“Pode parecer que estou fazendo drama, mas é como se a falta de concentração me estivesse fazendo perder o controle da minha vida”, comenta a estudante de finanças de 21 anos Mina, de Barcelona.

Ser excelente em programação a ajudaria a obter um emprego bem remunerado, mas ela tem enfrentado sérias dificuldades para manter o foco no aprendizado. Toda vez que tenta fazer um exercício de codificação, uma mistura de tédio e inquietação a fazem pegar o celular para verificar o Instagram, escrever uma mensagem para alguém ou começar um jogo.

“Não é só uma questão de produtividade. Também tenho dificuldade de terminar os livros de que eu gosto ou manter os hobbies que exigem algum nível de energia mental.” Ela prefere não divulgar seu sobrenome, com medo de que futuros empregadores descubram seu problema ao fazer uma busca no Google.

O sentimento de Mina é compartilhado por um número crescente de indivíduos, que postam nas redes sociais histórias de uma dolorosa luta com a concentração, e a culpa e vergonha resultantes.

Perguntas como “Como faço para manter o foco?” ou “Por que não consigo me concentrar?” são populares no Google. Livros, artigos e podcasts têm tentado responder a essas perguntas, trazendo métodos que teoricamente ajudam a manter a concentração no denominam o “mundo distraído” de hoje em dia.

Mas quão grave é o problema de concentração? Métodos de autoajuda podem contribuir no que parece ser um problema generalizado?

Por que a perda de foco?

Não há nenhum estudo que tenha monitorado as mudanças na capacidade de concentração de um grupo significativo ao longo das gerações, porém certas pesquisas sugerem que a atenção de funcionários de escritórios e estudantes vem caindo.

Por outro lado, tal conclusão é questionada por outros estudos, segundo os quais a atenção depende da tarefa em si, dos fluxos de trabalho e de fatores ambientais como a iluminação da sala de estudo ou de trabalho. Outras pesquisas enfatizam os efeitos prejudiciais do aumento do uso das redes sociais e do longo tempo em frente às telas sobre as habilidades cognitivas, incluindo o foco e a capacidade de atenção.

Elaborados para constantemente estimular o cérebro, os algoritmos das mídias sociais têm como objetivo deixar os usuários fixados em conteúdos curtos e contínuos por horas, dificultando manter uma atenção profunda em tarefas menos divertidas.

No entanto, nem todos concordam que esses fatores são necessariamente sinais negativos: “É verdade que, em comparação com o passado, se está prestando mais atenção a coisas muito menores e que não duram muito tempo; textos como tuítes versus livros”, admite Thomas Hills, professor de psicologia da Universidade de Warwick. “Mas isso pode significar que estamos encontrando maneiras mais curtas e rápidas de enviar as informações.”

A humanidade é alvejada sem cessar por informações que competem ferrenhamente pela atenção, prossegue Hills. “Mas talvez sejamos capazes de nos adaptar a isso e adaptar nossas vidas a esse ritmo. O que precisamos é ensinar as habilidades necessárias para administrar o tempo e proteger a saúde mental.”

“Não é culpa sua”

Mas, para Johann Hari, autor de Stolen focus (Foco roubado), listado como best-seller pelo New York Times, o problema é bem mais complexo: os problemas de atenção estão piores do que nunca, e a sociedade e a cultura atuais contribuem para isso.

Ele explica em seu livro que os seres humanos estão cercados por estímulos que degradam a capacidade de concentração. Comparado com 100 anos atrás, o sono é mais breve e de qualidade cada vez pior, devido à constante exposição à luz das telas. Há um aumento da ansiedade crônica, sobretudo de quem sofre insegurança financeira, o que comprovadamente prejudica a concentração.

Dieta deficiente, hábitos alimentares pouco saudáveis e poluição também têm efeitos danosos duradouros sobre o funcionamento do cérebro, com o número de casos de transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) em alta, em muitos países.

Para Hari, as principais culpadas são as grandes empresas de tecnologia, cujo modelo de negócios depende de maximizar o tempo gasto nas redes sociais. “Diziam-nos que a falta de foco é uma falha pessoal. Quando eu lutava para me concentrar, pensava: sou fraco, sou preguiçoso e indisciplinado”, revela o autor. “Mas na verdade o nosso foco está sendo roubado de nós”.

Estratégia mais ampla para retomar o foco

Quem acha que se trata de um problema individual, caiu na armadilha, reforça Hari: “Precisamos parar de nos culpar e partir para combater as forças que estão atacando a nossa atenção, para impedi-las de continuar.” Pois, sem uma ação coletiva, as soluções pessoais terão impacto limitado e, em muitos casos, temporário.

Ficar longe das telas por um bom tempo é uma das principais recomendações de quase todos os guias de autoajuda. Quem tem um trabalho que o prende ao computador, contudo, mal tem uma chance para tal.

Como opção concreta, Hari aponta as campanhas pelo “direito de desconectar”, segundo o qual os empregados não devem ser contatados fora do horário de expediente. A França foi o primeiro país a adotar uma lei trabalhista baseada nesse princípio, a Droit à la déconnexion, aprovada pelo Parlamento Europeu. No Brasil não há uma legislação específica nesse sentido.

Há outros movimentos e iniciativas internacionais visando melhorar os níveis de atenção e foco. O Centro de Tecnologia Humana (CHT, na sigla em inglês), com sede nos Estados Unidos, é uma organização sem fins lucrativos que visa a impedir que os algoritmos tecnológicos distraiam constantemente os usuários.

Desde 2013, o CHT tem se empenhado por pequenas mudanças, tais como desativar as notificações e recursos semelhantes, e feito trabalho de lobby por regulamentações mais rigorosas para as as grandes empresas de tecnologia que lucram com o tempo gasto nas plataformas. Outro exemplo é a organização americana Turning Life On (“ligando a vida”) voltada a evitar que as crianças se tornem viciadas precoces nas redes sociais.

“No momento, é como se estivessem nos cobrindo de pó-de-mico, e quem está jogando o pó diz: ‘Talvez fosse bom vocês aprenderem a meditar, aí não ficariam se coçando tanto'”, compara Hari. “Sou a favor da meditação, mas antes de tudo é preciso impedir que continuem nos jogando pó-de-mico.”