01/02/2011 - 0:00
1 A conservação dos oceanos vem à tona
A ênfase de conservação no século 20 estava nos ecossistemas terrestres. A conservação dos oceanos deverá emergir como uma nova e empolgante causa.
Os oceanos estão em um estado terrível. Séculos de pesca comercial em abundância, agora com barcos cada vez maiores e tecnologia cada vez mais poderosa, têm levado várias espécies à extinção comercial e algumas à beira da extinção biológica. O acanhamento associado à conservação marinha no século 20 é explicado pelo poder político do lobby da pesca comercial e pelo fato de que, além das 200 milhas da costa, os oceanos são um bem comum. Mas o maior problema é que as mudanças no meio marinho só são visíveis para alguns. A maioria de nós pensa nos oceanos como uma extensão plana, às vezes azul e brilhante, às vezes áspera e fria. Um desenvolvimento nessa área é a Planet Ocean Initiative (www.protectplanetocean.org).
O especialista em vida marinha do governo britânico Dan Laffoley e a oceanógrafa Sylvia Earle se uniram ao Google para pôr os oceanos no Google Earth. Novas tecnologias da internet permitem que os usuários explorem o fundo do mar em três dimensões. Parceiros como a Marinha dos EUA e a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) têm contribuído com informação. É uma ferramenta de proteção avançada com enorme potencial.
A evolução da câmera e a tecnologia de localização por satélite criarão um novo gênero de filmes da vida selvagem nos quais o olhar do espectador se confundirá com o olhar dos animais ou estará sobre seu ombro. Essa combinação certamente levará os oceanos à mente do público.
2 O REDD lança as bases para uma governança florestal melhor
Um dos resultados positivos das conferências de Copenhague, em 2009, e de Cancún, em 2010, foi o progresso na aplicação do mecanismo para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD). Ele estabelece um valor financeiro para o carbono armazenado em florestas a fim de criar incentivos para os países em desenvolvimento. O REDD está vinculado a um acordo de âmbito mais amplo sobre as mudanças climáticas. Ele criou oportunidades para diversos grupos de interesse, mas até agora os gestores florestais e os profissionais de conservação – as pessoas com os conhecimentos práticos e insights – estão mal representados nos países emergentes que dispõem de florestas.
Embora o sonho de um acordo internacional e vinculante sobre florestas permaneça elusivo, o legado do REDD será uma nova e efetiva era de governança florestal. O REDD pôs as florestas no topo da agenda política. Seus projetos piloto não apenas exemplificam novas parcerias, mas também testam várias técnicas e abordagens de governança inovadoras e promissoras. Eles representam investimentos significativos e criaram expectativas que devem ser honradas; elas proliferarão para produzir modelos de governança de pesquisa que inspirarão mudanças positivas em outros setores, como agricultura e água.
3 A China muda as regras internacionais de conservação
As conferências do clima mostraram que a geopolítica global mudou: a China e outros países com economias emergentes, como Brasil e Índia, tornaram-se grandes atores internacionais. O crescimento da economia chinesa – e sua necessidade de matérias-primas – faz com que a influência da China nos países em desenvolvimento aumente. Diferentemente do estilo ocidental, as grandes estatais chinesas negociam joint ventures com companhias estatais de países em desenvolvimento que envolvem a construção de infraestrutura em troca de recursos naturais ou de participação em empresas que os extraem.
Tais investimentos beneficiam os pobres desses países, mas o acesso melhorado aos recursos também deve apressar o fim da vida selvagem e das florestas. Por exemplo, empresas chinesas estão refazendo ferrovias na Nigéria e na República Democrática do Congo, injetando US$ 8 bilhões em infraestrutura e reativando minas. Em consequência, as últimas florestas relativamente intocadas do Congo tenderão a mudar muito nos próximos 30 ou 40 anos.
A ascensão chinesa requererá novos profissionais de conservação, capazes de erguer as necessárias pontes culturais e intermediar novos acordos. Se a conservação mantiver sua vibração e influência internacional, o perfil dos futuros conservacionistas será bem diferente do de hoje.
A RELAÇÃO ENTRE EMPRESAS E AMBIENTALISTAS, REPLETA DE ANTAGONISMOS E SUSPEITAS NOS ANOS 1970, PASSOU POR UM PROCESSO DE AMENIZAÇÃO NAS ÚLTIMAS DÉCADAS. HOJE, VÁRIAS COMPANHIAS SÃO PARCEIRAS DE ONGS
4 A indústria vai liderar cada vez mais a conservação
Apesar de sua reputação passada de destruição ambiental, as indústrias de petróleo e gás, mineração, madeira, gás e o agronegócio poderão tornar-se atores-chave na proteção da natureza. Atualmente, são governos, ONGs, pessoas ricas e, por vezes, comunidades tradicionais que têm e administram áreas protegidas. No futuro, os conservacionistas poderão ter de acrescentar empresas transnacionais ao mix e negociar o acesso às políticas e ao financiamento atualmente reservados a organizações sem fins lucrativos.
A maioria das companhias líderes reconhece hoje a importância da responsabilidade social empresarial e um número crescente delas está incorporando a conservação às suas estratégias e operações. A relação de frequente antagonismo e suspeita entre ambientalistas e empresas, típica dos anos 1970, foi suavizada nas últimas duas décadas, resultando em várias parcerias entre ONGs e empresas. No futuro próximo, as ONGs conservacionistas vão parar de criticar as empresas que desmatam e trabalhar com elas para planejar o desmatamento responsável e desenhar paisagens de múltiplo uso, em que blocos e corredores de florestas naturais se ajustem à produção comercial. Essa não é uma situação perfeita, mas seria uma melhoria considerável no atual cenário.
5 A dívida da extinção será paga
Segundo estudos de ilhas oceânicas, quanto maior a ilha, mais espécies ela pode conter. Além disso, conforme a ilha encolhe, certas espécies são “espremidas”. Em geral, essa redução leva milhões de anos, mas ocorre com muito mais rapidez quando “ilhas” de floresta recém-criadas são rodeadas por terras agrícolas. Espécies adicionais são perdidas à medida que o clima no hábitat remanescente muda além da capacidade de adaptação de seus organismos. Os hábitats do mundo agora arcam com uma significativa “dívida de extinção” – ou seja, muitas reservas naturais e fragmentos de hábitat contêm espécies que têm percorrido um longo caminho rumo à extinção.
Houve pouquíssimas extinções de espécies importantes desde os anos 1960, mas muitas espécies estão perto disso, e pode ser questão de tempo testemunhar casos como o do pombopassageiro nos Estados Unidos, cuja população superava 3,5 bilhões de aves 200 anos atrás.
Talvez a extinção do gorila-das-montanhas, do orangotango ou do elefante-asiático na natureza possa galvanizar a próxima geração de conservacionistas e levar ao nascimento de novas e mais bem-sucedidas organizações e movimentos de conservação. Essas espécies não tendem a ser deixadas ao deus-dará: quando sua situação ficar crítica, enormes recursos serão despejados em sua direção. É mais provável que a dívida da extinção seja paga por espécies menos conhecidas de invertebrados, anfíbios e répteis, que a maioria das pessoas conhece menos e pelas quais demonstra pouco interesse.
6 Retorno ao natural
Novas correntes de pensamento da conservação estão surgindo, como o “retorno ao natural”, a reintrodução de parentes de espécies extintas, em geral grandes herbívoros e predadores, em áreas naturais para restaurar sua função ecológica. Exemplo disso é o projeto (iniciado em meados dos anos 1980) do ecologista holandês Frans Vera, associado à agência de conservação holandesa, Staatsbosbeheer, de recriar na reserva pública Oostvaarderplassen uma comunidade de grandes herbívoros europeus.
Esses projetos deverão se expandir bastante, em número e popularidade. Grandes mamíferos fascinam um amplo contingente da sociedade no mundo. Tais projetos podem trazer a natureza para o primeiro plano do debate público. Deixar o gado selvagem morrer de fome na Oostvaarderplassen indignou de tal modo organizações holandesas de proteção dos animais que elas processaram a Staatsbosbeheer. O debate centrou-se em noções de crueldade – em especial, por que se considera cruel permitir a fome natural de inverno, enquanto não se considera cruel separar animais sociais de suas mães em tenra idade. Se vamos renegociar a relação da sociedade com a natureza para atender às circunstâncias ambientais e sociais do século 21, esses debates são muito importantes.
Diante da perspectiva de a mudança climática transformar ecossistemas, muitos cientistas argumentam que não temos opção afora restaurar e fortalecer processos ecológicos de modo que sistemas naturais possam se adaptar.
7 Um fim para a extinção
O interesse público em projetos como a reintrodução de espécies deverá crescer até 2050. A reintrodução de espécies como castor, lince, condor-californiano ou lobo é um antídoto para as histórias de destruição e de extinção que parecem dominar as manchetes. Mas os avanços na tecnologia genética e a conservação serão capazes de trazer de volta espécies mortas?
Alguns dos principais geneticistas veem esses projetos como desperdício de tempo e afirmam que clonar uma espécie a partir de DNA antigo sempre será impossível. Organizações conservacionistas alertam que a perspectiva de uma solução tecnológica vai distrair a atenção pública da necessidade mais urgente de salvar as espécies existentes e minar o imperativo para a ação deflagrado pelo conhecimento de que a extinção é para sempre. Mas o entusiasmo do público para trazer de volta animais extintos, aliado a avanços nas técnicas de clonagem, nos sugere que mais biocientistas serão atraídos pelos desafios técnicos, pela perspectiva de publicidade e financiamento e pelo fato de a ideia ser tão intrigante.
Embora seja impossível saber se uma espécie extinta vai mesmo voltar, faríamos uma aposta (muito) pequena de que os turistas do fim do século 21 poderão ir às estepes russas para safáris fotográficos com os cinco grandes: o rinoceronte-lanudo (extinto), o boi-almiscarado, o auroque (extinto), o tigresiberiano e o bisão. O retorno à natureza, a reintrodução e as reversões de extinção serão fontes crescentes de esperança, inspiração e controvérsia.
EM MUITAS OCASIÕES, NOTOU-SE QUE A MESMA ESPÉCIE NÃO NATIVA ESTÁ SENDO INTRODUZIDA EM VÁRIOS LOCAIS. COM ISSO, LUGARES DIFERENTES ESTÃO FICANDO CADA VEZ MAIS SIMILARES EM TERMOS ECOLÓGICOS
8 Os invasores serão aceitos
Quando os primeiros humanos migraram da África, levaram consigo outras espécies – no mínimo, os parasitas que viviam dentro deles ou sobre eles. Com o desenvolvimento de sociedades complexas e de sistemas de transporte, porém, quase todas as espécies da Terra podem encontrar-se inesperadamente vivendo em uma nova região ou continente. O problema, a partir de uma perspectiva de conservação, é que o número de invasores aumentou dramaticamente nos últimos 50 anos, muitas vezes em detrimento da fauna e da flora locais – para não citar a saúde humana e a economia.
Em diversas ocasiões, notou-se que a mesma espécie não nativa está sendo introduzida em vários locais e, com isso, locais diferentes começam a parecer mais ecologicamente similares. Uma das consequências mais interessantes no aumento desse processo, a homogeneização biótica, ao lado de migrações forçadas em razão da mudança climática, será a criação de comunidades ecológicas novas ou não análogas. Em algum aspecto, qualquer área que perdeu espécies nativas ou ganhou espécies não nativas é nova.
O ponto é que muitas reuniões de espécies serão transformadas em tal medida que já não parecerão nada que consideramos natural atualmente. Prevemos que, com a exceção de ilhas oceânicas, as atitudes em relação às espécies não nativas serão suavizadas radicalmente durante o século 21, enquanto soluções inovadoras serão procuradas para a crise da biodiversidade.
Em certa medida, isso já acontece. Um grupo conservacionista da ilha indonésia de Bali decidiu opor-se à soltura de estorninhos-de-bali criados em cativeiro nos “hábitats naturais” do Parque Nacional Bali Barat quando a população silvestre foi extinta, em 2006. Em vez disso, o grupo os soltou em monoculturas na vizinha ilha de Nusa Pendia, fora da área conhecida da espécie. Até agora, os estorninhos parecem estar se multiplicando. Uma coisa é certa: espécies não nativas chegaram para ficar e os conservacionistas terão de mudar atitudes frente a elas ou ficar paralisados diante da enormidade da tarefa
O presente texto foi extraído e adaptado do livro Conservation: A Beginner’s Guide, de Paul Jepson e Richard Ladle (Oneworld Publications, Grã- Bretanha, 2010). Jepson é pesquisador sênior em Prática de Conservação no Instituto de Mudança Ambiental da Universidade de Oxford. Ladle é pesquisador associado sênior da Escola de Geografia e Ambiente da Universidade de Oxford..