14/01/2021 - 10:34
Uma equipe de arqueólogos da Universidade Griffith (Austrália) compartilhou a descoberta do que pode ser a pintura rupestre mais antiga do mundo, datada de pelo menos 45.500 anos atrás. Descoberta no sul da ilha de Sulawesi (Indonésia) durante uma pesquisa de campo conduzida com o principal centro de pesquisa arqueológica indonésio, Pusat Penelitian Arkeologi Nasional (Arkenas), a pintura rupestre consiste em uma representação figurativa de um porco verrugoso (tipo de javali) de Sulawesi, endêmico dessa ilha. A descoberta foi abordada em estudo publicado na revista “Science Advances”.
“A pintura de porco verrugoso de Sulawesi que encontramos na caverna de calcário de Leang Tedongnge é agora a mais antiga obra de arte representacional conhecida no mundo, tanto quanto sabemos”, disse o professor Adam Brumm, do Centro de Pesquisa Australiano para Evolução Humana da Universidade Griffith, colíder da equipe Griffith-Arkenas.
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“A caverna fica em um vale cercado por penhascos de calcário íngremes. Ela só é acessível por uma passagem estreita na estação seca, pois o fundo do vale fica completamente inundado com a chuva. A comunidade Bugis que vive nesse vale escondido afirma que nunca antes tinha sido visitada por ocidentais.”
Animais bastante retratados
A pintura do javali de Sulawesi datada de pelo menos 45.500 anos atrás é parte de um painel de arte rupestre localizado acima de uma saliência alta ao longo da parede posterior de Leang Tedongnge.
“Ela mostra um porco com uma crista curta de pelos eretos e um par de verrugas faciais semelhantes a chifres na frente dos olhos, uma característica dos porcos verrugosos de Sulawesi machos adultos”, disse o professor Brumm. “Pintado com pigmento vermelho ocre, o porco parece estar observando uma briga ou interação social entre dois outros porcos verrugosos.”
“Os humanos caçaram porcos verrugosos de Sulawesi por dezenas de milhares de anos”, disse Basran Burhan, arqueólogo indonésio do sul de Sulawesi e atualmente doutorando da Universidade Griffith, líder da expedição que encontrou a arte rupestre. “Esses porcos eram os animais mais comumente retratados na arte rupestre da era do gelo da ilha, sugerindo que há muito são valorizados como alimento e um foco de pensamento criativo e expressão artística.”
O professor Maxime Aubert, colíder da equipe e especialista em datação do Center for Social and Cultural Research da Universidade Griffith, fez uma amostra da arte para datação em série de urânio, conduzida no Radiogenic Isotope Facility da Universidade de Queensland (Austrália).
Datação por urânio
“A arte rupestre é um grande desafio até hoje”, disse Aubert. “No entanto, a arte rupestre produzida em cavernas de calcário pode às vezes ser datada usando a análise da série de urânio de depósitos de carbonato de cálcio (‘pipoca de caverna’) que se formam naturalmente na superfície da parede da caverna, usada como uma ‘tela’ para a arte. Em Leang Tedongnge, uma pequena pipoca de caverna se formou na pata traseira de uma das figuras de porco depois que ela foi pintada. Portanto, quando datada, ela nos forneceu uma idade mínima para a pintura.”
Após uma cuidadosa remoção feita por Aubert, esse depósito mineral foi datado e produziu uma idade de 45.500 anos. Isso indica que a cena de arte rupestre havia sido pintada algum tempo antes disso.
Uma segunda imagem de porco verrugoso de Sulawesi, de Leang Balangajia 1, outra caverna na região, foi datada de pelo menos 32 mil anos atrás usando o método da série do urânio.
“Já datamos vários exemplos das primeiras artes rupestres em Sulawesi, incluindo representações de animais e cenas narrativas que se destacam tanto pela qualidade de sua execução quanto pela raridade em todo o mundo”, disse Aubert.
No aguardo de datação
“Cenas” reconhecíveis são especialmente incomuns na arte rupestre primitiva. A “cena” de arte rupestre anteriormente datada, com pelo menos 43.900 anos, era uma representação de seres humanos-animais híbridos caçando javalis e bovídeos anões de Sulawesi. Ela foi descoberta pela mesma equipe de pesquisa em uma caverna de calcário nas proximidades. Essa descoberta foi classificada pela revista “Science” como uma das dez maiores descobertas científicas de 2020.
“Encontramos e documentamos muitas imagens de arte rupestre em Sulawesi que ainda aguardam datação científica. Esperamos que a arte rupestre primitiva dessa ilha produza descobertas ainda mais significativas”, disse Adhi Agus Oktaviana, coautor do estudo e especialista em arte rupestre da Indonésia, pesquisador do Arkenas e doutorando na Universidade Griffith.
A arte rupestre de Sulawesi agora representa algumas das primeiras evidências arqueológicas (senão a primeira) de humanos modernos na vasta zona de ilhas oceânicas localizadas entre a Ásia e a Austrália-Nova Guiné. Essa região é conhecida como “Wallacea”.
Ilhas mal exploradas
“Nossa espécie deve ter atravessado Wallacea em embarcações para chegar à Austrália há pelo menos 65 mil anos”, disse Aubert. “No entanto, as ilhas da Wallacea são mal exploradas e, atualmente, as primeiras evidências arqueológicas escavadas nessa região são muito mais jovens.”
A equipe de Griffith espera que pesquisas futuras no leste da Indonésia levem à descoberta de arte rupestre muito mais antiga e outras evidências arqueológicas, datando de pelo menos 65 mil anos e possivelmente antes.
“Esta descoberta destaca a notável antiguidade da arte rupestre da Indonésia e seu grande significado para a compreensão da história da arte em tempos profundos e seu papel na história inicial da humanidade”, disse Adam Brumm.