08/02/2022 - 8:17
Por décadas, os físicos ficaram perplexos sobre por que nosso cosmos parece ter sido ajustado com precisão para promover a vida inteligente. Acredita-se amplamente que, se os valores de certos parâmetros físicos, como as massas das partículas elementares, fossem ajustados, mesmo que levemente, isso teria impedido a formação dos componentes necessários para a vida no universo – incluindo planetas, estrelas e galáxias. Mas estudos recentes, detalhados em um novo relatório do Foundational Questions Institute (FQXi), dos EUA, propõem que a vida inteligente poderia ter evoluído sob condições físicas drasticamente diferentes. A afirmação mina um grande argumento em apoio à existência de um multiverso de universos paralelos.
“A sintonia necessária para que alguns desses parâmetros físicos possibilitem a existência de vida acaba sendo menos precisa do que a necessária para capturar uma estação em seu rádio, de acordo com novos cálculos”, disse Miriam Frankel, autora do relatório do FQXi, produzido com o apoio da Fundação John Templeton. “Se for verdade, o aparente ajuste fino pode ser uma ilusão”, acrescentou Frankel.
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Multiverso e ceticismo
Nas últimas décadas, o assunto do ajuste fino atraiu algumas das mentes mais perspicazes da física. Ao investigarem as leis físicas do universo e determinar com precisão os valores das constantes físicas – como as massas das partículas elementares e a intensidade das forças –, os físicos descobriram que variações surpreendentemente pequenas nesses valores teriam tornado o universo sem vida. Isso levou a um quebra-cabeça: por que as condições físicas são aparentemente adaptadas à existência humana?
Alguns físicos explicaram essas condições fortuitas invocando a teoria do multiverso, que afirma que há um número infinito de universos paralelos, cada um com diferentes parâmetros físicos. Dentro da estrutura do multiverso, não é tão surpreendente que os humanos tenham evoluído em uma das realidades paralelas em que as condições são habitáveis para nós. Assim, o quebra-cabeça de ajuste fino evapora.
Mas outros cientistas permaneceram céticos de que nosso universo está bem ajustado para a vida. No relatório aprofundado do FQXi, Frankel explora a complexa história da pesquisa sobre ajuste fino, incluindo possíveis explicações para ele – como aquelas derivadas da teoria das cordas e da estrutura do multiverso – e avalia propostas para testar experimentalmente essas explicações direta e indiretamente. O relatório então esboça argumentos de que o ajuste fino é uma ilusão, observando que a vida pode assumir uma forma muito diferente do que ingenuamente imaginado e que, se vários parâmetros físicos forem considerados variando simultaneamente, isso poderia aliviar quaisquer problemas aparentes de ajuste fino. Isso sugere que o universo pode não ser tão bem ajustado; pode ser capaz de produzir vida sob uma gama muito mais ampla de circunstâncias do que se pensava inicialmente.
Mais soluções que o imaginado
Para Fred Adams, astrofísico e especialista em ajuste fino da Universidade de Michigan, em Ann Arbor (EUA), “os desenvolvimentos descritos neste relatório enfatizam que o problema de ajuste fino é mais sutil do que foi discutido anteriormente, com faixas mais amplas permitidas para os parâmetros físicos relevantes”. Por exemplo, muitas vezes se afirmou que mesmo mudando sutilmente o equilíbrio das forças que governam o núcleo atômico, ou os valores das constantes fundamentais da natureza, seria possível afetar a formação de carbono nas estrelas – necessária para o desenvolvimento da vida orgânica – ou afetar o tempo de vida das estrelas, impedindo-as de fornecer energia suficiente para a existência de planetas habitáveis. Mas as equações da estrutura estelar podem ter mais soluções do que a maioria das pessoas imagina”.
“As alegações de ajuste fino dividem opiniões há muito tempo”, disse o gerente do programa científico do FQXi, David Sloan, físico da Universidade de Lancaster (Reino Unido), que editou o livro Fine-Tuning in the Physical Universe, publicado pela Cambridge University Press em 2020. Quando os parâmetros necessários para a vida parecem aparecer em regiões suspeitamente estreitas, procuramos explicações para isso como coincidência ou conspiração cósmica. Descobrir que essas regiões podem ser mais amplas, ou que existem outras regiões que permitem a vida, enfraquece a necessidade de tais explicações. Pode ser que não haja nenhuma conspiração”, disse Sloan, cuja pesquisa também é apresentada no relatório.