01/01/2025 - 19:17
Baixo sucesso das tropas de manutenção da paz levam continente a buscar novas abordagens contra conflitos, enquanto violência e instabilidade ainda assolam a região.Nos últimos anos, países africanos acumularam casos de golpes de Estado, como Mali, Chade, Sudão, Burkina Faso e Guiné, além de tentativas de derrubar governos na República Centro-Africana, Etiópia e Guiné-Bissau.
O conflito e a instabilidade crescentes levam a uma nova volatilidade no continente, que tem 9 das 10 crises mais negligenciadas do mundo, e uma consequente demanda por novas alternativas políticas para a África.
A paz é o produto de dinâmicas locais, nacionais e regionais, mas parece cada vez mais desafiador consolidar estes interesses divergentes, dizem os observadores políticos.
“É evidente que as ferramentas tradicionais — operações de paz, alerta precoce, mediação de conflitos — não estão funcionando”, diz Jakkie Cilliers, presidente do Instituto de Estudos de Segurança (ISS), da África do Sul.
Em novembro, por exemplo, Senegal e Chade anunciaram a saída do exército francês de seus territórios. Nesta quarta-feira (1/01) foi a vez da Costa do Marfim fazer o mesmo, seguindo o caminho de países de onde a França foi obrigada a tirar suas tropas, como Mali, Burkina Faso e Niger.
Fracasso da mediação de conflitos
Enquanto os governos buscam preservar sua integridade territorial a todo custo, os atores internacionais frequentemente priorizam uma visão humanitária focada na defesa das minorias, de acordo com pesquisa do instituto sul-africano ISS.
Essas abordagens diferentes podem levar a desacordos sobre como resolver os conflitos. O exemplo mais recente de mediação fracassada foi o cancelamento inesperado, em meados de dezembro, das negociações de paz entre a República Democrática do Congo e Ruanda.
A reunião havia gerado esperanças de um fim para a crise de décadas entre o exército congolês e o grupo rebelde M23, que supostamente tem o apoio de Ruanda, no leste da República Democrática do Congo, mas as partes não chegaram a um acordo.
No Sudão, a mediação de conflitos também teve pouco sucesso. O país enfrenta um dos períodos mais desafiadores de sua história moderna, com a crise em andamento entre as Forças Armadas Sudanesas (FAS) e as Forças de Apoio Rápido (FAR). A guerra civil, que começou em abril de 2023, devastou comunidades, deslocou milhões de pessoas e agravou uma crise humanitária que já era grave.
‘A paz tradicional não está funcionando’
De acordo com o ISS, o extremismo violento também se espalhou devido à marginalização política e econômica de algumas comunidades, às dificuldades na transição para a democracia e à falha dos governos em modernizar os setores de defesa e segurança.
“A paz tradicional obviamente não está funcionando”, disse Cilliers à DW.
Isso abriu a oportunidade para grupos mercenários como o Wagner, da Rússia, chegarem ao continente. A África é o palco de uma rivalidade global, não apenas entre os EUA, China e Europa, mas também com novos atores, como os Emirados Árabes Unidos e a Turquia.
As respostas a essa situação complexa são inadequadas, de acordo com Cilliers. A incapacidade de agir rapidamente após um alerta precoce também é exacerbada pelos Estados africanos, que resistem à interferência em seus assuntos internos, disse o especialista.
Muitos grupos rebeldes têm agendas políticas pouco claras, difíceis de traduzir em acordos de paz. De acordo com Hannah Tetteh, ex-enviada especial da ONU para o Chifre da África e ex-ministra das Relações Exteriores de Gana, é por isso que a União Africana (UA) deveria liderar os esforços no continente.
Reforma da UA é necessária
A UA e as Nações Unidas não conseguiram trabalhar de forma eficiente em sua colaboração com organizações regionais, disse Tetteh em uma entrevista recente ao International Crisis Group, devido às lacunas nessas relações. Soluções africanas para problemas africanos significariam reestruturar e melhorar a UA para cumprir sua tarefa, ela defende.
A UA passa por um processo de reforma, mas ele está incompleto, disse Tetteh. “Seu departamento de paz e segurança e o escritório de assuntos políticos foram fundidos, mas estão sobrecarregados e não têm pessoal suficiente para realizar o trabalho.”
De acordo com o banco de dados de acordos de paz da ONU, 42% de todos os tratados do tipo foram celebrados na África. Isso inclui os tratados de descolonização e os acordos regionais.
Embora muitos acordos não tenham conseguido lançar as bases para uma paz duradoura, houve alguns exemplos importantes, disse Alex Vines, diretor do Programa África do think tank Chatham House, à DW.
Estados fracos mais responsivos à pressão
Os processos de paz africanos são tão diversos quanto suas crises e conflitos. “Portanto, em vez de seguir um único modelo, eles são impulsionados pela política e pela circunstância, moldados por coalizões ad-hoc mais frequentemente do que por aderirem a estruturas formais de resolução de conflitos”, disse Vines à DW. “Isso torna os esforços mais difíceis e cruciais.”
A mediação de alto nível africana tem sido fundamental para alcançar a paz em vários casos, como no Quênia e, recentemente, na Etiópia e na Somália, mediada pela Turquia.
Mas há limites para o que a mediação pode alcançar, disse Vines. Estados menores e fracos são mais responsivos à pressão de seus vizinhos maiores, enquanto os países mais importantes da África atraem maior atenção internacional, ajudando a impulsionar a paz.
“São os estados do meio-termo onde os acordos têm sido mais difíceis de alcançar. São grandes o suficiente para resistir à região, mas não suficientemente importantes para engajar o mundo”, disse Vines.
O sucesso a longo prazo depende de apoiar a paz muito depois que as armas se calaram, ressaltou ele. “Processos que terminaram com a violência podem não estar preparados para realizar as reformas políticas e sociais de longo prazo que são necessárias.”