01/11/2010 - 0:00
Voluntário de uma organização ambientalista (acima) e escavadoras (abaixo) trabalham para limpar trechos do litoral báltico dinamarquês após um vazamento de petróleo em 2001. As condições particulares do Mar Báltico dificultam bastante a eliminação dos poluentes.
Mares pequenos, rasos e fechados são presa fácil para desequilíbrios ambientais: uma vez contaminados, fica muito difícil para eles expulsar os poluentes que causaram o problema. A situação fica ainda mais grave se os países que os circundam ainda relutam em tomar decisões em sua defesa. Essa é a tragédia do Mar Báltico, um dos mais ameaçados do mundo atualmente. O índice de poluição de suas águas é tão preocupante que a organização ambientalista Greenpeace alerta as mulheres grávidas da região a não se alimentarem de peixes pescados ali.
Localizado no norte da Europa, o Báltico tem uma área aproximada de 377 mil quilômetros quadrados, cercada por nove países: Alemanha, Dinamarca, Suécia, Finlândia, Rússia, Estônia, Letônia, Lituânia e Polônia. Estima-se que cerca de 16 milhões de pessoas vivam ao longo de suas margens.
O mar convive com um intenso tráfego de embarcações – num só dia, cerca de 2 mil navios chegam a passar por ele. Um derramamento de combustível como o ocorrido com o petroleiro Exxon Valdez na costa do Alasca teria efeitos catastróficos no Báltico, e por isso a área é constantemente monitorada – os poloneses, por exemplo, organizam vários voos semanais, partindo do porto de Gdynia, para fiscalizar como estão as águas territoriais de seu país. Infelizmente, os riscos ambientais não se restringem a isso, e podem tanto remeter ao passado como ao futuro. Em fevereiro, por exemplo – por ocasião de uma conferência na capital finlandesa, Helsinque, que reuniu os nove países bálticos para debater medidas “urgentes” destinadas a salvar o mar -, uma emissora de tevê sueca denunciou que a Rússia havia despejado armas químicas e resíduos radiativos ao largo do litoral da ilha sueca de Gotland entre 1991 e 1994. E um dos projetos econômicos mais importantes da região é a construção de um gasoduto ligando os campos produtores da Rússia ao poderoso mercado consumidor da Alemanha.
Mas o principal problema do Báltico, de acordo com o biólogo marinho Maciej Wolowicz, da Universidade de Gdansk (Polônia), é um complexo processo que está retirando oxigênio das águas do mar. Esse processo, denominado eutrofização, ocorre quando um grande acúmulo de nutrientes, incluindo nitratos e fosfatos oriundos de fertilizantes agrícolas e esgotos, atinge as águas marinhas. Essas substâncias favorecem o crescimento excessivo de algas, que consomem muito oxigênio e originam, assim, áreas do mar desprovidas desse gás, onde a vida não pode existir. Wolowicz chama esse fenômeno de “desertificação do Báltico” e o considera razoavelmente difundido em suas águas.
Como combater tudo isso? Para Wolowicz, o caminho passa obrigatoriamente pela educação. “Lei e regulamentos são essenciais, mas, se as pessoas não têm nenhuma consciência, ou uma consciência muito limitada, de como suas ações afetam o meio ambiente, a regulamentação por si só pode não funcionar”, ressalta.
A conscientização de todos os envolvidos promete ser uma dura batalha, que envolve não apenas os governantes. Uma pesquisa divulgada em outubro, a BalticSurvey, que ouviu 9 mil moradores dos nove países banhados pelo Báltico, demonstra isso: a noção de que o mar possui problemas é bem disseminada, mas pouca gente reconhece ter responsabilidade neles. O estudo comprova que a população realmente se preocupa com o mar e os níveis de poluição apresentados por ele: para até 50% dos finlandeses e mais de 25% dos suecos, letões e estonianos, por exemplo, o ambiente do mar é “muito ruim” ou “um pouco ruim”. As pessoas ouvidas manifestaram inquietação sobre temas como “lixo, metais pesados e substâncias perigosas, vazamentos diários de óleo e riscos de grandes derramamentos de petróleo, danos à flora e à fauna e proliferação de algas”, observou a pesquisadora Heini Ahtiainen. Mas a maioria dos habitantes dos países banhados pelo mar – com exceção da Suécia e da Polônia – tende a discordar da noção de que cada um deles pessoalmente afetou as condições do Báltico.
Embora o Báltico apresente altos níveis de poluição, sua orla é atração turística para 80% dos que moram na região.
De acordo com a pesquisa, a melhor forma de reunir recursos para investir na despoluição das águas do mar – cujas margens, a propósito, abrigam atividades de lazer para 80% dos que moram na sua bacia – é taxar mais fortemente quem libera substâncias poluentes no Báltico. A ideia recebeu o apoio de mais de 50% das pessoas ouvidas nos nove países.
De qualquer forma, na área dos negócios, as normas preservacionistas aparentemente já começam a vingar em relação a novos empreendimentos. De acordo com Mieczyslaw Twardowski, proprietário da empresa polonesa Baltex – pioneira na extração de cascalho do leito do Báltico e que tem planos de construir um imenso parque eólico num ponto onde as águas territoriais da Suécia e da Polônia se encontram -, sua companhia não tem outra alternativa a não ser adotar as regras ambientais internacionais se quiser fazer negócios. “O impacto ambiental de nossas atividades é estritamente monitorado e, como estamos operando em uma área que requer aprovação da Suécia, é fundamental que o nosso impacto esteja dentro de normas aceitáveis”, explica. Nos próximos três anos, a Baltex deverá extrair 7 milhões de toneladas de cascalho de alta qualidade do leito do Báltico. Além disso, ela pretende erguer, nos próximos 20 anos, 260 turbinas em seu parque eólico, com uma capacidade total de 1.560 megawatts – o mesmo que produz uma usina nuclear normal, explica Twardowski.
Outra boa notícia vem da fauna da região: apesar de um quadro ainda bastante complicado – o golfinho-do-porto, por exemplo, um cetáceo antigamente comum no Báltico, foi declarado espécie criticamente ameaçada em 2008, quando sua população ficou inferior a 250 animais -, algumas espécies dão sinais de recuperação. As focas-cinzentas estão entre esses casos: já houve 100 mil delas no mar, número que baixou para cerca de 3 mil na década de 1980, por motivos ainda indefinidos (a suspeita maior é a de uma conjugação de caça clandestina com efeitos de poluentes químicos). Hoje, já se contam cerca de 20 mil focas-cinzentas na região do Báltico que banha a Suécia.
Mas os especialistas recomendam muita cautela. Deixar o Báltico com níveis aceitáveis de poluição é um desafio e tanto, e um eventual sucesso desse objetivo vai dizer muito sobre a conscientização ambiental das populações da região e de seus dirigentes.