07/07/2023 - 8:29
“Chegou a nossa bruxinha!” Foi assim que a dona da casa saudou uma amiga convidada para o jantar. A anfitriã respondeu sorrindo quando perguntei por que chamara a outra daquele modo: “Ela estuda uma porção de bruxarias, tarô, astrologia, e sabe ler as linhas da mão”.
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Jovem, bonita e elegante, a “bruxinha” era mesmo um encanto. Psicóloga, é casada e tem dois filhos. Quando sorriu para mim, cheia de charme, me perguntei: então são essas as bruxas de hoje? Se forem, o que fazer com a imagem estereotipada da bruxa tradicional, mulher má, velha e feia, corcunda, verruga na ponta do nariz, a voar nos céus montada em vassoura, ou diante de um caldeirão a cozinhar sapos e asas de morcegos para produzir malefícios?
Uma pergunta puxa outras. O que é, afinal, a bruxa? Por que, hoje, chamar de bruxa a mulher que se interessa por ocultismos, adivinhações e magias já não é um insulto e sim, muito mais, um elogio carinhoso? O que mudou, a natureza da bruxa ou simplesmente a visão que temos dela?
A bruxa, mulher que conhece os segredos das leis mágicas da natureza – tanto a natureza externa, do mundo, quanto a interna, humana –, existe provavelmente desde os tempos das cavernas. Seu objetivo fundamental é conquistar um poder de transformação sobre as coisas do mundo, sobre os outros e sobre si mesma. Bruxa, portanto, é mulher de poder.
No decorrer dos milênios, no Ocidente e no Oriente, essas mulheres de poder desempenharam livremente seu papel, respeitadas e admiradas pelas pessoas. Eram curandeiras, parteiras, sábias nos usos medicinais das ervas, folhas, raízes, conhecedoras dos mistérios da natureza, da vida e da morte. Eram também sacerdotisas, profetisas, médiuns que funcionavam como elemento de ligação entre os vivos e os mortos, entre os humanos e os deuses.
Ameaça ao patriarcado
Na Idade Média, o poder patriarcal identificou nessas mulheres um perigo, e reagiu. Milhares delas foram presas, julgadas e condenadas à morte na fogueira. Mas hoje, a mulher que quer ser bruxa está livre para fazê-lo. Pode, inclusive, filiar-se a megaorganizações que atuam em todo o mundo na forma de clube de bruxas ou de religiões que acabam se tornando oficiais, como é o caso da wicca.
A wicca foi reconhecida como religião pelo governo dos Estados Unidos em 1986, mas seus adeptos gostam de dizer que ela é a religião mais antiga do mundo. Embora seja um sistema estreitamente ligado aos atributos do princípio feminino, nela homens e mulheres atuam em igualdade de condições. Todos interagem com a natureza em sabás, festivais que celebram os ciclos da vida e afirmam o poder sobrenatural (como o da magia).
Os wiccanos se consideram bruxos e bruxas. São muitas vezes confundidos com os satanistas, mas a verdade é que eles não acreditam no demônio. Aliás, os conceitos do diabo e do inferno fazem parte da teologia cristã e nunca existiram na wicca. Além disso, os wiccanos também não acreditam em um deus único, todo-poderoso, mas sim em vários deuses e deusas ligados sobretudo aos quatro elementos da natureza – fogo, terra, água e ar. Assim sendo, a wicca é, na prática, uma religião politeísta, entrando na mesma categoria que religiões, como o budismo e o hinduísmo.
Mas, embora se assente sobre crenças muito antigas, incluindo elementos do paganismo e espiritualidade baseada na natureza, a wicca não é uma religião antiga. Ela foi fundada pelo antropólogo Gerald Gardner no início dos anos 1950. Como religião baseada na natureza, seus seguidores são incentivados a amar e respeitar todos os seres vivos. Os wiccanos fazem oferendas para seus deuses escolhidos, sim, mas esses sacrifícios incluem quase exclusivamente pães, frutas, vinhos ou flores. “Nós, bruxos, amamos os animais e nunca prejudicaríamos ou mataríamos esses seres em nossos rituais e magias. Sacrifício de sangue de qualquer tipo é contra a nossa lei.”