“Nunca diga nunca” seria uma maneira apropriada para descrever um retorno tão extraordinário.

O Airbus A380, o maior avião comercial do mundo, que dependendo da configuração tem até 615 assentos a bordo, chegou a ser descartado como uma aeronave viável por muitos observadores e acabou sendo aposentado por várias companhias aéreas no auge da pandemia. No entanto, agora, o superjumbo está retornando aos ares num ritmo muito maior que o esperado conforme as companhias aéreas buscam maneiras de lidar com o aumento repentino da demanda de passageiros e a americana Boeing, principal rival da europeia Airbus, sofre com atrasos na sua linha de produção.

Na última semana de junho, um total de 129 A380s estavam novamente nos céus em todo o mundo, operados por sete companhias aéreas, de acordo com o portal de rastreamento Flightradar24. Isso é mais da metade das 251 aeronaves do modelo que já foram produzidas pela Airbus desde 2003. E mais A380s têm sido recolocados em serviço a cada semana.

Fora da frigideira

Em uma reviravolta espetacular na semana passada, a companhia aérea alemã Lufthansa confirmou que também vai trazer de volta alguns dos seus A380s para a temporada de verão de 2023, num sinal claro de um ressurgimento do modelo – algo impensável há apenas alguns meses.

Os passageiros adoram o A380. Mas quase todas as companhias que possuem o modelo enfrentavam dificuldades para operá-la de forma economicamente viável, especialmente por causa das suas quatro turbinas, que consomem níveis astronômicos de combustível. Além disso, muitas empresas enfrentavam dificuldades para vender a enorme quantidade de assentos. Originalmente a Airbus esperava construir pelo menos mil A380s, mas apenas um quarto dessa meta acabou sendo concretizada, o que deu ao avião a fama de fracasso comercial.

A companhia aérea Emirates, de Dubai, continua sendo, de longe, a maior entusiasta e o maior cliente do A380. A Emirates tem 123 A380, quase metade de toda a quantidade já produzida.

A produção do A380 foi oficialmente encerrada no ano passado, com a Emirates recebendo o último modelo construído na fábrica da Airbus em Hamburgo, em dezembro de 2021. A era do jato quadrimotor de fuselagem larga parecia ter acabado, algo que foi reforçado após a americana Boeing indicar que encerraria a produção do lendário 747 em 2022, após mais de 50 anos.

A Air France desativou seus dez Airbus A380 permanentemente antes mesmo da pandemia. Quando a pandemia praticamente paralisou a aviação mundial na primavera de 2020, o fim pareceu inevitável para a maioria dos A380 remanescentes – com exceção da frota da Emirates, já que a companhia aérea havia anunciado que pretendia voar com suas aeronaves até pelo menos meados da década de 2030.

Lufthansa volta a abraçar o A380

A Lufthansa, que tinha um total de 14 A380 em sua frota, estava entre as companhias aéreas que chegaram a aposentar o superjumbo. Em agosto de 2021, o CEO da Lufthansa, Carsten Spohr, disse: “o A380 obviamente não vai voltar”.

Em abril de 2022, ele reiterou a fala em entrevista à revista alemã Der Spiegel: “Isso acabou, de uma vez por todas. O A380 é muito antieconômico em comparação com os novos jatos bimotores de longa distância. Não vai voltar para a Lufthansa”.

Os A380 da Lufthansa estão atualmente estacionados em pátios na Espanha e na França. Seis dessas aeronaves já foram vendidas, mas oito A380 continuam fazendo parte da frota da Lufthansa – pelo menos por enquanto.

Quem quiser ver os superjumbos da Lufthansa hoje deve ir a Lourdes, na França, um importante local de peregrinação católica. No aeroporto de Tarbes-Lourdes estão várias dezenas de jatos, estacionados em frente aos Pirineus cobertos de neve. Muitos deles chegaram aqui novinhos da fábrica da Airbus na vizinha Toulouse, sem nunca transportar um passageiro.

Por trás da cerca de arame farpado é possível observar esses gigantes adormecidos. Janelas e motores estão cobertos com lonas, o trem de pouso permanece cuidadosamente embrulhado e todas as aberturas na fuselagem estão seladas. Isso é chamado de “armazenamento profundo” no jargão da aviação.

“Levaria nove meses para colocar nossos A380 em funcionamento novamente”, disse Spohr, da Lufthansa, à DW.

No entanto, quatro a cinco dos oito A380 restantes na Lufthansa devem ser colocados novamente em operação para voos regulares.

“Tive que suavizar um pouco meu ponto de vista sobre o final do A380”, admitiu Spohr no final de junho.

Problemas na Boeing incentivaram um renascimento

A crescente demanda de passageiros, já acima dos níveis pré-pandemia em algumas áreas, é o grande motivo por trás na reviravolta do A380. Mas também tem a ver com problemas na fabricante americana Boeing.

A Lufthansa foi um dos primeiros clientes do maior avião de longo curso atualmente em produção, o Boeing 777-9, que a companhia aérea alemã pretende operar na configuração de 400 assentos. No entanto, a entrega da aeronave foi adiada em cerca de cinco anos, para 2025.

“Os atrasos na entrega do Boeing 777-9 são um grande fardo para nossas operações de voo”, disse Spohr. Assim, como medida temporária, a Lufthansa decidiu reintroduzir o A380.

A Lufthansa deve voltar a operar seus A380 a partir de Munique na primavera de 2023, disse Spohr, acrescentando que o número pode aumentar se a demanda continuar forte.

Faltam pilotos de A380

A principal razão para basear os superjumbos na Baviera e não no hub da Lufthansa em Frankfurt se explica pela falta de pilotos qualificados.

“Mantivemos apenas 14 pilotos de A380 prontos para voar, que poderiam ser deslocados imediatamente. Portanto, se colocarmos o A380 de volta ao serviço, precisaremos requalificar mais alguns pilotos de A350”, explicou Spohr.

A frota de A350 da Lufthansa também está sediada em Munique e agora a tripulação deve passar por um curso extra de seis semanas que também lhes permitirá pilotar o A380.