24/08/2022 - 9:13
Uma equipe internacional de pesquisadores liderada por Charles Cadieux, doutorando da Universidade de Montreal (Canadá) e membro do Institute for Research on Exoplanets (iREx), anunciou a descoberta do TOI-1452 b, um exoplaneta que orbita uma das duas pequenas estrelas de um sistema binário localizado na constelação de Draco, a cerca de 100 anos-luz da Terra. Em artigo que apresenta a descoberta, publicado na revista The Astronomical Journal, Cadieux e sua equipe descrevem as observações que elucidaram a natureza e as características desse exoplaneta único.
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Ligeiramente maior em tamanho e massa do que a Terra, o exoplaneta está localizado a uma distância de sua estrela em que sua temperatura não seria nem muito quente nem muito fria para a existência de água líquida em sua superfície. Os astrônomos acreditam que poderia ser um “planeta oceânico”, um planeta completamente coberto por uma espessa camada de água, semelhante a algumas das luas de Júpiter e Saturno.
“Estou extremamente orgulhoso desta descoberta porque mostra o alto calibre de nossos pesquisadores e instrumentação”, disse René Doyon, professor da Universidade de Montreal e diretor do iREx e do Observatoire du Mont-Mégantic (OMM). “É graças ao OMM, um instrumento especial projetado em nossos laboratórios chamado SPIRou e um método analítico inovador desenvolvido por nossa equipe de pesquisa que conseguimos detectar esse exoplaneta único.”
Uma equipe internacional de astrônomos descobriu um exoplaneta que pode estar completamente coberto por água. Crédito: Benoit Gougeon, Universidade de Montreal
Papel crucial
Foi o telescópio espacial TESS, da Nasa, que examina todo o céu em busca de sistemas planetários próximos ao nosso, que colocou os pesquisadores no rastro desse exoplaneta. Com base no sinal do TESS, que mostrou uma ligeira diminuição no brilho a cada 11 dias, os astrônomos previram um planeta cerca de 70% maior que a Terra.
Charles Cadieux pertence a um grupo de astrônomos que faz observações de acompanhamento de candidatos identificados pelo TESS para confirmar seu tipo e características de planeta. Ele usa a PESTO, uma câmera instalada no telescópio do OMM desenvolvida pelo professor David Lafrenière, da Universidade de Montreal, e por seu doutorando François-René Lachapelle.
“O OMM desempenhou um papel crucial na confirmação da natureza desse sinal e na estimativa do raio do planeta”, explicou Cadieux. “Essa não foi uma verificação de rotina. Tivemos de ter certeza de que o sinal detectado pelo TESS era realmente causado por um exoplaneta orbitando TOI-1452, a maior das duas estrelas nesse sistema binário.”
Alta resolução
Muito menor que o nosso Sol, a estrela hospedeira TOI-1452 é uma das duas estrelas de tamanho similar no sistema binário. Essas estrelas orbitam uma à outra e estão separadas por uma distância tão pequena – 97 unidades astronômicas, ou cerca de duas vezes e meia a distância entre o Sol e Plutão – que o telescópio TESS as vê como um único ponto de luz. Mas a resolução do PESTO é alta o suficiente para distinguir os dois objetos, e as imagens mostraram que o exoplaneta orbita a TOI-1452, o que foi confirmado através de observações subsequentes de uma equipe japonesa.
Para determinar a massa do planeta, os pesquisadores observaram o sistema com o SPIRou, um instrumento instalado no Telescópio Canadá-França-Havaí no Havaí (EUA). Projetado em grande parte no Canadá, o SPIrou é ideal para estudar estrelas de baixa massa, como a TOI-1452, porque opera no espectro infravermelho, em que essas estrelas são mais brilhantes. Mesmo assim, foram necessárias mais de 50 horas de observação para estimar a massa do planeta, que se acredita ser quase cinco vezes a da Terra.
Um mundo aquático
O exoplaneta TOI-1452 b é provavelmente rochoso como a Terra, mas seu raio, massa e densidade sugerem um mundo muito diferente do nosso. A Terra é essencialmente um planeta muito seco; embora às vezes o chamemos de Planeta Azul porque cerca de 70% de sua superfície é coberta pelo oceano, a água na verdade representa apenas uma fração insignificante de sua massa – menos de 1%.
A água pode ser muito mais abundante em alguns exoplanetas. Nos últimos anos, os astrônomos identificaram e determinaram o raio e a massa de muitos exoplanetas com tamanho entre o da Terra e Netuno (cerca de 3,8 vezes maior que a Terra). Alguns desses planetas têm uma densidade que só pode ser explicada se uma grande fração de sua massa for composta de materiais mais leves do que aqueles que compõem a estrutura interna da Terra, como a água. Esses mundos hipotéticos foram apelidados de “planetas oceânicos”.
“O TOI-1452 b é um dos melhores candidatos a planeta oceânico que encontramos até hoje”, disse Cadieux. “Seu raio e massa sugerem uma densidade muito menor do que se esperaria para um planeta que é basicamente composto de metal e rocha, como a Terra.”
Mykhaylo Plotnykov e Diana Valencia, da Universidade de Toronto (Canadá), são especialistas em modelagem de interiores de exoplanetas. Sua análise do TOI-1452 b mostra que a água pode representar até 30% de sua massa, uma proporção semelhante à de alguns satélites naturais em nosso Sistema Solar, como as luas de Júpiter Ganimedes e Calisto, e as luas de Saturno Titã e Encélado.
Observações adicionais
Um exoplaneta como o TOI-1452 b é um candidato perfeito para observação adicional com o Telescópio Espacial James Webb. É um dos poucos planetas temperados conhecidos que exibem características consistentes com um planeta oceânico. Está perto o suficiente da Terra para que os pesquisadores possam estudar sua atmosfera e testar essa hipótese. E, por um golpe de sorte, está localizado em uma região do céu que o telescópio pode observar o ano todo.
“Nossas observações com o Telescópio Webb serão essenciais para uma melhor compreensão do TOI-1452 b”, disse René Doyon. “Assim que pudermos, reservaremos tempo no Webb para observar esse mundo estranho e maravilhoso.”