Quais são as causas do sofrimento? O budismo ensina que existem três venenos principais dos quais dependem os sofrimentos da humanidade. São eles: o apego, a ignorância da lei de causa e efeito, e o Q ódio e os rancores. Desses três venenos, o apego é o pior. Ele merece alguns esclarecimentos para não ser confundido com o afeto ou o amor. Com efeito, freqüentemente ouvimos alguém dizer que é apegado a uma pessoa e que isso se deve ao grande amor que sente por ela.

A prova de fogo para se determinar se aquilo que sentimos é amor verdadeiro ou apenas um mero apego é muito simples: basta examinarmos o que essa relação traz para nós mesmos e para a outra pessoa. O verdadeiro amor traz felicidade e alegria a ambos. Se isso não acontece, não se trata de amor verdadeiro. O amor verdadeiro não corre atrás da sua própria satisfação e felicidade, e sim das da pessoa amada.

Como afirmou Paramahansa Yogananda: “Quando vocês pararem de querer encher a própria taça de felicidade, e começarem a encher a dos outros, descobrirão, com espanto e alegria, que a taça de vocês está sempre cheia.”

O apego é a causa real de muitos sofrimentos. Lutamos para obter um objeto ou uma pessoa, e isso é causa de sofrimento. Depois, logo após termos obtido esse objeto ou pessoa, começamos a nos preocupar por medo de perdê-los.

Podemos ainda ser apegados a situações ou ao nosso corpo, e ambas as coisas são causa de sofrimento. O medo de morrer é causa de muito sofrimento, pois a mente acha que sem o corpo estará perdida. Também aqui está em jogo o apego.

Nesse caso, no entanto, ele é coadjuvado pela ignorância das leis da vida. Enfim, é fácil verificar que todos os males do mundo, as guerras inclusive, possuem como causa principal pelo menos um dos três venenos primários: apego, ódio e ignorância.

Não somente os seres humanos, mas todas as criaturas vivas, inclusive OS INSETOS, procuram maneiras de evitar o sofrimento

A ignorância da lei de causa e efeito, por seu lado, é a coisa mais perigosa que existe. Não saber que nosso sofrimento nasce das nossas ações não-virtuosas não nos permite tomar a decisão de mudar nossas atitudes e posturas com a força necessária para fazê-lo realmente.

Com a meditação é possível adquirir o controle da mente e, em conseqüência, a paz interior. Essa é a principal razão para se praticar uma técnica de meditação. Todos nós buscamos a felicidade e, ao mesmo tempo, queremos evitar o sofrimento.

Quando conquistamos a paz interior, atingimos uma postura existencial muito mais eficaz para a satisfação dessas nossas exigências.

Não apenas os seres humanos, mas todas as criaturas, inclusive os insetos, procuram meios de evitar o sofrimento. O homem é a única criatura que, com o uso da razão, pode adquirir e praticar técnicas para buscar conscientemente o controle mental. Para que tenhamos uma vida sem sofrimento, devemos cortar pela raiz as causas que o provocam.

NOSSO INTELECTO nos possibilita discriminar tudo aquilo que em nós é bom e tudo aquilo que é mau, assim como evitar todas as ações que, por não serem virtuosas, criam causas cujos efeitos serão sentidos por nós como sofrimentos.

A felicidade não chega sozinha. Podemos esperar por ela durante anos, mas ela apenas chegará quando passarmos seriamente a seguir o modo justo de agir. Esse modo justo de agir nos foi apresentado pelos grandes mestres e constitui a base de todas as grandes religiões.

Quando postos em prática na vida cotidiana, os ensinamentos deixados por Buda e por Cristo, por exemplo, são capazes de cortar as raízes do sofrimento. Mas essa prática em geral não é fácil, e é necessário manter o controle mental para evitar que a nossa parte instintiva nos cegue com as suas exigências egoísticas.

Os ensinamentos dos mestres são sementes. Não podemos pretender saborear seus frutos se antes não plantarmos a semente, cuidarmos da planta que cresce até que ela esteja em condições de nos pagar pelo trabalho. Da mesma forma, os ensinamentos, se vividos dia após dia, no devido tempo, não deixarão de produzir em nós aquelas transformações mentais que nos levarão a agir de um modo diverso. Um modo que nos permitirá evitar a prática de ações não-virtuosas, cujos efeitos são os sofrimentos.

MEDITAÇÃO

Chave-mestra do controle mental

A meditação se destina a fazer com que a mente permaneça sob nosso controle. Desse controle nascerá em seguida a capacidade de pensar apenas pensamentos positivos e construtivos. Quando na nossa mente não mais existir espaço para pensamentos negativos e destrutivos, teremos alcançado a paz interior.

A técnica que será exposta a seguir oferece algumas sugestões sobre a posição que se deve assumir durante a meditação. Ela será praticada de preferência sentada. Sugerem-se as posições básicas da ioga, a do lótus ou a do meio lótus (com as pernas cruzadas), mas o que importa não é tanto a posição física quanto a constância das execuções e o propósito de aprender a meditar não apenas por finalidades egoísticas, mas para que aquilo que aprendermos possa nos ser útil para ajudar outras pessoas que estejam necessitando.

Uma coisa importante é a posição da espinha dorsal, que deve permanecer ereta o máximo possível. Essa posição, na verdade, permite que o ar e o prana (energia vital) possam circular livremente nos vários centros energéticos do corpo.

As mãos são colocadas sobre o colo de maneira que a esquerda abrace a direita. Os dedos das mãos, com exceção dos polegares, devem se sobrepor, enquanto os polegares devem permanecer unidos, formando um círculo com as mãos sobrepostas. É bom ressaltar aqui que, como a mão esquerda é símbolo da sabedoria e a direita simboliza o método e a ação, o método e a ação devem estar sempre cercados pela sabedoria.

A cabeça deve ser mantida ligeiramente inclinada para a frente para se evitar que o sangue chegue a ela com excessiva facilidade e possa criar problemas, uma vez que a atividade cerebral é muito reduzida.

As costas são mantidas abertas, e isso é símbolo da abertura àquilo que estamos aprendendo e a todas as sugestões que nosso guia interior desejará nos propor. A boca se mantém fechada, com a língua apoiada sobre os dentes superiores – essa sugestão é para se evitar que a boca fique seca por falta de saliva.

Os olhos necessitam de uma atenção particular. Sua posição é altamente subjetiva, na medida em que existem pessoas que caem na sonolência quando fecham os olhos, e outras pessoas que, com os olhos abertos, se deixam distrair pelas imagens que o ambiente ao redor delas oferece. Sugere-se manter os olhos semi-abertos e olhar a ponta do nariz. Isso costuma evitar os inconvenientes citados.

A postura adquire muita importância para as pessoas que meditam continuamente, às vezes por dias e dias. Para nós, a coisa mais importante é a escolha de uma posição que não perturbe a mente. A mente, no início da prática da meditação, costuma se mostrar teimosa como um animal selvagem.

Como nosso objetivo é controlar nossa mente, melhor evitar a criação de mais obstáculos ao assumir uma posição que para nós não é natural e que, assim sendo, fatalmente se transformará em mais uma fonte de distúrbio mental.

No início, a meditação consiste em levar (e manter) nossa atenção à raiz do nariz e a contar os ciclos da respiração. Cada inspiração/expiração vale um ciclo. A respiração deve ser normal. Devemos simplesmente observá-la, e não alterá-la.

Pode ser útil, especialmente no início, contar até seis e depois recomeçar do um. Isso leva a uma pequena variação sobre o tema e representa uma diversão para a mente, da qual ela é sempre muito desejosa. Mais tarde se poderá aumentar a contagem, indo-se até dez ou 15 ciclos. O objetivo a ser alcançado com o tempo poderia ser fixado em 25 ciclos.

Quatro erros a serem ser evitados:

1 – Inspiração longa seguida de uma curta.

2 – Respiração forçada com emissão de sons que até outras pessoas podem ouvir.

3 – Erros na contagem.

4 – Desapontamento pelos erros cometidos. A mente deve ser guiada com calma e suavidade. Se errarmos na contagem, devemos recomeçar do zero.

É bom recordar que na meditação não existe apenas circulação de ar, mas que nela também entram em jogo energias sutis (prana) que partem do umbigo e sobem pela espinha dorsal até a cabeça. Essas energias passam por alguns centros energéticos sutis do corpo (chacras) e os estimulam, acarretando uma vitalidade renovada também no plano físico.

O tempo que devemos dedicar à meditação deve ser escolhido de modo a não perturbar a nossa rotina normal de vida. A duração de cada sessão deve ser decidida pelo discernimento de cada um dos participantes. É conveniente, no entanto, que ela seja praticada todos os dias, e de preferência sempre no mesmo horário. Não devemos esquecer que somos criaturas do hábito. O hábito de meditar é difícil de ser alcançado, mas, quando se consegue isso, sua manutenção é fácil, porque ele entrou na nossa ordem normal das coisas.

 

A TRANSFORMAÇÃO da nossa mente não deveria ser tentada com o único objetivo de melhorar nossa vida, mas também levando-se em consideração que tais melhorias se farão sentir também nas nossas próximas existências. Existe uma notável diferença entre quem segue os ensinamentos e quem não os segue.

Os primeiros costumam ser calmos e gentis e sabem enfrentar as contrariedades da vida de modo calmo e confiante, enquanto os segundos são irascíveis e tempestuosos e as suas soluções, embora às vezes se mostrem capazes de resolver um problema, via de regra fazem surgir um outro problema, reflexo do anterior.

O BEM e o MAL não trazem uma etiqueta que obrigue o mal de UMA BOFETADA a ser DESCONTADO com uma outra bofetada

Podemos pensar em alguém que, depois de uma vingança, sente-se satisfeito por ter praticado o mal contra aquele que ele acredita ser o seu inimigo, contudo não sabe que o mal que cometeu foi devidamente registrado na sua conta de créditos e débitos. Assim sendo, mais cedo ou mais tarde, esse mal lhe virá de retorno como sofrimento ou doença.

Numa discussão, a pessoa que adquiriu o controle mental consegue ser mais objetiva e avaliar os próprios erros, os quais geralmente nunca faltam. Essa atitude leva a pessoa a observar seu adversário com compreensão e misericórdia. Ela tem paciência e é capaz de tentar compreender as motivações da outra pessoa, evitando dessa forma agir de modo a criar causas cujos efeitos mais adiante se apresentarão como sofrimentos.

Todas as religiões, embora sendo diversas na apresentação da mesma essência, fornecem conselhos de vida para ajudar o seu seguidor a saber distinguir entre o verdadeiro bem e o verdadeiro mal.

Com essa ajuda e a do nosso discernimento, poderemos considerar como um verdadeiro bem aquilo que nos traz benefício e como verdadeiro mal aquilo que nos traz sofrimento.

A arte da conversação

“A palavra não dita é tua escrava. A palavra dita é tua senhora”, diz a sabedoria popular. A palavra é uma das principais causas de sofrimento, porque falar é muito fácil e a ignorância da lei de causa e efeito não nos deixa refletir e nos preocupar com aquilo que vamos dizendo por aí.

A língua do homem é a maior criadora de confusão e incompreensão. Não importa aquilo que dizemos, mas sim como e quando dizemos. Portanto, convém sempre medir nossas palavras com o metro da cortesia, do sentimento e da gratidão. Numa conversação, o interesse se baseia no tornar importante o nosso interlocutor. A maneira mais simples e eficaz de fazer isso é trocando as afirmações pelas perguntas.

Menos coisas dizemos e menos teremos de nos arrepender. A natureza sabia o que fazia quando nos deu duas orelhas e uma única língua. Uma única palavra, dita por uma língua incontrolada, pode destruir a felicidade de uma vida inteira. Algumas dicas para evitar a postura crítica, sarcástica ou irônica são: não criticar, reconhecer os méritos dos outros, reconhecer rapidamente os seus erros e nunca hesitar em pedir desculpas. Também tente sempre fechar um acordo o mais rápido possível, pois cada momento de atraso lançará mais lenha ao fogo da discórdia.

Para concluir, aqui está uma série de regras para uma conversa eficaz: olhe nos olhos de seu interlocutor, não o interrompa enquanto fala, seja um bom ouvinte, seja compreensivo, module o tom da sua voz, evite referências desagradáveis do passado, dê conselhos apenas quando são solicitados, elogie aquilo que o agrada e ignore aquilo que o desagrada, e cuide das suas palavras, e suas palavras cuidarão de você. S. L. Katzoff

Quando nos falta um guia que nos ilumine nos momentos em que temos de discriminar as coisas, corremos o risco de que nossa escolha seja ditada pelos nossos instintos animais, sempre prontos a se manifestar, ou pelo nosso egoísmo, sempre presente como resultado do nosso instinto de auto-sobrevivência.

O ensinamento mais importante de todas as religiões é o de sermos gentis, compreensivos e misericordiosos com todas as criaturas, homens, plantas e animais, inclusive os insetos. Esse modo de agir não é fácil e é preciso adquiri-lo por meio de um esforço constante, dia após dia, ano após ano.

Há pessoas que lêem muitos livros, fazem muitos cursos e escutam muitas conferências com a intenção de encontrar a paz interior e eliminar o sofrimento. Infelizmente, tudo aquilo que fazem não lhes trará nenhuma melhora, a não ser que se esforcem para colocar em prática tudo que aprenderam intelectualmente.

SE CONSIDERARMOS a lei universal de causa e efeito, poderemos compreender que todos os sofrimentos que nos atingem são apenas “efeitos de ações não-virtuosas” por nós praticadas no passado recente ou remoto.

Se não modificarmos a nossa conduta, as nossas ações de hoje nos condenarão no futuro.

Existem pessoas que justificam todos os seus males afirmando que eles são conseqüência de más ações cometidas em alguma vida passada. Essas pessoas assumem uma atitude passiva, pensando que, de qualquer forma, não têm o poder de mudar circunstâncias já passadas. Essa postura é muito perigosa e denota falta de confiança na misericórdia divina. Não devemos esquecer nunca que nós podemos ser infiéis a Deus, mas Ele nunca o será em relação a nós.

No cosmos existe a lei do equilíbrio, e o bem que fizermos hoje pode muito bem exaurir o mal eventual que tivermos praticado no passado.

O bem e o mal não trazem uma etiqueta que obrigue, por exemplo, o mal de uma bofetada a ser descontado com uma outra bofetada. Todo mal produz sofrimento. Portanto, todas as ações que produzem felicidade constituem um antídoto para aquelas que trouxeram dor.

A mente deveria permanecer sempre alerta e controlar o nosso corpo e os nossos instintos. Estes últimos, exatamente pelo fato de serem destinados à sobrevivência do corpo físico, nos oferecem soluções quase sempre egoístas. Quando vemos um objeto (ou o imaginamos), ele é subitamente encarado com interesse ou com rejeição. Quase não existe uma apreciação pacata, na qual a mente observa e basta. A mente é colocada a serviço das paixões e disso nasce o desejo de possuir ou o temor de perder aquilo que se possui.

Quando a mente é educada adequadamente, os sentidos não conseguem agarrar e aprisionar a sua atenção. A mente educada observará qualquer objeto e saberá conferir a ele o seu valor efetivo, e não aquele que lhe é atribuído pela nossa interioridade.

Cada vez que estivermos diante de um objeto ou de uma pessoa e a mente não estiver em condições de discernir o seu valor efetivo, surgirá o desejo que nos levará a pensar que não poderemos viver sem aquele objeto. Essa é a causa daquilo que definimos como desilusão.

Não é o corpo que nos priva da paz mental, e sim a mente que, não sendo controlada, é influenciada pelas emoções e pelos sentimentos e acaba nos conduzindo a comportamentos errados. Para uma mente não-educada, a mesma situação pode se tornar objeto de desejo ou de medo e isso acarretará desilusões.

Francesco Giovannetti é psicoterapeuta e escritor na Itália.