06/05/2025 - 11:21
Novo chanceler federal recoloca a conservadora CDU no comando do país após hiato de três anos. Confirmação para o cargo só ocorreu em segunda votação no Parlamento, após tropeço histórico na primeira rodada.O Parlamento alemão (Bundestag) elegeu oficialmente, em segunda votação, nesta terça-feira (06/05), o conservador Friedrich Merz, da União Democrata Cristã (CDU), como o novo chanceler federal do país, encerrando os três anos de governo do social-democrata Olaf Scholz (SPD). Ele é o terceiro membro da CDU a chefiar o governo alemão desde a reunificação do país, em 1990.
A eleição de Merz foi mais difícil que o esperado. O conservador só conseguiu 310 dos 316 votos necessários para assumir o governo na primeira rodada de votação.
A nova coalizão “preto-vermelho” de governo, acordada entre a CDU; o braço bávaro da legenda, a União Social Cristã (CSU); e o Partido Social Democrata (SPD), conta com 328 cadeiras no Bundestag. Isso significa que 18 deputados que a compõe votaram contra Merz ou se abstiveram.
Foi um fiasco histórico: desde o fim da Segunda Guerra Mundial, um candidato ao posto de chanceler federal nunca havia falhado em ser conformado para o cargo na primeira votação.
Na segunda rodada, Merz teve mais sorte, recebendo 325 votos dos 630 deputados. Outros 289 votaram contra. Houve ainda uma abstenção e três votos anulados.
Após o anúncio, Merz pareceu visivelmente aliviado no plenário do Parlamento.
Imigração e economia são desafios do novo chanceler
Apesar da vitória parlamentar, Merz assume o poder após um conturbado processo eleitoral no país. O colapso da antiga coalizão federal levou à antecipação de eleições gerais em fevereiro, que terminaram com a CDU na liderança. O pleito aconteceu após dois ataques a faca – em Solingen e em Aschaffenburg – e um atropelamento em massa em Magdeburg que deixaram mortos e dezenas de feridos na Alemanha.
Os atentados acirraram o já acalorado debate sobre imigração e viraram instrumento de disputa política. O líder da CDU, já chamado de “ultraconservador” por sua posição sobre migração, renovou promessas de apertar o cerco contra imigrantes sem documentação e passou no Parlamento uma moção em apoio a um polêmico projeto anti-imigração com apoio da ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD).
Com isso, Merz foi acusado de romper o cordão sanitário contra a ultradireita por acatar votos da AfD no pós-guerra. Meses após endossar o plano da CDU no Bundestag, a AfD foi classificada como uma organização “extremista de direita” pela agência federal de inteligência alemã. Nas mesmas eleições, que garantiram a vitória de Merz, a AfD se tornou a segunda maior força política da Alemanha.
O movimento do novo chanceler federal foi intensamente criticado por adversários à época, com protestos eclodindo em toda a Alemanha contra o fim do isolamento da ultradireita. Entre os nomes que se posicionaram contra Merz estava Angela Merkel, antiga rival do novo chanceler federal dentro das fileiras da CDU.
O período eleitoral também se concentrou nas discussões sobre a economia alemã e a resposta do país às crescentes ameaças tarifárias de Trump. Merz assume um país cuja indústria se vê pressionada pelo alto custo de energia, a concorrência com os produtos chineses e o possível impacto das tarifas impostas pelo presidente americano Donald Trump. A Alemanha registrou recessão econômica por dois anos seguidos e prevê nova estagnação de sua economia em 2025.
Acordo de coalizão com o SPD
Estes temas compõem o novo acordo de coalizão. Na segunda-feira, os filiados do SPD deram o aval para o texto de 144 páginas que indicam um endurecimento de leis e procedimentos sobre imigração. O novo governo quer intensificar o controle de fronteiras e acelerar a deportação de estrangeiros que não têm permissão legal para estar na Alemanha. Também deve reformar as regras para obtenção da cidadania alemã.
Na economia, a pressão dos custos de energia também deve impactar o novo governo. O país já cogita voltar a comprar gás da Rússia, e tem em seu novo chanceler um defensor da retomada da produção de energia nuclear, encerrada na Alemanha em 2023.
Para minimizar o problema, Merz prometeu reduzir a taxa sobre eletricidade ao mínimo da União Europeia e, em março, conseguiu aprovar um superpacote de gastos no parlamento alemão, afrouxando o freio da dívida para níveis sem precedentes no país. O objetivo é viabilizar investimentos em defesa, infraestrutura civil e proteção climática – o líder da CDU apoia um papel mais incisivo da Alemanha no apoio à Ucrânia.
O acordo também prevê a divisão do novo gabinete. Entre os principais nomes do SPD que retornam ao governo estão o colíder do partido, Lars Klingbeil, que acumulará os cargos de vice-chanceler e ministro das Finanças, e o popular Boris Pistorius, que se mantém no ministério da Defesa. Ambos são favoráveis a um maior investimento na área de Defesa. Os social-democratas também vão comandar as pastas da Justiça, Meio Ambiente e Trabalho.
Já os conservadores serão responsáveis por ministérios-chave do novo governo, como Relações Exteriores, Economia e Transportes. O ministério do Interior será chefiado por Alexander Dobrindt, da CSU. Defensor declarado da redução da migração irregular, ele defende reforçar ainda mais o controle das fronteiras alemãs na primeira semana no cargo.
Desafeto de Merkel
As expectativas para o governo Merz não fogem à sua conhecida atuação nas fileiras parlamentares da CDU. Nascido em 1955 em Brilon, na antiga Alemanha Ocidental, Merz ingressou no partido ainda na adolescência. Formado em Direito, ele chegou a atuar como juiz antes de se candidatar a cargos eletivos. Estreou como eurodeputado em 1989. Na década seguinte, foi eleito para o Parlamento alemão.
Dentro do partido, Merz se tornou um rival ferrenho da então chanceler alemã Angela Merkel, crítico de sua política de abertura a refugiados. Acabou deixando o parlamento em 2009, quatro anos após Merkel assumir o poder. Passou a atuar em escritórios de advocacia internacionais e em conselhos corporativos, incluindo a filial alemã da trilionária BlackRock, maior gestora de ativos do mundo.
Com a aposentadoria de Merkel à vista, retornou ao partido em em 2018 e foi gradualmente ganhando terreno, até voltar ao parlamento em 2021 e assumir a liderança da sigla. Desde então, levou o partido mais à direita, e comandou a oposição a Scholz nos últimos três anos.
gq (dw, ots)