15/07/2021 - 11:35
A legalização da maconha para uso recreativo em estados norte-americanos, iniciada no Colorado em 2012, já produz alguns resultados quantificáveis em termos de saúde pública, e um deles é a ascensão de casos de scromiting – uma aglutinação das palavras em inglês para “grito” e vômito” criada para designar a síndrome de hiperêmese canabinoide. O problema, que tem se espalhado pelos EUA, atinge sobretudo usuários jovens da droga, que manifestam episódios psicóticos e vômitos incontroláveis. Os níveis elevados de THC (tetra-hidrocanabinol, a principal substância psicoativa das plantas do gênero Cannabis) de boa parte da maconha comercializada nos EUA e o consumo diário da erva estão sendo associados ao problema.
No início da doença, as pessoas podem sentir náuseas pela manhã, dores abdominais e medo de vomitar. Na etapa seguinte (que pode ocorrer semanas, meses ou até anos depois), os usuários crônicos podem experimentar crises “intensas e avassaladoras” de vômitos, dores no abdômen, perda de apetite e sensações contínuas de náusea.
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Desidratação severa
O problema pode levar a complicações adicionais, sobretudo por causa da desidratação que causa nos pacientes. Há inclusive casos de pessoas que morreram após um surto da doença. Em 2018, um adolescente faleceu após repetidos episódios da doença, que causou desidratação severa. Dois anos antes, em artigo publicado na revista American Journal of Gastroenterology, médicos atribuíram duas mortes – a de um homem de 41 e outro de 48 anos – à desidratação causada pelo scromiting.
Em 2009, o pronto-socorro do Parkview Medical Center, em Pueblo (Colorado), relatou cinco casos de scromiting. Nove anos depois (e seis anos após a maconha ser legalizada no estado), foram registrados ali 120 casos, um aumento de 230%. Segundo o site NBC News, outros dois pronto-socorros no Colorado notificaram um incremento de 100% nos casos de scromiting logo após a legalização.
O problema tende a piorar conforme os produtores investem em maconha com maior quantidade de THC. Segundo estudos citados pela NBC News, a maconha de 20 anos atrás tinha entre 2% e 3% de THC. Agora, é possível encontrar em mercados como o Colorado plantas com níveis de THC de até 90%.
A droga mais forte tem demonstrado agradar mais a clientela. De acordo com a NBC News, os concentrados de maconha, feitos com altos níveis de THC e outras substâncias, representavam 32% do mercado de cannabis do Colorado (avaliado em US$ 2 bilhões anuais), mas atualmente respondem por 43% das vendas.
Saúde mental
Segundo um estudo de 2019, o consumo de maconha com mais de 10% de THC pode aumentar as chances de um surto psicótico. Elas também aumentam se o consumo da droga for diário. E o incremento chega quase a cinco vezes se o usuário diário fuma maconha de alta potência. O mesmo trabalho revelou que, se a droga mais potente fosse retirada do mercado, 12,2% dos casos psiquiátricos poderiam ser evitados nos 11 locais estudados, índice que aumentava para 33% em Londres e 50% em Amsterdã.
“A evidência de como a cannabis, especialmente em concentrações mais altas, afeta a saúde mental está se tornando cada vez mais forte, especialmente em como ela se relaciona com psicose e sintomas semelhantes à esquizofrenia”, disse o dr. Sam Wang, médico de pronto-socorro e toxicologista do Children’s Hospital de Denver (Colorado), à NBC News. “Esses impactos são vistos mais com produtos mais concentrados e com uso mais frequente.”
Enquanto a solução não surge dos legisladores, os usuários podem interromper os sintomas simplesmente parando de consumir maconha, segundo os pesquisadores. Quem já teve episódios da síndrome disse que banhos ou duchas quentes aliviam os sintomas.