12/11/2025 - 8:23
Apesar da euforia e valores trilionários envolvidos, crescimento da IA enfrenta quedas no uso corporativo. Lucros abaixo do esperado começam a gerar cautela entre investidores.A euforia em torno da inteligência artificial (IA)ainda segue a todo vapor, com dezenas de bilhões de dólares sendo investidos no mundo todo em infraestrutura, startups e na disputa pelos melhores profissionais do setor.
Neste ano, a OpenAI, empresa responsável pelo ChatGPT , juntamente com o conglomerado japonês de investimentos SoftBank e a empresa norte-americana de tecnologia Oracle, prometeu investir 500 bilhões de dólares (R$ 2,63 trilhões) em supercomputadores de IA.
A mesma companhia e a gigante de chips Nvidia ainda anunciaram um fundo de 100 bilhões de dólares (R$ 527 bilhões) para manter a liderança dos Estados Unidos (EUA) em semicondutores avançados.
Já as chinesas Alibaba e Tencent ampliaram seus aportes para acelerar a meta de fazer da China o país líder em IA até 2030.
Desde a estreia do ChatGPT, em novembro de 2022, as ações ligadas à IA acumularam um ganho estimado em 17,5 trilhões de dólares (R$ 92,73 trilhões) em valor de mercado, segundo a Bloomberg Intelligence. É um valor que o supera o PIB da Alemanha, a terceira maior economia do mundo.
O valor ainda representa cerca de 75% dos avanços do índice que reúne as 500 maiores empresas de capital aberto na bolsa de valores dos EUA. Empresas como Nvidia e Microsoft atingiram, assim, valorização recorde.
Hesitação nas empresas
Mas os sinais de ressaca estão ficando cada vez mais difíceis de ignorar. O uso da IA pelas empresas vem caindo, os orçamentos dedicados ao tema estão mais contidos e o entusiasmo em torno do aprendizado de máquina superou em muito os lucros obtidos.
Muitos economistas acreditam que a queda no uso — menos de três anos depois de a IA virar prática convencional no mercado — desmonta a crença predominante de que a tecnologia revolucionará o modo como as empresas operam ao automatizar tarefas repetitivas e aprimorar previsões.
“O enorme investimento em infraestrutura de IA parte do pressuposto de que o uso continuará crescendo rapidamente, mas várias pesquisas realizadas nos Estados Unidos mostram que a adoção, na verdade, diminuiu este ano”, disse à DW Carl-Benedikt Frey, professor da Universidade de Oxford, no Reino Unido. “A menos que surjam logo novos e duradouros casos, algo vai ceder — e a bolha pode estourar.”
O Departamento do Censo dos Estados Unidos, que entrevista 1,2 milhão de empresas americanas a cada duas semanas, constatou que o uso de ferramentas de IA em companhias com mais de 250 funcionários caiu de quase 14% em junho para menos de 12% em agosto.
Tendências alucinatórias
O maior desafio da inteligência artificial continua sendo sua tendência a “alucinar” — isto é, gerar informações plausíveis, porém falsas. Outras fragilidades incluem a falta de consistência na confiabilidade e o baixo desempenho de agentes autônomos, que conseguem concluir tarefas com sucesso apenas cerca de um terço das vezes.
“Diferentemente de um estagiário que aprende com a prática, os sistemas de IA pré-treinados atuais não melhoram com a experiência. Precisamos de aprendizado contínuo e de modelos que se adaptem a circunstâncias em mudança”, afirmou Frey.
À medida que a distância entre as expectativas altíssimas e a realidade comercial se amplia, o entusiasmo dos investidores pela inteligência artificial começa a diminuir.
“O que me preocupa é a dimensão do dinheiro que está sendo investido em comparação com a receita efetivamente gerada pela IA”, diz o economista Stuart Mills, pesquisador sênior da London School of Economics.
No terceiro trimestre do ano, os acordos de capital de risco com empresas privadas de IA caíram 22% em relação ao trimestre anterior, totalizando 1.295 operações. Os níveis de financiamento, entretanto, permaneceram acima de 45 bilhões de dólares (R$ 237 bilhões) pelo quarto trimestre consecutivo, informou no mês passado a empresa de inteligência de mercado CB Insights.
Nova bolha à vista?
A OpenAI, líder de mercado apoiada pela Microsoft, gerou 3,7 bilhões de dólares (R$ 19,5 bilhões) em receita no ano passado, contra despesas operacionais totais de 8 a 9 bilhões de dólares (R$ 42,2 a 47,4 bilhões).
A empresa afirma estar no caminho para faturar 13 bilhões de dólares (R$ 68,5 bilhões) neste ano, mas ainda deverá gastar 129 bilhões de dólares (R$ 678,8 bilhões) até 2029, estimou o site especializado The Information em setembro.
Mills acredita que as empresas de IA generativa, como a Grok, de Elon Musk, e o ChatGPT cobram muito menos do que precisam para gerar lucro e deveriam aumentar os preços das assinaturas.
Poucos quantificaram a bolha da IA de forma tão clara quanto Julien Garran, sócio da empresa de pesquisa britânica MacroStrategy Partnership. Ele argumenta que o volume de capital direcionado à IA — apesar de poucas evidências de retornos sustentáveis — supera todas as bolhas especulativas anteriores.
“Estimamos uma má alocação de capital equivalente a 65% do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA. Isso é quatro vezes maior que o boom imobiliário antes da crise financeira de 2008 e 17 vezes maior que a bolha da internet (no início dos anos 2000)”, disse.
Adotando um tom mais positivo, Sarah Hoffman, diretora de Liderança em IA na empresa de inteligência de mercado AlphaSense, previu uma “correção de mercado”, em vez de um “colapso catastrófico da bolha”. Para ela, os investimentos se tornarão mais criteriosos, com o foco se voltando a provas claras de impacto.
Ganhos ofuscados
Grandes empresas de tecnologia, como a multinacional americana Advanced Micro Devices (AMD) e o conglomerado de mídia social Meta , tiveram fortes ganhos ligados à IA ofuscados por preocupações do mercado sobre a sua sustentabilidade.
A receita do terceiro trimestre da plataforma de análise de dados e inteligência Palantir, por exemplo, subiu 63% em relação ao mesmo período do ano anterior, mas o preço de suas ações caiu até 7%.
“Os dados sugerem que a IA não está penetrando em níveis suficientemente altos da cadeia de valor. Muitas pessoas a estão usando, mas não para tarefas que contribuam diretamente para a produção de valor”, prossegue Mills.
Os próximos resultados da Nvidia, esperados para 19 de novembro, podem ser um teste decisivo sobre se o boom da IA se mantém. No segundo trimestre, as vendas de centros de processamento de dados da Nvidia representaram sozinhas 88% da sua receita total, que atingiu um recorde de 46,7 bilhões de dólares (R$ 246,1 bilhões).
Para o terceiro trimestre, a empresa prevê 54 bilhões de dólares (R$ 284,6 bilhões), projetando um crescimento anual de 54%, o que equivaleria a um total anual de mais de 200 bilhões de dólares (mais de R$1 trilhão).