Banhada pelas águas mais turquesas do Mediterrâneo, abençoada por um clima de eterna primavera, a Costa Amalfitana, na Itália, é um dos raros lugares do mundo que reúnem uma diversidade de belezas naturais e construídas pelo homem. Quando se conhecem os encantos desses cento e poucos quilômetros de litoral, entre as cidades de Salerno e Sorrento, fica fácil entender por que eles atraíram tantos visitantes ao longo da história. Muitos, totalmente seduzidos, não resistiram e ficaram.


A praia de Amalfi

Há muito tempo a Costa Amalfitana é morada de gente célebre: os escritores Gore Vidal, Victor Hugo, André Gide, D. H. Lawrence e Máximo Gorki, o poeta Giovanni Boccaccio, o romancista, cineasta e dramaturgo Jean Cocteau, o dramaturgo Henrik Ibsen, os compositores Richard Wagner e Edward Grieg, os artistas Pablo Picasso e M. C. Escher, os bailarinos Rudolf Nureyev e Léonide Massine, a atriz Greta Garbo, o cineasta Franco Zefirelli, a socialite Jacqueline Kennedy Onassis e até o revolucionário Vladimir Lênin são apenas alguns dos famosos às centenas que compraram casas por lá.

Esse fascínio vem de longe. Já nos tempos greco-romanos a Costa Amalfitana tinha fama de Jardim do Éden. Amalfi, uma das suas principais cidades, tem até origem mítica. Conta a tradição que o semideus grego Hércules apaixonou-se perdidamente pela ninfa Amalfi, mas seu amor foi curto. Assustada com os ímpetos sensuais do herói, a moça saiu correndo, caiu num precipício e morreu. Hércules decidiu sepultá-la no mais belo lugar do mundo e, para imortalizá-la, deu a esse lugar o seu nome.


O terraço da Villa Cimbrone, em Ravello, que encantou Gore Vidal

O navegador Ulisses também passou pela Costa Amalfitana naquela época. Teria sido lá que ele e seus marinheiros ouviram o canto sedutor das sereias que atraíam os homens para o fundo do mar. Depois, nos tempos históricos, vários povos invadiram a região e tentaram mantê-la – gregos, romanos, bizantinos, normandos, árabes sarracenos, espanhóis, italianos. A última invasão é a dos turistas modernos, que sobem e descem as encostas de pedra escarpada da Costa Amalfitana em busca das suas muitas atrações.

 

O maná de Santo André

Em 850 d.C., Amalfi tornou-se a primeira república italiana independente, mantendo essa condição por vários séculos. Foram tempos de ouro – literalmente falando – para os amalfitanos. Eles dominavam o comércio naval entre a Itália, Constantinopla e o Norte da África. Viviam num luxo e opulência do qual os palácios, igrejas, casarões e monumentos dão até hoje um bom testemunho. Dedicado a Santo André, o Duomo (catedral) de Amalfi, erguido no século 9, é de tirar o fôlego.


Torres do Duomo de Amalfi

A fachada e a torre, revestidas de mosaicos multicoloridos, com predominância do ouro vivo, são exemplos clássicos de como os estilos bizantino, românico e sarraceno podem conviver em harmonia numa obra. Lá dentro, sob o altar principal, está o corpo de Santo André, o primeiro dos 12 apóstolos de Jesus, venerado como relíquia. Diz-se que dos ossos do santo forma-se continuamente um misterioso líquido chamado “maná de Santo André”, ao qual são atribuídas propriedades milagrosas.

De resto, Amalfi é um labirinto de ruas e escadarias medievais estreitas, a subir pelas encostas escarpadas das montanhas de pedra. Aqui e ali abrem-se pequenas praças que, como os peitorais das janelas das casas, costumam estar enfeitadas com vasos de flores. Há trattorias (pequenos restaurantes) por todo lado, especializadas nos muitos pratos à base de frutos do mar que são a especialidade de Amalfi. As refeições terminam sempre com uma dose generosa e supergelada de limoncello, licor de limão produzido no lugar, em geral ofertado pela casa para ajudar a digestão.


Loja de artesanato em Ravello

Limão, a propósito, é o que não falta na Costa Amalfitana. Aqueles limões sicilianos, grandes e amarelos, perfumados, quase doces, plantados em terraços escavados nos penhascos. Limões e uvas constituem a base da agricultura local. Deles, além do licor e das essências puras de limão que servem para fazer deliciosos doces e sorvetes, surgem vinhos raros muito apreciados pelos conhecedores.

 

Capital da moda praia

Positano tem sido, nas últimas décadas, o lugar mais mundano da Costa. Sua única rua vai serpenteando desde a pequena praia, lá embaixo, até o topo da montanha. Todo o resto são escadarias que levam de terraço a terraço, onde cada metro quadrado é ocupado por casas que, vistas de longe, parecem suspensas no ar.


O espetacular mirante da Villa Cimbrone, em Ravello

Há 30 anos Positano é a capital da moda praia que a Itália exporta para o mundo. A criatividade e o gosto dessas criações são, no entanto, governados por rígidas regras estéticas destinadas a manter a “personalidade” da moda local. Os tecidos básicos – linho, crepe da China, algodão, seda e crepe georgette – são sempre naturais. As cores são as da paisagem e da natureza do lugar: branco e amarelo como o sol, as pedras e os limões; verde como os bosques das montanhas; o azul do mar e do céu. Mas certos acessórios, como lenços e echarpes, usam todas as cores quentes dos crepúsculos da Costa Amalfitana.


A praça central de Amalfi, em frente ao Duomo, repleta de bares e restaurantes

Positano oferece também um excelente artesanato, sobretudo em matéria de cerâmicas e joias e adereços de coral, recolhido do fundo do mar da Costa por mergulhadores especializados. O coral, chamado em Positano de “ouro vermelho”, é muito duro e difícil de ser trabalhado. É um espetáculo ver como os artesãos, usando instrumentos que mais parecem ferramentas de dentista, transformam-no em braceletes, colares e camafeus.

 

A joia da coroa

A cidadezinha de Ravello é, sem dúvida, a joia mais rara de toda a região. Pousada como ninho de águia sobre rochedos altíssimos, ela proporciona aos visitantes panoramas de assombro.

“O lugar mais belo que já pude ver no mundo é o panorama do Belvedere de Villa Cimbrone num dia brilhante de inverno, quando o céu e o mar são tão vivamente azuis que se torna impossível distinguir um do outro”, escreveu Gore Vidal, que morou em Ravello durante quase 30 anos. A cidade tem diversos palácios, cada qual com histórias que dariam para escrever um romance. Em um deles, Villa Cimbrone, Greta Garbo viveu uma tórrida história de amor com o maestro Leopold Stokovski.


O pequeno Fiorde de Furore

Em Villa Rufolo morou Richard Wagner, que ali compôs o segundo ato da ópera Parsifal. Dizem que o compositor, ao entrar nos jardins desse palácio, foi tomado por uma grande emoção e exclamou: “Este é o mágico jardim de Klingsor” – o cenário perfeito para ambientar sua obra-prima. Em homenagem a Wagner, todos os anos, no mês de julho, realiza-se um importante festival de música no interior de Villa Rufolo.

Ravello oferece também sua parte de milagres. Um deles é a liquefação do sangue de São Pantaleão, guardado na catedral, e que todo ano, no dia da Imaculada Conceição (8 de dezembro) e durante o mês de junho, vira líquido vermelho nas ampolas que o contêm.

 

Um fiorde e uma gruta esmeralda

A Costa Amalfitana apresenta muitas outras atrações. O Fiorde de Furore é um fiorde como os noruegueses, mas bem menor. De súbito, a costa de pedra se parte num precipício profundo e o mar entra por ele, aos vagalhões. No fundo do fiorde há uma praia minúscula e, depois dela, algumas casas de pescadores intactas desde a Idade Média. Nas paredes do desfiladeiro há muitas grutas pré-históricas e uma espécie vegetal que é um fóssil vivo, uma samambaia da Era Terciária que, não se sabe como, sobrevive até hoje unicamente ali.


Restos de um castelo medieval fortificado erguido na costa

Na cidadezinha de Minori existe outra raridade, a Villa Romana (romana mesmo), construída entre os anos 14 e 37 d.C., na época do imperador Tibério. O casarão pertencia a uma família patrícia romana, e seu andar térreo permanece ainda quase intacto, cheio de afrescos da época que podem ser visitados. 

Nas vizinhanças de Conca dei Marini está a Gruta Esmeralda, descoberta há apenas 70 anos, por um pescador local. Ao passar de barco, na maré baixa, pela entrada pequena e estreita, o visitante dá de cara com um lago de iridescências verdes-esmeralda. Ao redor do lago existem diversas estalagmites semelhantes a colunas egípcias que sobem das águas até o teto, dando à caverna um ar de imenso e misterioso templo.


O charmoso ancoradouro de Amalfi

Depois de visitar a Costa Amalfitana antes da explosão turística, e ciumento desse canto de céu que encontrara, o escritor americano John Steinbeck escreveu: “Se eu disser o que acho deste lugar, ele vai se encher de turistas que estragarão tudo; os habitantes vão começar a viver de turismo, e vou ter de dizer adeus à minha bela descoberta. Melhor ficar quieto”. Mas Steinbeck certamente escreveu isso com bom humor. Pois, como disse seu colega, o escritor italiano A. Cutolo, “Deus estava num dia de excelente humor quando resolveu criar a Costa Amalfitana”.

 

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Como chegar

Por rodovia, de Nápoles, Sorrento e Salerno. A estrada, cheia de curvas e mirantes, serpenteia por entre as montanhas de pedra, descortinando paisagens deslumbrantes. Há ônibus que levam dessas cidades às localidades da Costa. No verão, barcos de passageiros ligam Capri, Nápoles, Salerno e Sorrento a Positano e Amalfi. O aeroporto mais próximo é Capodichino, em Nápoles.

 

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O auditório de Niemeyer

Apelidada de “Cidade da Música”, Ravello abriga várias apresentações e festivais. Concertos, espetáculos de dança e teatro são realizados em diversos (e belos) locais ao ar livre, tais como os jardins de Villa Rufolo, Villa Cimbrone, Piazza Duomo e Piazza­ San Giovanni del Toro. Quando a presença do público fez-se notar também nos meses mais frios, surgiu a necessidade de se criar uma estrutura capaz de abrigar espetáculos por todo o ano, e para um número bem maior de espectadores.


O interior do auditório concebido por Oscar Niemeyer

No ano 2000, decidiu-se construir ali um auditório. O projeto foi encomendado ao brasileiro Oscar Niemeyer. “Um desafio e tanto”, comentou o arquiteto ao aceitar o convite. Ravello fica no alto de uma montanha escarpada de pedra, e toda a sua arquitetura, de raízes romanas, medievais e barrocas, está marcada em elementos como janelas arquea­das, colunas, arcos, etc. Era preciso projetar um edifício que não entrasse em conflito com os estilos de Ravello e a Costa Amalfitana.


A paisagem vista pelos visitantes a partir da passarela de entrada

A genialidade de Niemeyer venceu o desafio. Seu auditório, na verdade, representa um marco na modernização estética e cultural da área. Todo projetado em linhas curvas, com predominância quase absoluta da cor branca, ele é precedido por um mirante quadrado que permite ao visitante desfrutar, ao mesmo tempo, das formas exteriores do prédio e da extraordinária paisagem que dali se descortina. A principal sala de concertos tira proveito do declive natural do terreno, enquanto a orquestra e o foyer são projetados ousadamente no vazio, sem apoio visível.