02/03/2021 - 13:03
Pesquisadores da Universidade de Stanford explicam por que intermináveis reuniões virtuais, que se tornaram rotineiras em tempos de isolamento social, são tão cansativas e dão dicas de como lidar com elas.O ano de 2020 ficará marcado como o ano do Zoom. A empresa por trás da plataforma americana de videoconferências não inventou as reuniões virtuais, assim como a Google também não inventou as ferramentas de busca, e o Facebook não criou as redes sociais. Mas é comum que uma empresa decole e acabe emprestando o seu nome a uma ação, tornando-se quase sinônimo dela: nesse caso, o que tem sido chamado mundo afora de “zooming”.
Já é comum usar o termo “zooming” mesmo quando a reunião virtual ocorre via Skype, WhatsApp, Signal, Teams, entre outros serviços concorrentes. Mas o que todas essas plataformas têm em comum, de acordo com os pesquisadores do Laboratório de Interação Humana Virtual da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, é que elas provocam a chamada “fadiga do Zoom”.
“Há algo de extremamente cansativo em ficar o dia todo em chamadas de vídeo”, escreve Jeremy Bailenson, professor de psicologia e comunicação e diretor fundador do Laboratório em Stanford.
Razões para a “fadiga do Zoom”
Segundo Bailenson, existem quatro razões principais para a fadiga do Zoom:
1. cansaço visual por olhar para a tela à curta distância;
2. efeito espelho (olhar para a própria imagem o dia todo);
3. mobilidade reduzida;
4. comunicação não verbal excessiva (ex: gestos).
Esses quatro fatores são característicos da comunicação virtual e podem causar uma “sobrecarga não verbal”. Olhar de perto para um computador durante horas, com pequenas janelas de vídeo de outras pessoas, e ao mesmo tempo enxergar a si mesmo, é exaustivo, afirma Bailenson.
Se você já esteve em uma reunião presencial com, digamos, oito indivíduos ao redor de uma mesa, você se lembrará (ou será que já faz tanto tempo?) que não é possível olhar todos nos olhos ao mesmo tempo.
Em uma videochamada, é como se você estivesse o todo inteiro em um palco, atuando. E isso não é fácil. Muitas vezes essa sensação de proximidade é típica de uma intimidade que reservamos para relacionamentos íntimos – família e amigos – ou quando nos deparamos com uma sensação de imediação, como quando estamos em um elevador apertado com outra pessoa. Mas, mesmo nesses casos, há maneiras de desviar o olhar.
Em reuniões presenciais, nós muitas vezes não nos damos conta dos gestos que fazemos, diz Bailenson.
Mas quem nunca sorriu exageradamente no início ou no fim de uma videoconferência, ou abanou como se estivesse quase se afogando ao invés de simplesmente fazendo um aceno?
“As pessoas nunca ficaram tanto tempo em reuniões virtuais”, diz Bailenson, por e-mail, à DW. “É importante documentar essa transição do ponto de vista psicológico. Em segundo lugar, [é importante] encontrar soluções que as pessoas possam botar em prática, em casa, para diminuir o cansaço.”
Falaremos sobre essas soluções mais adiante.
Sobrecarga não verbal
Durante as videochamadas, você envia e recebe uma quantidade enorme de informações adicionais. Primeiro, você sente a necessidade de demonstrar que está presente e se certificar que você apareça no enquadramento da chamada.
Se você trabalha com um laptop, vai focar os olhos na pequena câmera no topo da tela, a uma distância de 30 a 50 centímetros da sua cabeça. Isso por si só já é um esforço.
Digamos que você precise desviar o olhar para fora da chamada. Trata-se de uma ação muito diferente do que se você estivesse conversando com um colega e outra pessoa por acaso aparecesse na sala para dizer oi. Seu colega provavelmente não se sentiria excluído, mas, em um ambiente online, você pode se sentir forçado a compensar.
“Até a forma como falamos em vídeo exige esforço”, descreve Bailenson. Ele cita um estudo de 2019 que comparou a interação face a face com reuniões virtuais. A pesquisa concluiu que as pessoas falavam 15% mais alto no computador. “Pense nas consequências de elevar consideravelmente a voz durante um dia inteiro de trabalho”, diz Bailenson.
Além disso, durante a chamada de vídeo, é preciso realizar várias tarefas ao mesmo tempo. A posição e o tamanho dos rostos que você vê em uma tela também podem afetar a sua sensação de bem-estar durante a ligação.
Pesquisa a longo prazo é necessária
A pesquisa realizada em Stanford é baseada em relatos, e não em análises neurocientíficas durante videoconferências, ou qualquer outra evidência que seja numericamente quantificável.
O estudo questiona se as pessoas se sentem mal-humoradas, mentalmente esgotadas ou com incômodo nos olhos após as chamadas de vídeo. As respostas variam de “não” a “um pouco”, “moderadamente”, “muito” e “extremamente”.
Pesquisas empíricas são legítimas, mas é relativamente difícil averiguar as respostas de um participante ou replicar o estudo de país para país, cultura para cultura e entre grupos de diferentes idades e gêneros.
Além disso, o curto período estudado até agora limita a capacidade dos pesquisadores de afirmar se os nossos corpos e cérebros são capazes de se adaptar e lidar melhor com as chamadas de vídeo à medida que elas se tornam mais presentes em nosso dia a dia.
“Se obtivermos amostras maiores num espaço de tempo prolongado, poderemos começar a responder a essas perguntas”, afirma Bailenson. “Estamos adaptando [a pesquisa] para crianças e planejamos começar a estudá-las nos próximos meses.”
Soluções possíveis
Bailenson quer “encorajar as plataformas a fazerem mudanças de longo prazo nos softwares”, mas, por enquanto, recomenda algumas soluções que todos podem colocar em prática:
– evitar usar os programas de chamada de vídeo em tela-cheia;
– usar um teclado externo para afastar a tela e/ou câmera do rosto;
– certificar-se de que você está bem-posicionado em frente à câmera e clicar em “hide self-view” (para que você não precise olhar para a sua própria imagem o tempo todo);
– permitir-se desligar a câmera de vez em quando e ficar apenas com o áudio ligado;
Quanto a quebrar as convenções sociais e fazer chamadas de vídeo enquanto caminha em público, em um parque, por exemplo, nada feito: “Segurança em primeiro lugar”, alerta Bailenson. “Andar e olhar para o telefone pode ser muito perigoso.”