18/05/2021 - 13:28
No passado, floresceram campos de papoulas onde hoje fica a garagem subterrânea da Ópera de Zurique. Por meio de uma nova análise de sementes arqueológicas, pesquisadores da Universidade da Basileia (Suíça) e da Universidade de Montpellier (França) conseguiram sustentar a hipótese de que fazendeiros pré-históricos dos Alpes participaram da domesticação da papoula do ópio.
Embora hoje seja conhecida principalmente como fonte de ópio e opiáceos, a papoula também é um alimento e uma planta medicinal valiosa. Suas sementes podem ser usadas para fazer mingaus e óleo de cozinha. Ao contrário de todas as outras culturas anteriormente domesticadas, que se presume que passaram por esse processo no sudoeste da Ásia (vários grãos, legumes e linho), os especialistas acreditam que a papoula do ópio (Papaver somniferum L.) foi domesticada no Mediterrâneo ocidental. Foi ali que sua progenitora presumida Papaver somniferum subsp. setigerum (DC.) Arcang surgiu e ainda hoje cresce em estado selvagem.
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Usando um novo método de análise, os pesquisadores conseguiram agora fortalecer a hipótese de que agricultores pré-históricos que viviam na região dos Alpes começaram a cultivar e usar a papoula do ópio em grande escala por volta de 5500 a.C. Com isso, contribuíram para sua domesticação, conforme relata a equipe na revista Scientific Reports.
Método inovador
“Era impossível determinar quando e onde a papoula do ópio havia sido domesticada até agora”, disse o líder do estudo, dr. Ferran Antolín, da Universidade da Basileia e do Instituto Arqueológico Alemão em Berlim. “Não havia métodos de identificação de achados arqueológicos de sementes de papoula domesticadas ou como subespécies selvagens.”
Isso agora foi conseguido graças a um método desenvolvido pela arqueóloga Ana Jesus como parte de seu trabalho de doutorado. O método envolve medir o número de células e o tamanho e a forma da semente usando análise de contorno para capturar as diferenças sutis entre as variantes domésticas e selvagens. Os pesquisadores testaram seu método usando 270 sementes de um total de nove espécies de papoula (30 sementes por espécie) retiradas das coleções de sementes da Universidade da Basileia e do Museu Nacional de História Natural (MNHN) em Paris. Esses testes mostraram que a classificação das sementes como a variante selvagem ou doméstica da papoula do ópio era confiável em 87% dos casos.
Depois, a equipe aplicou o método a sementes descobertas durante a escavação de uma pilha de 5 mil anos na garagem subterrânea da Ópera de Zurique. A análise das sementes de papoula mostrou que cerca de metade era selvagem e a outra metade, domesticada.
Processo de domesticação
“Existem duas explicações possíveis para isso”, afirmou Jesus. “Os agricultores poderiam ter misturado essas duas variantes, ou a pressão da seleção devido ao cultivo fez com que a papoula do ópio se tornasse gradualmente a variante que agora conhecemos como papoula do ópio domesticada.”
A última explicação significaria que a papoula do ópio ainda tinha sementes de tipo selvagem quando veio para a Europa Central, e que os agricultores – consciente ou inconscientemente – contribuíram para as mudanças no tamanho e forma da semente, ou seja, para o processo de domesticação.
Os pesquisadores agora querem aplicar o método a outras descobertas arqueológicas de sementes de papoula suficientemente bem preservadas. O objetivo da equipe internacional é reconstruir todo o processo de domesticação da papoula do ópio. Isso pode permitir tirar conclusões gerais sobre a domesticação das plantas. Além disso, permitiria identificar o papel desempenhado pelo cultivo em regiões climáticas diferentes da área nativa da planta.