05/07/2025 - 13:21
Sob a mira de drones russos, policiais ucranianos buscam moradores de um vilarejo próximo à linha de frente da guerra. Futuro da população deslocada ainda é incerto.Protegendo a solitária estrada rural que leva à cidade de Kostiantynivka, no leste da Ucrânia, há enormes redes instaladas pelo exército ucraniano. Elas foram colocadas para barrar o tráfego de drones russos equipados com explosivos. As hélices se enroscam nas cordas, que impedem os dispositivos de atingirem a estrada abaixo.
O grupo de policiais da equipe de evacuação “Anjos Brancos” passa por diversos destes corredores de redes a caminho de Kostiantynivka, uma pequena cidade localizada a cerca de 150 quilômetros da fronteira com a Rússia.
A DW acompanhou o trajeto da equipe dedicada a evacuar a população civil da região de Donetsk, cada vez mais tomada por tropas russas. Hennadij Judin lidera o grupo e dirige um carro blindado equipado com um sistema de proteção contra drones. Os demais agentes andam armados com espingardas.
Todos os dias, os policiais evacuam civis do município. Dos antigos 67 mil habitantes, hoje restam cerca de 8.500, segundo a administração local. Quase diariamente, os constantes ataques do exército russo causam mortes e feridos. As autoridades ucranianas pediram para a população civil deixar a região. Muitos, porém, não possuem meios próprios para viajar.
Ruas desertas e barreiras antitanque
Carros queimados ocupam as ruas da cidade, também tomadas por blocos de concreto e barreiras de arame farpado antitanque. Muitas casas mostram sinais de bombardeios, enquanto flores desabrocham nos jardins. Sacos de lixo estão empilhados diante das casas.
Os policiais percorrem a cidade procurando informações sobre um endereço específico, mas as ruas estão quase desertas. Finalmente, encontram seu destino: a casa de um idoso cego que pediu para ser resgatado.
Ele é conduzido para fora de casa pelo agente Dmytro. Vidros estilhaçados e cartuchos vazios estalam sob os pés enquanto a dupla caminha em direção ao veículo. “Vamos levá-lo agora para um lugar seguro”, diz Dmytro, acomodando o homem no carro.
O próximo endereço também não é fácil de encontrar. Os policiais batem insistentemente em portas e janelas, mas ninguém atende. No dia anterior, duas moradoras da casa haviam pedido para serem inclusas na lista de evacuação. A polícia supõe que elas tenham ido embora por conta própria.
Medo cresce entre os moradores
Segundo Hennadij Judin, cada vez mais moradores querem deixar Kostiantynivka. “As pessoas estão com mais medo de bombardeios e drones. Veem suas casas sendo destruídas. Os porões reforçados não oferecem mais proteção”, afirma o policial.
O exército russo tenta cercar Kostiantynivka, avançando por várias direções, inclusive de Toretsk, vilarejo já tomado por escombros. Ali vive uma idosa que também pediu evacuação.
Os policiais a encontram em casa com um parente. Mas, de repente, ela se recusa a sair, alegando pressão alta e náuseas. “Em meia hora, você estará no hospital”, tranquiliza a policial Nastja. “Ambulâncias não conseguem mais chegar até aqui.”
A mulher então pede que voltem mais tarde. Nastja anota pacientemente seu número de celular, enquanto seu colega insiste: “A senhora vê como está a situação aqui. Há drones sobrevoando a cidade.”
“Situação só piora”
A caminho do próximo endereço, o grupo passou por um ônibus quebrado, onde o motorista morreu e o cobrador ficou ferido após um ataque. Desde então, os veículos de transporte coletivo deixaram de circular pela cidade.
No leste de Kostiantynivka, um idoso chamado Viktor espera sentado sobre suas malas. Ao ouvir o zumbido de um drone, ele reage com tranquilidade. “Esse é nosso”, acredita. Enquanto carregava suas bolsas até o carro, seus vizinhos – um casal de aposentados – também pedem para ser evacuados.
“Achamos que a situação ia melhorar, mas só piora”, suspira a mulher, chamada Natalja. A cerca e as janelas de sua casa foram danificadas no último bombardeio. Não há eletricidade nem água, e o sinal de celular é quase inexistente. “Tenham cuidado, passem sob as árvores”, aconselhou o marido, Walerij, aos policiais.
O próximo destino é a casa de uma idosa que vive sozinha. Curvada, ela sai lentamente para a varanda. Os policiais a ajudam com as malas e verificam o que é realmente necessário levar, pois o espaço no carro é limitado. “A prioridade são as pessoas”, diz um deles.
No carro, a mulher pergunta se os policiais vieram de Moscou. Ela acreditava que os russos já haviam tomado a cidade. “Sim”, brinca Dmytro. “Por isso demoramos tanto para chegar até você”.
O carro segue até o centro da cidade, onde se vê a estação de trem destruída. Em uma das paredes ainda se lê, em inglês: “Não pedimos muito. Só precisamos de artilharia e bombardeiros. O resto, fazemos sozinhos.”
Missão arriscada
Por vezes, os “Anjos Brancos” precisam também recolher corpos.
Em um dos casos, na cidade de Pokrovsk, os agentes encontraram um homem morto em seu carro, atingido por um drone. No outro, foram buscar o corpo de um homem que havia morrido dentro de casa. Sua filha pediu à polícia que o buscasse para que pudesse lhe dar um enterro digno
Em Kostiantynivka, muitos mortos passaram a ser enterrados diretamente às margens das ruas. Judin já contou 22 desses túmulos e espera que um dia os restos mortais possam ser transferidos para cemitérios adequados.
Cada missão é perigosa. Quando os policiais carregavam um dos corpos até o carro, um drone explodiu por perto e um estilhaço atingiu o joelho de Dmytro, que precisou posteriormente levar pontos.
Rumo ao desconhecido
Perto da estação, um homem de meia-idade espera com um grande cão assustado. Seu nome é Serhij. Dentro do apartamento, entre as malas, está sua irmã Tetjana, chorando. Ela não quer ir embora. “Vamos logo!”, diz Serhij, impaciente. Após a insistência, Tetjana finalmente pega sua mala e segue para o carro.
“Algumas pessoas não querem ser evacuadas porque têm medo de um futuro incerto”, explica Hennadij, com empatia. “Esse medo é mais forte do que o medo da morte e por isso muitas continuam aqui, apesar dos ataques.”
De fato, a população deslocada tem pouca certeza de para onde vai. Os policiais os deixam com voluntários que os levam a um abrigo de emergência em Pavlohrad, uma cidade perto de Dnipro. Lá, recebem ajuda para solicitar benefícios sociais, mas esses auxílios não são suficientes para pagar os aluguéis cobrados em cidades mais seguras.
“Estou indo para um mundo incerto”, diz Viktor, um dos evacuados. Enquanto isso, os “Anjos Brancos” já estão a caminho de Kostiantynivka novamente. Duas mulheres os aguardam, esperando serem levadas para um lugar seguro.