04/09/2020 - 9:48
Uma equipe de astrônomos identificou a primeira evidência direta de que grupos de estrelas podem separar seu disco formador de planetas, deixando-o deformado e com anéis inclinados. A nova pesquisa sugere que planetas exóticos, não muito diferentes de Tatooine em Guerra nas Estrelas, podem se formar em anéis inclinados em discos dobrados ao redor de várias estrelas.
Os resultados foram possíveis graças às observações com o Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO) e o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA). O trabalho foi publicado na revista “Science”.
No Sistema Solar, todos os planetas orbitam no mesmo plano. Mas nem sempre é o caso, especialmente para discos formadores de planetas em torno de estrelas múltiplas. É aqui que entra o objeto do novo estudo: GW Orionis. Esse sistema, localizado a pouco mais de 1.300 anos-luz de distância na constelação de Órion, tem três estrelas e um disco deformado e quebrado ao seu redor.
“Nossas imagens revelam um caso extremo em que o disco não é plano, mas está empenado e tem um anel desalinhado que se soltou do disco”, afirmou Stefan Kraus, professor de astrofísica da Universidade de Exeter, no Reino Unido, que liderou a pesquisa. O anel desalinhado está localizado na parte interna do disco, próximo às três estrelas.
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População desconhecida
A nova pesquisa também revela que esse anel interno contém 30 massas terrestres de poeira. É um volume suficiente para formar planetas. “Todos os planetas formados dentro do anel desalinhado orbitarão a estrela em órbitas altamente oblíquas. Prevemos que muitos planetas em órbitas oblíquas de grande separação serão descobertos em futuras campanhas de imagens de planetas, por exemplo, com o ELT”, disse o membro da equipe Alexander Kreplin, da Universidade de Exeter. Kreplin se referia ao Extremely Large Telescope do ESO, que deverá começar a operar no final desta década.
Como mais da metade das estrelas no céu nascem com uma ou mais companheiras, isso levanta uma perspectiva empolgante: pode haver uma população desconhecida de exoplanetas que orbitam suas estrelas em órbitas muito inclinadas e distantes.
Para chegar a essas conclusões, a equipe observou GW Orionis por mais de 11 anos. A partir de 2008, eles usaram os instrumentos AMBER e posteriormente GRAVITY no interferômetro VLT do ESO no Chile, que combina a luz de diferentes telescópios do VLT, para estudar a dança gravitacional das três estrelas do sistema e mapear suas órbitas. “Descobrimos que as três estrelas não orbitam no mesmo plano, mas suas órbitas estão desalinhadas entre si e com respeito ao disco”, disse Alison Young, das Universidades de Exeter e Leicester (também no Reino Unido) e membro da equipe.
Sombra projetada
Eles também observaram o sistema com o instrumento SPHERE no VLT do ESO e com o ALMA, do qual o ESO é parceiro. Com esses recursos, conseguiram fazer a imagem do anel interno e confirmar seu desalinhamento. O SPHERE também lhes permitiu ver, pela primeira vez, a sombra que esse anel projeta no resto do disco. Isso os ajudou a descobrir a forma tridimensional do anel e do disco em geral.
A equipe internacional, que inclui pesquisadores de Reino Unido, Bélgica, Chile, França e Estados Unidos, combinou suas observações exaustivas com simulações de computador para entender o que havia acontecido com o sistema. Pela primeira vez, eles conseguiram vincular claramente os desalinhamentos observados ao “efeito de ruptura do disco” teórico. Isso sugere que a atração gravitacional conflitante de estrelas em planos diferentes pode deformar e quebrar seus discos.
Suas simulações mostraram que o desalinhamento nas órbitas das três estrelas poderia fazer com que o disco ao redor delas se dividisse em anéis distintos. É exatamente o que os astrônomos veem em suas observações. A forma observada do anel interno também corresponde às previsões de simulações numéricas sobre como o disco se rasgaria.
Ingrediente adicional
Segundo outra equipe que estudou o mesmo sistema usando o ALMA, um ingrediente adicional é necessário para entender o sistema. “Achamos que a presença de um planeta entre esses anéis é necessária para explicar por que o disco se partiu”, disse Jiaqing Bi, da Universidade de Victoria, no Canadá. Bi liderou um estudo do GW Orionis publicado no “The Astrophysical Journal Letters” em maio deste ano. Sua equipe identificou três anéis de poeira nas observações do ALMA. O anel mais externo, aliás, é o maior já observado em discos formadores de planetas.
Observações futuras com o ELT do ESO e outros telescópios poderão ajudar os astrônomos a desvendar totalmente a natureza do GW Orionis. Com isso, deverão revelar jovens planetas se formando em torno de suas três estrelas.