A produção de carne bovina é tida como umas das grandes propulsoras do aquecimento global causado pelos seres humanos. Levando isso em conta, grandes redes de supermercados na Alemanha chegaram a retirar a carne brasileira das prateleiras durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro por causa do avanço do desmatamento para abrir espaço para a pecuária.

“Como um comerciante internacional com redes globais de fornecimento, queremos assumir nossa parcela de responsabilidade para agir contra a destruição de florestas ameaçadas”, comunicou a rede de supermercados alemã Aldi, há cerca de dois anos.

Mas, enquanto os compradores na Alemanha se afastavam, no cenário internacional o Brasil obtinha resultados notáveis. O jornal Valor Econômico noticiou na última semana que as exportações brasileiras de carne bovina devem superar, em 2023, 3 milhões de toneladas equivalentes de carcaça. A projeção se baseia em informações do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).

Se essa projeção se confirmar, significaria um volume 4% acima do de 2022 e que corresponderia a quase 25% das exportações globais de carne bovina.

Continuidade sob Lula

O novo governo brasileiro, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deu continuidade à política para produção de carne bovina do governo Bolsonaro.

“O Brasil mostra a potência e a grandiosidade da sua pecuária, e a expansão de mercados está se tornando uma grande oportunidade para a retomada do crescimento dessa atividade econômica”, celebrou o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, depois de bem-sucedidas negociações com o México.

A carne brasileira é bem-vinda no país da América do Norte e, depois de uma breve interrupção causada por um caso de vaca louca, também na China e em grandes partes do mundo árabe.

Numa perspectiva puramente econômica, o governo Lula dá, portanto, continuidade à política de expansão das exportações nos últimos anos. Para organizações ambientalistas, essa estratégia de expansão é problemática.

“A situação atual causa preocupação e está muito distante da meta do governo de desmatamento zero e de seu amplo engajamento no âmbito das conferências do clima ou da biodiversidade da ONU”, comenta a especialista Cristiane Mazetti, do Greenpeace Brasil. “A área destinada à pecuária avança de forma contínua e segue sendo o principal fator de desmatamento na região Amazônica.”

Ela denuncia que empresas do setor de carne e comerciantes que haviam se comprometido a eliminar produtos ligados ao desmatamento de suas cadeias de fornecimento quebraram suas promessas e continuamente adiaram a meta de rastreabilidade completa da cadeia produtiva.

“Na prática, cadeias de fornecimento indiretas são mal controladas e frequentemente ligadas a desmatamento e desrespeito aos direitos humanos”, afirma Mazetti. Segundo ela, se for posto em prática, o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul elevaria ainda mais a pressão sobre o meio ambiente.

Esperança de mudança

No seu plano de ação para prevenção e controle do desmatamento na região amazônica, o governo brasileiro menciona sua intenção de criar uma rastreabilidade, tanto direta como indireta, para a cadeia produtiva agropecuária. Mas, para Mazetti, ainda é muito cedo para avaliar se haverá resultados.

“Se for bem estruturado, transparente e de uso obrigatório, poderá ser um grande passo para combater de forma eficiente o desmatamento causado pela criação de gado”, afirma.

Um levantamento recente publicado pela Agência Pública mostrou como as exportações de produtos agrícolas brasileiros estão fortemente relacionadas ao desmatamento. O estudo afirma que a China foi o destino de boa parte da soja produzida em áreas recentemente desmatadas da Mata Atlântica.

Em 2021, o relatório Fleischatlas 2021 (“Atlas da carne 2021”) – produzido pela Fundação Heinrich-Böll, ligada ao Partido Verde alemão, pela organização ambientalista Bund e pela edição alemã do jornal francês Le Monde Diplomatique – também havia apontado que a demanda global por carne impulsiona o desmatamento no Brasil.

No entanto, estudos como esses não vêm afetando o sucesso do setor agropecuário brasileiro. O Índice de Produção Agroindustrial (Pimagro) calculado pelo Centro de Estudos em Agronegócios da Fundação Getulio Vargas (FGV Agro) subiu 1,3% em janeiro em relação ao mesmo mês do ano passado. Esse foi o maior crescimento do setor em um mês de janeiro em cinco anos.

Ao mesmo tempo, o desmatamento na Amazônia subiu 14% em março de 2023 em relação ao mesmo mês do ano anterior. O governo Lula culpou o governo Bolsonaro pela alta.