07/10/2021 - 9:17
Em 1973, um cientista tropeçou em uma árvore estranha na Floresta Amazônica, diferente de tudo que ele já vira. Tinha cerca de 6 metros de altura, com pequenos frutos laranja em forma de lanternas de papel. Ele coletou amostras das folhas e frutos da planta, mas todos os cientistas para quem ele a mostrou acabaram coçando a cabeça – não só foram incapazes de identificar a planta como uma espécie que havia sido previamente descrita por cientistas, mas também não conseguiram até declará-la uma nova espécie, porque não sabiam dizer a que família pertencia.
O enigma agora foi resolvido: em um novo estudo publicado na revista Taxon, os cientistas analisaram o DNA da planta e determinaram onde ela pertence na árvore genealógica das árvores. Ela finalmente recebeu um nome, que significa “Mistério de Manu”, em homenagem ao parque do Peru que veio.
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“Quando vi essa pequena árvore pela primeira vez, em uma ocasião em que estava em uma trilha na floresta que partia da estação de campo, foi a fruta – parecida com uma lanterna chinesa laranja e suculenta quando madura com várias sementes – que chamou minha atenção”, disse Robin Foster, o cientista que originariamente coletou a planta misteriosa no Parque Nacional Manu, no Peru. Curador aposentado do Field Museum de Chicago (EUA), Foster é agora pesquisador do Smithsonian Tropical Research Institute. “Eu realmente não achei que fosse especial, exceto pelo fato de que tinha características de plantas em várias famílias de plantas diferentes, e não se encaixava perfeitamente em nenhuma família. Normalmente, posso dizer a família com um olhar rápido, mas essa eu não podia identificar.”
Caso intrigante
Foster não foi o único a não conseguir descobrir. Nancy Hensold, uma botânica do Field Museum, lembra-se de que ele mostrou a ela um espécime seco da planta há mais de 30 anos. “Vim trabalhar no Field Museum em 1990 e Robin mostrou-me essa planta. E tentei identificá-la usando pequenos caracteres técnicos, como ferver os ovários das flores e tirar fotos do pólen, e, depois de tudo, ainda não sabíamos”, disse ela. “Isso realmente me incomodou.”
A planta misteriosa ficou no herbário do Field Museum, uma biblioteca de espécimes de plantas secas, por anos, mas Hensold e seus colegas não se esqueceram dela. A equipe acabou conseguindo uma bolsa para estudar a planta, financiada pelo Conselho de Mulheres do Field Museum, e a busca começou.
A equipe tentou analisar o DNA da planta usando os espécimes secos. Quando isso não funcionou, eles pediram ajuda a Patricia Álvarez-Loayza, uma cientista que trabalha no Parque Nacional Manu e passou anos monitorando a floresta lá, para encontrar um novo espécime da planta. Ela o fez, e quando os pesquisadores no Field a analisaram no laboratório de DNA Pritzker do museu, ficaram chocados com o que encontraram.
“Quando meu colega Rick Ree a sequenciou e me disse a que família ela pertencia, eu disse a ele que a amostra devia estar contaminada. Eu simplesmente não conseguia acreditar”, lembrou Hensold.
Poucas semelhanças
A análise de DNA revelou que os parentes mais próximos da planta misteriosa pertenciam à família Picramniaceae. Isso era um grande problema para os botânicos, porque a planta não se parecia em nada com seus parentes mais próximos, pelo menos à primeira vista. “Olhando mais de perto a estrutura das flores minúsculas, percebi que realmente havia algumas semelhanças. Mas, dadas suas características gerais, ninguém a teria colocado naquela família”, disse Hensold.
Os pesquisadores enviaram espécimes a Wayt Thomas, curador emérito do The New York Botanical Garden e especialista em Picramniaceae. “Quando abri a embalagem e olhei para as amostras, minha primeira reação foi: ‘Que diabos?’ Essas plantas não se pareciam com mais nada na família”, disse Thomas, o principal autor do artigo na Taxon. “Então, decidi olhar com mais cuidado. Assim que olhei com muito cuidado para as minúsculas flores de 2 a 3 milímetros de comprimento, as coisas se encaixaram.”
Com o DNA finalmente revelando a qual família a planta pertencia, os pesquisadores puderam dar a ela um nome científico formal, Aenigmanu alvareziae. O nome do gênero, Aenigmanu, significa “mistério de Manu”, enquanto o nome da espécie é em homenagem a Patricia Álvarez-Loayza, que coletou os primeiros espécimes usados para a análise genética. (É importante notar que, embora Aenigmanu alvareziae seja novo para os cientistas, há muito tempo é usado pela povo indígena machiguenga.)
Recado sobre o que ocorre no ecossistema
Os pesquisadores dizem que finalmente conseguir uma classificação científica para Aenigmanu alvareziae poderia ajudar a proteger a Floresta Amazônica em face do desmatamento e das mudanças climáticas.
“As plantas são pouco estudadas em geral. Especialmente plantas de florestas tropicais. Principalmente as plantas da Amazônia. E especialmente as plantas do Alto Amazonas. Para entender as mudanças que estão ocorrendo nos trópicos, para proteger o que resta e para restaurar áreas devastadas, as plantas são a base de tudo o que lá vive e o mais importante para estudar”, disse Foster. “Dar-lhes nomes exclusivos é a melhor maneira de organizar as informações sobre elas e chamar a atenção para elas. Uma única espécie rara pode não ser importante por si só para um ecossistema, mas coletivamente elas nos dizem o que está acontecendo lá.”