbanos, como entidades totais”.
Millett e seus colegas já usaram o GPR para pesquisar Interamna Lirenas, na Itália e, em menor escala, Alborough, em North Yorkshire (Reino Unido). Agora, esperam ver a tecnologia empregada em sítios muito maiores.
“É emocionante, e agora realista, imaginar o GPR sendo usado para pesquisar uma grande cidade como Mileto, na Turquia, Nicópolis na Grécia, ou Cirene, na Líbia”, disse Millett. “Ainda temos muito a aprender sobre a vida urbana romana, e essa tecnologia deve abrir oportunidades sem precedentes nas próximas décadas.”
A enorme riqueza de dados produzida por esse mapeamento de alta resolução, no entanto, apresenta desafios significativos. Os métodos tradicionais de análise manual de dados consomem muito tempo, exigindo cerca de 20 horas para documentar completamente um único hectare. Levará algum tempo até que os pesquisadores terminem de examinar Falerii Novi. Para acelerar o processo, no entanto, eles estão desenvolvendo novas técnicas automatizadas.
Falerii Novi está bem documentada no registro histórico, não é coberta por edifícios modernos e foi objeto de décadas de análise usando outras técnicas não invasivas, como a magnetometria. Mas a imagem revelada pelo GPR agora é muito mais completa.