04/06/2024 - 15:19
Metade dos peixes e frutos do mar consumidos no mundo provém da aquicultura. Mas quão sustentável é essa prática? É isso que se perguntam pesquisadores em Bremerhaven.No porto histórico de Bremerhaven, cidade alemã na costa do Mar do Norte, o cheiro é de peixe frito, mas há muito tempo que não há navios pesqueiros por aqui. Em vez disso, o que se vê é uma sucessão de defumadouros, restaurantes e lojas de souvenirs. Logo ao lado fica o moderno prédio de vidro e aço do Instituto Thünen de Ecologia Pesqueira, que estuda o ambiente marinho, a aquicultura, a biodiversidade e os peixes migratórios a pedido do Ministério Federal da Alimentação e Agricultura.
No centro de pesquisas, no térreo, nadam várias espécies de peixes de diferentes tamanhos em cerca de uma dúzia de tanques. Há um leve cheiro de mofo no ar – por causa da umidade, explica o pesquisador Ulfert Focken. “Aqui no salão de águas mornas existem várias piscinas onde mantemos os animais de áreas mornas. São sobretudo carpas e camarões tropicais, também chamados camarões brancos do Pacífico. Aqui conduzimos principalmente pesquisas sobre o cultivo e alimentação dessas espécies.”
O especialista em aquicultura e nutrição de peixes trabalha há mais de 30 anos na criação de organismos que vivem na água. Na aquicultura cria-se não só salmão, carpa ou tilápia, mas também caranguejos, mexilhões e algas em condições controladas. A aquicultura é, por assim dizer, a agricultura debaixo de água. “Em muitos continentes, especialmente na Ásia, a aquicultura tem um valor equivalente ao da agricultura. Sem a aquicultura não teríamos qualquer chance de alimentar as pessoas”, afirma o diretor do Instituto Thünen de Ecologia Pesqueira, Reinhold Handel.
Peixe cultivado é cada vez mais popular
O consumo global de peixe mais do que duplicou desde meados da década de 1980. Isso se deve exclusivamente à aquicultura: com cerca de 7 milhões de toneladas há 40 anos, a produção atendia menos de 10% do consumo global de peixe. Em 2020, com 88 milhões de toneladas, passou a contribuir com 49%, ou seja, quase tanto como a indústria pesqueira. Se for incluída a cultura de algas, a aquicultura produz até mais alimentos aquáticos do que a pesca de captura, cuja produção total praticamente estagnou desde meados da década de 1980.
Isso se deve sobretudo a um país: a China, que de longe produziu a maior parte do peixe proveniente da aquicultura: quase 37 milhões de toneladas em 2020. Para efeito de comparação, na Europa, em 2020, apenas 3 milhões de toneladas de peixe vieram da aquicultura. No Brasil, foram pouco mais de 802 mil toneladas, segundo a Associação Brasileira da Piscicultura.
Mas será que a produção de todos os tipos de peixe é uma estratégia sensata e sustentável para alimentar a todos? E quanto ao salmão, o peixe mais popular nas mesas de muitos países? “Todos sabem que o salmão, como carnívoro, tem uma necessidade básica relativamente alta de qualidade nutricional”, diz Hanel. O mesmo se aplica ao atum, à dourada e ao robalo. “Todos esses peixes não são criados para a alimentação mundial, mas para atender a um nicho de mercado”, diz Hanel.
Alimentados com soja
No seu habitat natural, peixes predadores, como o atum, a dourada, o robalo e o salmão, se alimentam de outros peixes e caranguejos. Já na aquicultura moderna, peixes cultivados mal recebem 10% de peixe em sua alimentação. Em que então consistem os outros 90%? “De uma certa quantidade de farinha animal, mas a maior parte é proteína vegetal, principalmente proteínas à base de soja”, diz Focke. “É claro que esse não é um alimento natural para o salmão. A evolução das plantas terrestres e dos peixes ocorreu separadamente. Simplesmente dar farinha de soja crua ao salmão e a outros peixes leva à inflamação intestinal crônica.”
Isso significa que a ração vegetal precisa ser processada industrialmente, isolando-se as proteínas – e que a ração à base de soja deve primeiramente ser transportada da América do Sul para as instalações de piscicultura na Noruega, na Islândia ou no Mediterrâneo. Os peixes predadores são, portanto, inadequados para alimentar uma população mundial crescente.
Mesmo assim, estudos científicos do Instituto Thünen comprovaram os benefícios da piscicultura. “A aquicultura requer significativamente menos recursos do que os organismos terrestres, como bovinos, suínos ou galinhas. O peixe é muito adequado para produzir uma quantidade relativamente grande de alimentos com relativamente pouca energia.”
Além disso, os principais pontos fracos da piscicultura industrial já não existem mais, diz Hanel. “Podemos dizer que as doenças infantis foram superadas nas últimas décadas. A criação de salmão é um exemplo clássico em que todos os erros foram cometidos, como uso de antibióticos e doenças virais. Agora a indústria está tão estabelecida que as coisas estão melhores do que antes.”
Bem-estar animal
E como se comportam os peixes se, por exemplo, 100 mil deles vivem amontoados numa pequena rede durante 18 meses e depois são abatidos, como acontece na criação de salmão? Para a indústria, isso é altamente lucrativo, mas o que dizem as pesquisas sobre como esses animais se sentem? “A questão do bem-estar animal se torna cada vez mais importante e é também um dos temas principais de nossa pesquisa”, afirma o diretor do instituto. “O debate atual tende a sugerir que os peixes também podem sentir dor.”
A outra coisa é a percepção do consumidor, que não só tem a ver com a racionalidade. “Coisas como a densidade da criação de animais, como se conhece de outros animais de criação, por exemplo das galinhas, são projetadas para a criação de peixes.” Muitas vezes existem falsas percepções: a ideia de que quanto menor a densidade de peixes, melhor eles estarão. “O que nem sempre é verdade, pois depende muito da espécie.”
E que peixe é realmente sustentável para quem quer levar em conta o impacto na natureza e na vida marinha? “Quem consome do ponto de vista ecológico acaba na carpa, que não precisa necessariamente ter gosto de barro”, diz Hanel. Ou mesmo com a tilápia, que, produzida em tanques de água doce, tem uma pegada ecológica significativamente inferior à da dourada, proveniente da criação em gaiolas de rede no Mediterrâneo.