Icebergs artificiais

1. Plataforma de bombeamento (movida a energia eólica): aspira a água do mar em profundidade, nebulizando-a.

2. A água nebulizada (salgada) se congela ao redor da plataforma.

3. A operação prossegue até que o iceberg em formação atinja a espessura de 7,5 metros.

4. Na primavera, as ilhotas se dissolvem, pondo água fria e salgada em circulação.

5. Jatos de água salgada são esguichados para facilitar o derretimento do gelo.

Neste início de ano eleitoral nos Estados Unidos, tanto na pauta dos candidatos democratas quanto republicanos à Presidência da  República constam promessas consistentes para os necessários cortes de emissão de CO2 e outros gases de efeito estufa na atmosfera. De outro lado, ainda haverá muita discussão sobre os limites de emissões desses gases para os países em desenvolvimento – algo que, em princípio, não agrada à China, à Índia e ao Brasil. Portanto, até a Conferência sobre o Aquecimento Global de Copenhague, em 2009, a indefinição sobre o que fazer diante desse problema provavelmente ainda vai ser a tônica.

ILHAS ARTIFICIAIS DE GELO

Graças à Corrente do Golfo, o norte da Europa tem um clima muito mais ameno do que faria supor a sua latitude. Verdadeiro rio de águas quentes dentro do mar, ele atravessa todo o Atlântico e, ao se aproximar do Círculo Polar Ártico, suas águas esfriam e se dirigem para as profundezas. A descida em profundidade das águas esfriadas é provocada em grande parte pela sua maior densidade, devida também ao sal dissolvido que a torna mais “pesada”. Esse mecanismo, vital para o clima e para a ecologia ambiental da região, poderia emperrar caso o derretimento das geleiras da Groenlândia fizesse entrar muita água doce no sistema. As conseqüências seriam catastróficas para o clima da Europa, que esfriaria de modo significativo, podendo entrar num novo ciclo glacial.

Peter Flynn e Songlian Zhou, pesquisadores da Universidade de Alberta, no Canadá, estudaram um sistema para dar maior vigor a essa “bomba de calor” oceânica. Entre a Groenlândia e a Islândia seriam instaladas 8.100 ilhotas flutuantes, dotadas de bombas para vaporizar a água do mar: durante o inverno, quando a temperatura média é de -10o centígrados, a água nebulizada congelaria, formando pequenos icebergs artificiais.

Na primavera, esses icebergs derreteriam gradualmente, jogando no mar água fria e salgada que empurraria para as profundezas as águas da corrente norte-atlântica. O custo da operação é estimado em US$ 50 bilhões.

Enquanto isso, é claro, a natureza não vai esperar para aprofundar as conseqüências do efeito estufa. Não é impossível que a situação do clima chegue rapidamente a um ponto extremo e a ortodoxia científica ceda espaço para soluções de geoengenharia tecnologicamente muito ousadas. Diversos pesquisadores nessa área já pensam em idéias no mínimo arrojadas para manter a Terra como um lugar aprazível para se viver.

De acordo com relatório do Painel Internacional de Mudanças Climáticas, divulgado em 2007, são cogitadas basicamente três técnicas para reduzir os efeitos da luz solar sobre a Terra: espelhos em órbita, métodos que envolvem partículas de enxofre e projetos para aumentar a camada de nuvens. Essas propostas “teriam conseqüências benéficas” ao aumentar a produtividade agrícola e florestal, dizem os cientistas que participaram da iniciativa. O dióxido de carbono (CO2) seria deixado na atmosfera, estimulando o crescimento das plantas, enquanto a redução na luz solar não permitiria que as temperaturas subissem mesmo que os níveis desse gás continuassem a aumentar.

A oposição científica a esses métodos é considerável e gira em torno de um conceito: se foi a tecnologia que levou a humanidade a esse ponto crítico, por que deveríamos apostar todas as nossas fichas nela para salvar a Terra? Ninguém, de fato, é capaz de prever com 100% de certeza se as técnicas de geoengenharia vão funcionar – mas, se o quadro geral engrossar, é bem possível que conheçamos seu grau de eficiência na base do desespero. Como afirma o cientista britânico James Lovelock, um dos criadores da Teoria de Gaia, há riscos nessas intervenções na natureza, mas os riscos são maiores se não se fizer nada.

Conheça a seguir idéias de geoengenharia que estão em discussão nos meios científicos. Algumas delas, inclusive, já chegaram à fase de testes.

Plâncton marinho

Composto de microanimais e vegetais, o plâncton marinho é um dos maiores seqüestradores de gases que produzem o efeito estufa. O homem produz 6,1 milhões de toneladas de CO2 ao ano, 1/3 do qual se dissolve nas águas dos oceanos.

1. Fertilizantes à base de sulfato de ferro são jogados dos navios ao mar.

2. Graças ao ferro, o fitoplâncton cresce rapidamente, absorvendo mais gás carbônico dissolvido na água.

3. O zooplâncton devora as algas microscópicas: o CO2 entra no ciclo alimentar.

4. Toda essa atividade biológica gera uma enorme massa de excrementos e de organismos mortos que desce para o fundo do mar.

5. Nas profundezas, sobre o solo marinho, se consolida um estrato de sedimentos que é, na realidade, um depósito natural de carbono.

A salpa comedora de carbono

Como seqüestrar quatro mil toneladas de gás carbônico ao dia? Basta deixar que um animalzinho marinho, a Salpaaspera, faça o seu trabalho. A salpa (na foto) é um invertebrado longo de três centímetros, superguloso de fitoplâncton e que possui duas características muito interessantes: primeiro, não entra na cadeia alimentar de predadores (nenhum outro animal o come). Segundo, seus dejetos, carregados de gás carbônico afundam a uma velocidade de um quilômetro por dia. Perfeitos, portanto, para estocar grandes quantidades de CO2 nas profundezas do mar. Isso é o que afirmam Laurence Madin, do Instituto Oceanográfico de Wood Hole, e Patrícia Kremer, da Universidade de Connecticut (EUA). Ambos dizem ser possível modificar geneticamente a salpa para torná-la ainda mais eficiente na tarefa de seqüestrar carbono do mar.

Florestas marinhas

Nos oceanos, o papel das árvores na absorção de carbono é representado pelas algas e pelo plâncton. Esses organismos capturam o gás carbônico e, quando morrem, afundam para o leito oceânico, levando consigo o CO2 absorvido – que, assim, ficaria retido lá por milênios.

O plano lançado durante um encontro recente do Woods Hole Oceanographic Institute, dos Estados Unidos, é incentivar a proliferação desses seres, por meio de fertilizantes com ferro. Já se sabe que a presença de minúsculas quantidades de ferro representa um enorme impulso para o crescimento da população de fitoplâncton. Em diversas regiões marinhas, porém, a quantidade de ferro na água está próxima de zero, e os níveis de plâncton acompanham essa escassez.

Para contornar isso, já existe um número significativo de experimentos norte-americanos nos quais toneladas de composto de ferro solúvel são bombeadas para regiões oceânicas carentes do metal. Ainda não há dados conclusivos a respeito dessas tentativas. Enquanto isso, os críticos têm duas ressalvas sérias ao plano: o volume de seqüestro de carbono da atmosfera seria reduzido e há um risco considerável de poluição marinha.

Flora invisível

O biólogo marinho Paul Falkowski, da Universidade Rutgers de New Brunswick (EUA), refere-se ao fitoplâncton – o conjunto de microorganismos que habitam os mares – como sendo uma “floresta invisível”: uma floresta que, hoje, poderia ser usada para armazenar grandes quantidades de CO2, o principal gás responsável pelo superaquecimento do planeta. Bastaria fertilizar com ferro as zonas do oceano chamadas High Nutrient, Low Chlorophyll (HNLC), zonas de alta concentração de nutrientes e baixa concentração de clorofila.

Essas zonas constituem áreas marinhas “desérticas”, porém muito férteis, às quais falta apenas o ferro (necessário para a fotossíntese) para se tornarem “bombas verdes”. De modo análogo a quando se plantam árvores, fazer crescer organismos vegetais no mar possibilita a fixação do carbono em estruturas sólidas (conchas, rochas, etc.), reduzindo a quantidade desse gás na atmosfera.

Lançando compostos de enxofre na atmosfera é possível criar um escudo que atenua a incidência dos raios solares.

1. O enxofre é comprimido e armazenado em cilindros na forma de hidrogênio sulfurado.

2. Balões aerostáticos transportam os cilindros a 20 quilômetros de altura.

3. O hidrogênio sulfurado reage com os gases da atmosfera (ver esquema, abaixo).

a. Hidrogênio sulfurado

b. Oxigênio

c. Dióxido de enxofre

d. Molécula de água

4. Forma-se um escudo de aerossóis capaz de refletir parte dos raios.

Escudo espacial de enxofre

Grandes erupções vulcânicas despejam tantas partículas na atmosfera que as nuvens resultantes provocam um significativo resfriamento da temperatura. Durante a erupção do vulcão Pinatubo, nas Filipinas, em 1991, dez milhões de toneladas de enxofre foram lançadas na estratosfera, causando uma queda média de 0,6º centígrados da temperatura no planeta. A idéia do professor Paul Crutzen, vencedor do Prêmio Nobel de 1995 por seu trabalho sobre a formação e a deterioração da camada de ozônio na atmosfera, é imitar o Pinatubo, criando uma “manta” de enxofre que barraria a passagem dos raios solares. Esse efeito seria obtido graças ao envio para a estratosfera de foguetes carregados com enxofre: eles explodiriam ali, liberando cerca de um milhão de toneladas do gás para o surgimento dessa nuvem sulfúrica.

Para outros cientistas, a idéia pode ser eficiente para bloquear os raios do Sol, mas é muito ruim sob outros aspectos. Ela pode, por exemplo, aumentar a chuva ácida (a precipitação contaminada com poluentes derivados da queima de combustíveis fósseis, como ácido nítrico e ácido sulfúrico) ou danificar a camada de ozônio. Crutzen admite o risco, entretanto salienta que a sua proposta somente entraria em cena se o nosso planeta continuar esquentando no ritmo atual.

1. Da terra, 20 milhões de contenidores são lançados ao espaço. Cada um deles transporta 800 mil discos perfurados.

2. Ao chegar ao ponto estabelecido, os contenidores liberam os discos.

3. No espaço, os discos, com diâmetro de 60 centímetros cada um, são dispostos de modo a formar uma gigantesca tela solar.

4. A tela é capaz de desviar a luz do Sol.

Espelhos espaciais

Outra proposta para evitar que os raios solares venham a causar mais aquecimento na superfície da Terra vem do físico Lowell Wood, do Lawrence Livermore National Laboratory, da Califórnia (EUA): lançar ao espaço enormes e finíssimas telas de alumínio, que serviriam para bloquear parcialmente a luz solar e filtrar a radiação infravermelha.

Os cálculos indicam que, uma vez no espaço, seria muito simples operar esses aparelhos. O problema maior é o custo absurdo para colocá-los lá: para conseguir um corte de 1% na radiação solar, seria necessário produzir telas com áreas de mais de 1,5 milhão de quilômetros quadrados (não se conhece nenhum fabricante capaz disso hoje) e transportá-las até a altitude desejada.

Bombas de sucção

Patrocinada por James Lovelock e Chris Rapley, diretor do Museu de Ciência em Londres (Inglaterra), essa proposta envolve a implantação de longuíssimos tubos verticais flutuantes que bombeariam a água fria das profundezas para a superfície oceânica. Rapley explicou na revista cientifica Nature que, como a água do fundo do mar é considerada mais “produtiva” do que a água mais quente, por conter mais formas de vida, a empreitada serviria para fertilizar as algas que absorvem CO2 e, depois de morrer, vão para o fundo do mar.

A sugestão está sendo testada pela empresa Atmocean, cujo diretor, Phil Kithil, calcula que em torno de 134 milhões de tubos como esses poderiam seqüestrar mais de 30% do CO2 produzido anualmente pelos humanos. Mas, segundo diversos biólogos marinhos, o plano impõe pesados riscos a animais, como baleias e golfinhos.

Sem tripulação e controlados por satélites artificiais, os navios lança-vapor seriam capazes de criar nuvens artificiais (estratos-cúmulos marinhos).

1. Os navios absorvem água do oceano graças à energia eólica e do mar.

2. A água aspirada passa por um processo de vaporização e é lançada em direção ao céu.

3. O vapor reforça as nuvens, que por sua vez refletem os raios solares de volta para o espaço, esfriando o planeta.

Escudo de nuvens

Mais uma idéia na linha de proteger-se do Sol com nuvens vem dos cientistas John Latham, do National Centre for Atmospheric Research, no Colorado, e Stephen Salter, da Universidade de Edimburgo. Sua sugestão é aumentar a cobertura de nuvens borrifando água do mar nelas. Segundo os pesquisadores, com essas providências o incremento de nuvens seria da ordem de 4%, suficiente para evitar a duplicação da quantidade de CO2 na atmosfera.

Diferentemente de outros projetos nessa área, esse não envolve grandes custos nem sofisticadíssimos aparatos tecnológicos. Se passar pela fase de simulações em computador, poderá fazer uma estréia experimental daqui a uns cinco anos. Mas, naturalmente, teria efeitos colaterais, e o principal deles, segundo Latham, seria alterar padrões climáticos em todo o planeta. Mas ele mesmo reconhece que a estratégia só pode ser aplicada se trouxer menos perigo do que os danos que o aquecimento global está causando.